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Hospitais têm de deixar de utilizar tanto papel

Os hospitais ainda estão "longe de ter um nível aceitável de digitalização", de acordo com José Mendes Ribeiro. O médico José Luís Biscaia defende que exista uma maior integração da informação com os centros de saúde.

12 de Outubro de 2017 às 14:39
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Os hospitais públicos, responsáveis por mais de metade da despesa do Estado em saúde, estão muito atrasados na transição para o novo século. O diagnóstico foi traçado por José Mendes Ribeiro, economista da saúde e membro do Centro Académico Clínico de Coimbra, no passado dia 3.

"Os nossos hospitais estão longe de ter um nível aceitável de digitalização dos seus processos e das suas actividades", afirmou, sublinhando que muita coisa ainda é feita com recurso a papéis, com processos que "têm custos muito elevados, são pouco eficientes e atrasam a capacidade de resposta".

As "equipas terão mais facilidade no seu trabalho se tiverem ferramentas mais ágeis, porque continuamos a usar muito o papel, a repetir procedimentos, as pessoas ainda recebem um postal em casa a marcar consulta, os exames não são partilhados com o médico assistente", exemplificou, durante a mesa redonda que antecedeu a entrega dos prémios Saúde Sustentável. Menos tarefas administrativas "poupava muitos recursos e dispensava pessoas para tratar de pessoas".

"A palavra-chave é a revolução digital nos hospitais" para "acabar com esta caixa negra em que não sabemos o que se passa por dentro da cortina, em que os doentes têm pouca informação" e ela "não circula entre todos os departamentos e todas as áreas dos hospitais".

Ainda assim, não está tudo mal feito. José Mendes Ribeiro elogia o "sistema muito evoluído e interessante na prescrição de medicamentos, que hoje é um caso de sucesso", porque "um médico pode prescrever no centro de saúde ou consultório um medicamento e a farmácia, ao aceder a essa informação, dispensa o formato físico que existia até agora".

"Temos partes destes processos bastante bem feitos, mas não reorganizámos o nosso sistema" para "tirarmos partido de todas as oportunidades que nos traz a digitalização". É que hoje em dia, "marcar uma consulta por telefone não é assim tão fácil, uma consulta por e-mail ou aplicação não é nada fácil".

O médico José Luís Biscaia, da Unidade de Saúde Familiar de São Julião da Figueira, diz que é essencial que exista integração. "O que interessa não é se fiz muitas consultas, é se os diabéticos estão mais bem controlados, se melhoramos a qualidade de vida. Como fazemos para garantir isto, como nos organizamos? Obriga a uma gestão integrada dos percursos, e isso é que é difícil". Mais difícil ainda porque cada hospital tem o seu próprio sistema.

Quem tem dívidas permanentes deve ter uma equipa dedicada

O Orçamento do Estado do próximo ano, que é entregue amanhã no Parlamento, deveria garantir autonomia de gestão às unidades do Serviço Nacional de Saúde que façam "prova de bem gerir", sugeriu o economista da saúde Pedro Pita Barros. Por outro lado, deveria existir "atenção dedicada quando há dívidas crescentes e recorrentes", uma espécie de "equipa dedicada a ver o que se passa ali".

Durante a mesa redonda que antecedeu a entrega dos prémios Saúde Sustentável, Pedro Pita Barros disse ainda que é necessário "pensar o financiamento não como um problema, mas como um processo, para continuamente estar a trabalhar". E espera que o OE de 2018 possa "abrir espaço para as pequenas inovações, para que apareçam permanentemente e, juntando todas, cumulativamente acabem por garantir um efeito que garanta a sustentabilidade" do SNS.

O economista defende que, no curto prazo, é necessário "melhorar a gestão micro, media e macro", que inclui "melhorar os cuidados de saúde" e "o papel dos ministérios da Saúde e das Finanças".

Essa integração dos dois ministérios é, aliás, defendia pela OCDE, que "diz que tem de haver maior participação dos dois ministérios na definição das políticas de Saúde, porque as Finanças dizem que, quando acaba o financiamento, pára-se [a prestação de cuidados], mas do lado da Saúde não se pára".

A longo prazo, Pita Barros diz que seria "interessante revisitar o documento Gulbenkian de há três anos", que fez um conjunto de recomendações para a saúde em Portugal. É necessário reflectir sobre "como fazer bem à primeira, pensar bem no papel do cidadão e doente" e "pensar nos mecanismos institucionais que devem ser revisitados nas suas regras e propósitos".

José Luís Biscaia lamentou que não se consiga "perceber qual a verba alocada a projectos para financiar a saúde". "Sabemos a verba que está na ACSS, nos ACES, nas ARS, mas se fizermos a pergunta ao contrário, não sei qual é a verba para financiar a saúde". 

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