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As autárquicas e o mal menor

As eleições autárquicas, especialmente em Lisboa e Porto, prometem ser o grande acontecimento político da "rentrée". Uma espécie de Festival da Eurovisão à escala local.

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Os portugueses querem sentir que os cantores têm paixão e não são meros executantes de karaoke político. No final, PS e PSD vão contar espingardas e dos resultados poderá vir a depender o futuro triste de Pedro Passos Coelho. Mas o certo é que o comum cidadão olha hoje para os candidatos aos municípios de Lisboa e Porto e vê, sobretudo, manobras e proclamações políticas que pouco estão a contribuir para uma discussão inteligente sobre os problemas sérios com que se debatem as duas principais cidades portuguesas. A saber: a pressão turística e a imobiliária a ela ligada que estão a afastar os habitantes locais para as periferias; o tráfego caótico no interior dos centros, sem respostas para o estancar à entrada das cidades e sem planos de transportes públicos eficientes; a degradação da qualidade de vida que tudo isto está a implicar. Esses problemas são mais claros em Lisboa do que no Porto, mas existem nas duas cidades.

 

Face a isso encontramos candidatos a presidente que suscitam tantas simpatias como dúvidas. No caso de Lisboa a dupla Fernando Medina/Manuel Salgado parece preparar-se para ganhar novamente as eleições face a uma inacreditável escolha do PSD para candidata e aos tiros nos pés que Assunção Cristas vai dando, entre estações de metro alucinantes e coligações com Gonçalo da Câmara Pereira. O "status quo" que continuará a afugentar os lisboetas da sua cidade, tornando-a impossível de ser habitada (por razões de custo ou de circulação), parece reforçar-se. Lisboa pagará caro esta estratégia arquitectónica/imobiliária em desfavor da qualidade de vida. No Porto, Rui Moreira julga poder ser o "autarca independente modelo". Mas as suas manobras com os partidos que gravitaram à sua volta, e o elevaram também a líder da autarquia, poderão vir a ter consequências funestas. Para ele e para o "espírito de independência" que era urgente trazer para uma política amorfa em que temos vivido.

 

É assim que entramos no campo do "mal menor". Trata-se de um princípio de reflexão moral para tentar diluir um dilema político. Aristóteles falava disso no seu segundo livro sobre ética. Daí nasceu a expressão: "do mal, o menos". António Gramsci explicava: "Todo o mal maior se faz menor em relação a outro que ainda é maior, e assim até ao infinito." Muitos cidadãos vão por isso votar entre o que consideram "menos mau" dos candidatos. Mas isso, claro, implica que os cidadãos começam a claudicar do pensamento e da argumentação, o que alimenta populismos e simplificações políticas. É esse o problema das opções políticas destes dias. Numa época em que precisávamos de bons debates sobre como reformar as grandes cidades portuguesas talvez tudo se vá perder em floreados dialécticos. 

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