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Prémio Cuidados Hospitalares
Miguel Ferreira entrou a 1 de setembro de 2017 para a administração do Hospital Dr. Francisco Zagalo e um dos primeiros alertas dirigidos a este licenciado em Matemática e doutorado em Sistemas de Informação é que a unidade estava "inundada de papéis" e com um problema no arquivo clínico. "Avisaram-me logo que só havia espaço para mais dois ou três meses. Tinha de fazer alguma coisa", lembra o gestor. Na cidade capital do azulejo bastou um mês para colocar em andamento um projeto para a desmaterialização de registos e processos dentro do hospital, em que "a tecnologia, embora seja relevante, acaba por ser instrumental porque o que visa é uma alteração das rotinas, tentando eliminar o papel destes circuitos".
No designado e agora premiado, na categoria dos cuidados primários, HOSP - Hospital de Ovar Sem Papel, acabar com essas pilhas de processos em papel na mesa dos médicos e retirar as impressoras dos gabinetes foram as duas primeiras grandes medidas deste plano, complementadas por outras "coisas simples". Por exemplo, os ofícios passaram a ser assinados eletronicamente, os muitos regulamentos hospitalares passaram a ser produzidos, assinados e depois difundidos pelos serviços por via eletrónica; e a solução de gestão documental que o hospital até já tinha (mas não utilizava) teve a licença reativada com mais horas de formação para colaboradores.
Após uma primeira fase em que não precisou de dinheiro - detalhe que na altura espantou Henrique Martins, líder da Serviços Partilhados do Ministério da Saúde (SPMS), que serve os hospitais com tecnologias de informação -, para aprofundar a mudança de processos avançou entretanto com várias candidaturas a fundos comunitários, num investimento global de 1,7 milhões de euros. Uma delas envolve uma solução de "business intelligence" de apoio à gestão e transversal a todas as áreas: do bloco operatório às consultas, dos recursos humanos ao departamento financeiro.
De árvores a funcionários
Contando com uma equipa operacional de dez elementos, encabeçada pelo presidente para "dar o exemplo" e composta por médicos, enfermeiros, administrativos e terapeutas, na lista de resultados deste projeto está o consumo de menos 200 mil folhas de papel e uma poupança estimada de 22 árvores só em 2018, quando comparado com o gasto em anos anteriores. Neste pequeno hospital do setor público administrativo, que emprega cerca de 250 profissionais (incluindo os prestadores de serviço) e serve 55 mil pessoas do concelho de Ovar e de zonas limítrofes, como a Murtosa, a receita eletrónica disparou para 70% das prescrições, o que compara com a média nacional a rondar os 10%. Do Minho a Peniche, outras unidades públicas estão a inspirar-se nesta iniciativa.
Mesmo vendo inicialmente "pessoas a olhar de lado para estas medidas", Luís Miguel Ferreira conta que "com o tempo acabaram por vestir a camisola". E algumas tiveram de fazer mais do que isso, mudando mesmo de funções. Foi o caso de Arlete Cardoso, 46 anos, que depois de cinco anos a arquivar papel numa sala quase sem janelas, numa "atividade completamente rotineira, monótona e de desgaste físico", foi desviada para o "muito mais aliciante" serviço de agendamento do bloco cirúrgico e das consultas pós-operatórias. Alexandrina Sousa, assistente operacional, foi outra das funcionárias requalificadas com o HOSP para tarefas úteis no apoio aos doentes, tendo deixado de passar os dias entre o arquivo e os consultórios médicos, a carregar pastas verdes.