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Alterações laborais: o (eterno) desafio da promoção da contratação coletiva

É essencial que associações patronais e sindicais saibam atuar como verdadeiros parceiros sociais, desenvolvendo uma cultura de diálogo realista e construtiva.

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O Governo anunciou, recentemente, um conjunto de alterações ao atual quadro normativo laboral que, tendo sido acordadas em concertação social, se assumem como instrumentos de combate à precariedade e de promoção da negociação coletiva.

 

De entre as várias medidas elencadas na Proposta de Lei n.º 136/XIII, encontra-se a eliminação do banco de horas individual (reservando-se a adoção do banco de horas para a negociação coletiva ou para acordos de grupo a alcançar através de consulta aos trabalhadores); o alargamento do conjunto de matérias do Código do Trabalho que apenas podem ser afastadas por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho se este dispuser em sentido mais favorável ao trabalhador; a necessidade de a denúncia da convenção coletiva ser acompanhada de fundamentação com dever de comunicação à Administração do Trabalho; a previsão da manutenção em vigor dos regimes da parentalidade e de segurança e saúde no trabalho, como parte do núcleo de matérias que se mantém em vigor em caso de caducidade de convenção coletiva; e a fixação de um prazo de três meses a contar da data da entrada em vigor da convenção coletiva ou do início do contrato do trabalho, se esta for posterior, para efeitos de adesão individual de trabalhador a convenção coletiva.

 

Em que consiste afinal a tão ambicionada "promoção da contratação coletiva"? Olhando para as medidas propostas e para o enquadramento com que se justifica a necessidade das mesmas, parece que o que se pretende é aumentar o número de instrumentos de regulamentação coletiva de natureza negocial, bem como o número de trabalhadores por eles abrangidos.

 

Segundo os dados do Livro Verde das Relações Laborais (atualizado em janeiro de 2018), registou-se, em 2017, "um incremento de 42% na publicação de convenções coletivas e de 10% no volume de trabalhadores abrangidos em relação ao ano anterior."

 

Porém, apesar de "a taxa de cobertura dos trabalhadores por conta de outrem por convenções vigentes permanecer elevada, registando porém um ligeiro decréscimo de 88,5% em 2015 para 87,2% em 2016", a verdade é que a taxa de filiação em associações se situa nos 8,3% no caso dos trabalhadores e nos 17,1% no caso das empresas. O que permite concluir que a elevada taxa de cobertura se fica a dever, sobretudo, às portarias de extensão que estendem o âmbito de aplicação das convenções coletivas a trabalhadores e empregadores não filiados nas entidades outorgantes, cujo número aumentou significativamente: "Em 2017, foram emitidas 86 portarias de extensão, mais do que o dobro das que foram emitidas em 2016 e acima do total de 70 emitidas entre 2012 e 2015."

 

Embora o aumento do número de convenções coletivas permita pensar que o quadro normativo atual não é, só por si, um entrave ao desenvolvimento da contratação coletiva, os dados referentes à taxa de cobertura por via de portarias de extensão fazem-nos pensar que existe ainda um longo caminho até que a contratação coletiva se assuma como o regulador privilegiado das relações laborais, garantindo uma maior adequação das suas normas à realidade empresarial e setorial.

 

Para que tal se concretize não serão suficientes medidas de cariz legislativo como as anunciadas, sendo essencial que associações patronais e sindicais saibam atuar como verdadeiros parceiros sociais, desenvolvendo uma cultura de diálogo realista e construtiva, para alcançar - tal como preconiza a nova proposta de lei - a "promoção dos direitos dos trabalhadores" e simultaneamente a "adaptação das empresas às pressões competitivas crescentes e aos desafios da inovação".

 

Counsel no Direito do Trabalho e Segurança Social da Garrigues

 

Artigo em conformidade com o novo Acordo Ortográfico

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