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Cidália Ferreira: "Sempre se olhou a mata de forma economicista"

O início do mandato como presidente da câmara coincidiu com a grande tragédia no Pinhal de Leiria. A primeira missão de Cidália Ferreira foi "repensar a estratégia" para o concelho.

27 de Dezembro de 2018 às 13:00
Cidália Ferreira presidente da câmara municipal da marinha grande David Cabral Santos
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Alargar as zonas industriais, formar pessoas, atrair mão-de-obra para combater a escassez. São estas algumas das prioridades do concelho onde nasceu a indústria do vidro e que é um dos principais centros de exportação de moldes e plásticos. A presidente da autarquia insiste, ainda, no alargamento do aeroporto de Monte Real à aviação civil.

Não teve um início de mandato fácil. Primeiro foram os incêndios de Outubro e, um ano depois, o furacão Leslie. Como tem sido lidar com tudo isso?
Tem sido muito difícil, tanto que ainda não tive um único dia de férias. E é uma angústia muito grande. A Mata [Nacional de Leiria] sempre fez parte da nossa vida e tínhamos um projecto a nível turístico estruturado para ela. Mas arderam-nos 10 hectares e nós tínhamos 11 e pouco. Depois, em Fevereiro e Março, tivemos os vendavais e, mais tarde, o Leslie, que nos derrubou muitas das árvores que ainda estavam de pé. Ficámos com preocupações ambientais enormes e isto não nos deixa disponíveis para outras coisas que também são urgentes. Leva-nos a repensar toda a estratégia que tínhamos para o concelho.

Deve haver outra gestão do território?
Se aquela mata tinha um ordenamento de território que era considerado uma escola para todo o mundo, temos consciência de que, ao longo dos anos, ela foi ficando desfalcada de meios e de material que permitiram que não fosse devidamente acompanhada em termos de limpeza. Mas também sabemos que, num dia daqueles, mesmo que a mata estivesse limpa, provavelmente, o mesmo teria acontecido. Hoje temos dois problemas: deixar condições futuras - e o trabalho vai ser hercúleo -; e ter meios e gente. Precisávamos de, pelo menos, 33 trabalhadores na mata e o senhor ministro e a secretaria de Estado foram sensíveis a isso. Abriu-se concurso, mas houve pouca gente a candidatar-se. Não é atractivo. Mas além de pessoas são precisos recursos financeiros. A mata da Marinha Grande dava, todos os anos, entre dois e três milhões de euros - outros anos, mais ou menos um milhão e meio - de lucro ao Estado, que nunca era aplicado no concelho. Até aqui, sempre se olhou a mata de uma forma economicista e nunca pelo seu verdadeiro valor. Temos que insistir com as pessoas que governam e que olham para estas questões como financeiras para que olhem também para a qualidade humana.

Um dos problemas que sublinhou ainda durante a campanha foi a necessidade de ampliar as zonas industriais. O que é que tem sido feito nesse âmbito?
Já estamos a fazer uma parte do alargamento, daquilo que conseguimos adquirir ao Estado [os terrenos são envolvidos pela Mata Nacional] e queremos continuar a fazer todos os esforços. Temos a indústria no nosso ADN, ela é pujante e temos um conjunto de associações que fazem investigação que permite grandes avanços. Sabemos, por isso, que temos de criar um Parque Tecnológico e de Ciência [a partir de infra--estruturas já existentes]. Além do vidro e do plástico, há os moldes, que têm uma vital importância. Não há nada na vida que não saia de um molde. Qualquer automóvel tem peças feitas com os nossos moldes. Mas a Marinha Grande é, muitas vezes, mais conhecida no estrangeiro do que no próprio país.

A mata da Marinha Grande dava entre dois e três milhões de euros de lucro ao Estado, que nunca era aplicado no concelho.

Mas vão formar um parque tecnológico. Falta essa valência?
Não quer dizer isso. Mas permite-nos criar um centro de inteligência competitiva, para articular a investigação, o desenvolvimento de projectos, a formação avançada, os serviços técnicos às empresas, incubadoras, start-ups… Precisamos que esta sinergia seja cada vez mais potenciada. Vamos também criar um gabinete de apoio ao empresário e ao empreendedorismo e um gabinete de apoio ao imigrante. Temos algumas comunidades estrangeiras instaladas e isso é importante, porque nós não temos desemprego.

A falta de pessoas não é preocupante?
Não, porque somos proactivos e temos capacidade de captar, formar e reconduzir para as valências que são necessárias. E estamos no centro do mundo. [risos] Costumamos brincar, dizendo isso, mas estamos entre dois aeroportos e faremos tudo para que o de Monte Real seja alargado à aviação civil. Seria fundamental para a dinâmica da região. Temos estudos que mostram que o projecto é viável e todos os [dez] presidentes de câmara [com quem tem discutido o assunto] manifestaram-se a favor do aeroporto. Portanto, vamos continuar a fazer pressão.

Acredita que o projecto se concretize?
Sou uma mulher de fé. [risos]

E é das poucas a presidir uma autarquia em Portugal. Sente o facto de ser mulher na pele, politicamente?
Não sei bem como lhe hei-de responder… Em termos da articulação que é preciso fazer a nível distrital e a nível nacional, não sinto. Quando vim para a câmara [em 2005] éramos sete vereadores e eu era a única mulher. E isso tinha um peso institucional que não lhe digo nada! Era aquela forma muito mais máscula de resolver as coisas... Agora, somos mais mulheres do que homens, pela primeira vez. 

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A primeira mulher

Professora do ensino básico durante 32 anos e licenciada em Formação Pessoal e Social, Cidália Ferreira, de 64 anos, está na Câmara Municipal da Marinha Grande desde 2005. Entre sete vereadores, começou por ser a única mulher. Hoje, é uma das 32 presidentes das 308 câmaras do país. Em 2015, a marinhense assumiu a vice-presidência da autarquia local, candidatando-se à sua liderança nas últimas eleições, pelo Partido Socialista. Casada e mãe de dois filhos, durante vários anos integrou associações ligadas a áreas sociais e esteve, entre 2005 e este ano, na Comissão de Protecção de Crianças e Jovens da Marinha Grande.



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