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12 de Janeiro de 2018 às 13:00

Folha de assentos

O país respira saúde nas finanças. Não tanto nos cuidados de saúde. Não padece apenas dos "momentos de ruptura", padece de um desinvestimento continuado, mesmo que um pouco contrariado no último ano. À espera de um choque vital está o PSD, que amanhã decide um pouco do seu futuro.

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psd. Rio ou Santana? As palavras e os actos são conhecidos. As personalidades também. A campanha foi pobre. Os debates perderam-se na disputa entre quem está mais perto ou mais longe de Passos Coelho e de António Costa. Quem é mais ou menos credível? A grande maioria dos militantes decidiu há muito em quem vota. O historial e o contraste entre os dois candidatos são suficientemente grandes para não justificar hesitações. A grande motivação da escolha será a percepção de qual deles estará em melhores condições de reconduzir o partido ao governo. Dito assim não quer dizer que seja necessariamente Rui Rio, que fez desta ideia o seu cavalo de batalha. Essa percepção tem elementos racionais/pragmáticos e elementos afectivos/emotivos. Habilmente, os candidatos tiraram partido dos seus melhores trunfos. Rio colou as "trapalhadas" a Santana. Santana disse que Rio é "siamês" de António Costa. É difícil perceber para onde pende a racionalidade/afectividade dos militantes e seus influenciadores, mas a dureza do combate deixará marcas difíceis de apagar.

pgr. A procuradora-geral da República Joana Marques Vidal terminaria o seu mandato em Outubro e não seria reconduzida, mesmo podendo, por se dar continuidade ao costume pós-Cunha Rodrigues de apenas fazer um mandato de seis anos. Doze é demasiado. A decisão seria pacífica para a procuradora, para o Ministério Público e também para a generalidade do sistema político. Ao dizer que o mandato da procuradora é «único», a declaração inocente da ministra da Justiça, ela própria magistrada do Ministério Público, criou um problema. Porquê? Porque o mandato pode não ser único. O Governo e o Presidente da República são livres de decidir a sua recondução. Porque a resposta da ministra pode ser lida como desvalorização do mandato da procuradora, diminuindo o seu peso no tempo que lhe resta na função. Tendo em conta que há processos sensíveis em curso, um deles envolvendo o anterior líder do PS, a declaração criou dificuldades escusadas ao primeiro-ministro e ao Presidente da República. Joana Marques Vidal não quererá fazer mais um mandato como procuradora-geral da República. Já o disse. Se assim não for, o melhor será António Costa propor a recondução da procuradora-geral.

finanças. A democracia tem custos. Um deles condiciona a vitalidade dos partidos políticos. O seu financiamento é imprescindível e deve ter regras claras. Vetadas as alterações às normas de financiamento dos partidos, a maioria das reacções parlamentares roçou o caricato. Começaram por nos querer convencer de que o processo tinha sido público e transparente, como se conhecêssemos o que o grupo de trabalho discutiu durante meses, como se soubéssemos ainda hoje quem propôs o quê. Disseram-nos que haviam legislado a pedido do Tribunal Constitucional, ignorando que tinham ido mais longe. Disseram-nos que não havia retroactividade nas alterações. Afinal, há, mas a culpa é da "transitoriedade". Pior: devolvido o diploma, apenas o PCP o assumiu. PS e PSD embaraçaram-se. A intenção "era boa", disse Passos. O BE diz que as alterações foram "normais", mas que "podem e devem melhorar". O CDS é o campeão da revolta. Votou contra, mas nunca se lembrou antes de suscitar o debate. Ficou tudo na mesma. Não se eliminam as inconstitucionalidades, não se debate o que se devia debater, estão pendentes muitos processos de fiscalização e, decorridas algumas décadas de democracia, os partidos teimam em legislar mal e nem sequer cumprir o que legislam.

fake. O combate às notícias falsas passou a ser uma questão de Estado. Novas leis para penalizar fortemente os autores e replicadores de fake news. Se antes o combate à falsidade vinculava sobretudo o campo jornalístico, o advento das redes sociais trouxe novos impactos políticos. As redes sociais confundiram comunicação com produção noticiosa e tornaram mais fácil a manipulação e a falsificação da informação. Vários países criaram unidades especiais de monitorização. Na Alemanha, acaba de entrar em vigor uma lei que pretende combater, além da desinformação política e pessoal, discursos de ódio e pornografia online. Emmanuel Macron anunciou uma lei que permita saber quem patrocina conteúdos inventados. Na corrida ao Eliseu assumiu-se vítima de campanhas orquestradas pela Rússia. Se é certo que o espaço público beneficiará de maior transparência na identificação de accionistas e financiadores de empresas de comunicação, fica a preocupação sobre quem decidirá se uma informação é falsa. Um juiz? Um político? E a liberdade?

salvar. O primeiro-ministro reconhece que há "momentos de ruptura" no Serviço Nacional de Saúde. Não são apenas momentos. Há poucos dias, foi a Coimbra ouvir o grito de alerta de António Arnaut e de João Semedo sintetizado no título "Salvar o SNS". Diz António Costa que é uma excelente altura para reflectir. Eu diria que é uma excelente altura, não apenas para reflectir, mas também para agir. O que vamos observando no interior de hospitais e centros de saúde revela carências muito significativas. E não é só por causa dos picos da gripe. Faltam camas, profissionais, equipamentos… Numa sociedade envelhecida, a procura de cuidados de saúde aumenta. A pressão é grande e a gestão complexa. E como se desinvestiu durante anos, os estrangulamentos são mais frequentes e a recuperação mais difícil. A despesa com a saúde aumentou 5,5%, diz o primeiro-ministro. Não chega. Melhorar o SNS é a grande marca que este governo de esquerda pode deixar. Por enquanto, a marca vai em sentido contrário. Nem por isso autoriza os que mais desinvestiram no SNS a indignações de oportunidade. Haja pudor!

soares. Foi há um ano que vimos partir Mário Soares. Recordamo-lo agora numa homenagem que os mais altos dignatários do País e a sua família lhe fizeram no cemitério. Soares marcou muito os que o conheceram e marcou muito o Portugal contemporâneo. Não deixou ninguém indiferente. Nunca teve medo. Ousou quando muitos não acreditavam. Lutou como poucos pela liberdade, pela institucionalização da democracia e pela integração europeia. Não foi coisa pouca. Parece uma inevitabilidade, mas não era. Importa repeti-lo e sublinhá-lo para que saibamos continuar a defender a liberdade e a democracia. Isso mesmo lembrou a sua filha Isabel Soares. Honrar a sua memória é avivar os valores que importam. Honrar a sua memória passa por preservar e dinamizar o valioso arquivo que ficou à guarda da Fundação Mário Soares.


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