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01 de Abril de 2014 às 20:50

Esquerda baixa

Valls encenará com Hollande uma recorrente compita francesa: o primeiro-ministro ambicionando a presidência, mas a coabitação entre os dois políticos dificilmente chegará até 2017.

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À míngua de eleitorado de esquerda, François Hollande optou por nomear o mais direitista dos socialistas para chefiar um governo condenado a défices orçamentais excessivos, à contestação generalizada e a um confronto com a Alemanha.

 

O défice orçamental de 2013 cifrou-se em 4,3% do PIB em vez dos 4,1% previstos, enquanto a dívida pública chegou aos 93,5%, ao arrepio da moratória de dois anos concedida o ano passado a Paris pela União Europeia.

 

Previsões de crescimento económico de 1% para este ano não auguram que a França venha a respeitar os critérios do "Pacto de Estabilidade e Crescimento", a reduzir a actual taxa de desemprego de 11% e simultaneamente concretizar até 2017 cortes de 50 mil milhões de euros na despesa pública que atinge os 57,3% do PIB.        

 

As escassas hipóteses de êxito do "Pacto de Responsabilidade" aventado em Janeiro por Hollande não indiciam que o presidente venha a conseguir dinamizar uma ambicionada parceria privilegiada com Berlim dada a frágil posição francesa para definir propostas de governação económica e financeira na zona euro.

 

A direita socialista

 

Manuel Valls carece de apoios no Partido Socialista - nas primárias de Outubro de 2013 quedou-se pelos 5,6% tendo desde então a sua actuação como ministro do Interior acentuado as divergências com a ala esquerda do partido - e terá particular dificuldade em fazer vingar políticas de reduções de custos laborais e reformas fiscais que irão reduzir os orçamentos familiares afectando sobretudo as classes de rendimentos mais baixos.

 

O reformismo económico de Valls, repudiando alguns dos desvarios mais notórios do socialismo hexagonal como a lei das 35 horas de trabalho semanal, enquadra-se na matriz proteccionista e soberanista francesa e vai a par da sua veia securitária, laicista e integracionista face à imigração.        

 

Em Junho, Hollande e Valls terão de conformar-se com a ascensão da extrema-direita na eleições europeias, após o centro-direita ter conseguido 46% da votação nas municipais, impondo aos socialistas a sua maior derrota desde 1983.

 

A eventualidade de novos desaires nas votações para os departamentos em Março de 2015 e nas eleições regionais um ano depois são de considerar se os socialistas não apresentarem a curto prazo resultados palpáveis.

 

A derrocada socialista nas eleições municipais, numa altura em que o centro-direita continua carente de líder ou programa alternativo de governo, assolado por escândalos (alegado desvio de fundos pelo presidente da "Union pour un Mouvement Populaire" Jean-François Copé, processos por corrupção de Nicolas Sarkozy) é essencialmente sinal do fracasso de Hollande, um presidente de promessas frustadas, políticas contraditórias e dúbia moralidade.

 

A elevada abstenção nas votações de Março (37%) agravou a perda de apoio dos socialistas entre jovens, assalariados, operariado e classes médicas e confirmou a persistência e alargamento das preferências pela extrema-direita (7% dos sufrágios, vencedora em 14 municípios).

 

A frente reaccionária

 

Marine Le Pen continua a marcar pontos com uma mensagem centrada em temas fortes que condicionam cada vez mais as atitudes dos seus adversários de direita e esquerda.

 

Desde que assumiu a liderança da "Frente Nacional", em 2011, a filha de Le Pen alargou o leque tradicional de propostas reaccionárias do partido em matéria de segurança e controlo da imigração.

 

As denúncias da degradação de serviços públicos e do aumento do desemprego calam também fundo nas classes médias, assalariados, operários e jovens, atemorizados por uma globalização económica atentatória da soberania nacional.    

 

No seguimento das municipais, a "FN" conta 22% das intenções de voto, atrás da UMP, 24%, e à frente dos socialistas, 19%, segundo uma sondagem da "Ipsos-Steria".

 

Valls encenará com Hollande uma recorrente compita francesa: o primeiro-ministro ambicionando a presidência, mas a coabitação entre os dois políticos dificilmente chegará até 2017.

 

Pela esquerda ou pela direita será rompida a ambiguidade e ineficácia das políticas presididas por Hollande.

 

A solução de recurso de relançamento económico e reformismo social pela esquerda baixa não tem futuro. 

 

Jornalista 

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