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18 de Junho de 2020 às 21:50

Uma crise - vários formatos de recuperação

A crise económica subsequente à crise sanitária é consensual no que respeita à sua dimensão inédita. Apesar do acordo em relação à magnitude, as opiniões divergem relativamente à recuperação, propondo-se vários formatos para a sua concretização.

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Será uma retoma com a forma de U, V W, L, raiz quadrada? A configuração mais vantajosa será uma representação em V com maior segundo braço, significando um regresso rápido ao patamar de PIB pré-covid. Este cenário otimista tem sido debatido por instituições e autoridades. Por exemplo, nos EUA, muito embora os mais recentes dados publicados de vendas a retalho, transações eletrónicas, e emprego apontem para boa capacidade de ressurgimento, a robustez é incerta devido à fragilidade da confiança dos agentes económicos associada ao risco de novos surtos de covid-19. A facilidade de saída da retoma dos eixos exige às autoridades níveis de alerta e reatividade redobrados.

 

Entre a crise presente e a anterior medeia cerca de uma década. Apesar do diferente rastilho, ambas partilham na sua génese um processo de acumulação de desequilíbrios seguido do imprescindível processo de limpeza. Na Grande Recessão, os desequilíbrios externos, o endividamento do setor privado, o peso da construção e setores relacionados, e a debilidade do sistema financeiro foram corrigidos, assistindo-se ao encolhimento do peso da construção (pesando sobre o desempenho do investimento) e restauração da solidez dos balanços de instituições financeiras, famílias e empresas.

 

Nesta última década de recuperação, a globalização intensificou-se, reforçando interligações na cadeia de valor. A expansão dos serviços, sejam turismo ou digitalização, foi o principal motor de retoma, contrabalançada por níveis de crescimento anémicos do investimento e favorecendo o processo de desalavancagem privado. Olhando para a economia portuguesa como ilustração da dinâmica associada a estas duas crises, constata-se que em 2008-2011, o peso do investimento (23% do PIB), concretamente em construção atingia recordes ao passo que o peso das exportações se encontrava estagnado em 27% por mais de dez anos, sendo globalmente o ritmo de expansão económica próximo de 1% em termos reais e taxa de desemprego na vizinhança de 8%. Em 2019, as exportações atingiam 45% do PIB enquanto o investimento correspondia a 18% do produto. A indústria turística emergiu como incontornável catalisador de expansão, representando 8% do PIB e quase 10% do emprego. Globalmente, Portugal observava crescimento real do produto na área de 2% e desemprego de 6,5%. O endividamento privado reduziu-se em 80 pontos básicos do PIB, assinalando-se melhoria da rendibilidade das empresas e a contenção na política de distribuição de lucros.

 

Revisitando crises anteriores e excluindo as questões supervenientes associadas à especificidade sanitária e restauração de confiança, pode-se antever mudança no propulsor de crescimento(1) , infletindo de setores de serviços transacionáveis e consumo privado para investimento e "reindustrialização", com possibilidade de retrocesso ao nível da globalização, limitando a dependência de fornecimentos concentrada geograficamente. Esta orientação, aliás plasmada nas linhas orientadoras da Comissão Europeia para o quadro financeiro plurianual 2021-27, poderá apresentar desafios particulares a Portugal pelas suas condições iniciais - baixa poupança, reduzida utilização de capital por unidade produzida, envelhecimento da população. O redirecionamento setorial privilegiará uma tendência provavelmente mais capital intensiva, relativamente menos geradora de postos de trabalho, mais dependente de fundos próprios e mercados de maior dimensão. Se o modelo de crescimento económico dos últimos dez anos foi relativamente benigno para países com as características de Portugal, o reforço do protecionismo ou "recentragem" poderá eventualmente ser menos ajustado às especificidades de economias mais pequenas e periféricas. 

 

(1)Nos últimos meses, constatou-se a assimetria do impacto da crise quando os setores associados a restauração, comércio e hospitalidade foram significativamente afetados por contraponto com outros, como a construção, que não interromperam atividade.

 

Economista

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