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É deputada do PSD e foi a relatora da comissão parlamentar que preparou o projeto-lei 706 que deu origem à Lei n.º 82/2021. Um passo relevante no reforço do controlo e fiscalização dos direitos de autor. A parlamentar explica em entrevista ao Negócios o impacto económico e social que a pirataria digital tem, em particular na imprensa, e sublinha a necessidade de melhorar também a literacia digital da população.
Em que consiste a pirataria digital e qual o impacto económico que tem, nomeadamente para a imprensa?
Em primeiro lugar, gostava de agradecer o convite que me foi dirigido e a oportunidade de debater esta importante e complexa temática. Este conceito de pirataria digital não é muito conhecido pelos cidadãos. Há em primeiro lugar que distinguir o conceito de pirataria digital de imprensa do conceito de pirataria digital mais amplo. No conceito de pirataria digital de imprensa enquadramos qualquer tipo de partilha ou distribuição não autorizada e, por isso ilegal, de conteúdos de imprensa por via digital. Quando, por outro lado, falamos no conceito mais abstrato de pirataria digital falamos, por exemplo, de cópias não autorizadas de programas de software, partilhas de filmes em plataformas ilegais ou acesso a canais de subscrição com recursos a sistemas e plataformas que permitem que esse acesso seja feito sem o pagamento de subscrição.
Na pirataria digital de imprensa, o conceito gira em torno de partilha ou distribuições não autorizadas de conteúdos.
Falamos, por exemplo, dos grupos de partilha nas redes sociais e, muitas vezes, as pessoas não sabem que estão a consumir um produto de forma ilegal, que é o acesso às edições impressas de jornais e revistas...
Isso é um excelente exemplo. Muitos cidadãos, quando partilham ou distribuem esses conteúdos através de plataformas no telemóvel, não têm a consciência de que estão com isso a praticar um crime. E o que é que é preciso ter aqui de noção? É que a pirataria digital constitui um atentado à democracia, desde logo porque contribui para o enfraquecimento económico das empresas de comunicação social, constitui uma ameaça à subsistência de um jornalismo que se quer de qualidade, independente e que é essencial para o bem-estar da nossa democracia. Sem a independência e sem a liberdade da comunicação social pomos em risco um pilar essencial da democracia. E muitas vezes, quando o cidadão está perante uma situação de partilha de um conteúdo de imprensa, não tem a noção da consequência dos seus atos, quer para as empresas de comunicação social quer para a democracia no seu geral.
Falou do impacto que tem no financiamento da imprensa, mas há também questões como o impacto no emprego, seja no setor da cultura, em geral, como no setor da comunicação. Qual o efeito que tem?
É conhecido por todos que o setor da comunicação social e o setor da cultura têm vindo a sofrer nos últimos anos enormes dificuldades. O impacto da pirataria é significativo. Os números dão conta que houve até, inclusivamente, um aumento da pirataria em Portugal no período do confinamento e da pandemia [de covid-19]. E obviamente este fenómeno vem agravar as dificuldades das empresas de comunicação social e, consequentemente, pôr em risco o mundo laboral.
Qual tem sido o papel do Parlamento e o que tem sido feito em termos legislativos?
Em primeiro lugar, antes de falar do papel do Parlamento, acho que é relevante consciencializar os portugueses para a importância desta problemática. Essa sensibilização para este fenómeno deve começar desde muito cedo nas escolas, junto das crianças e, eventualmente, associada a uma prevenção a ser debatida em conjunto com a literacia digital. O Governo e as empresas de comunicação social devem também ser proativos e intensificar ações de sensibilização junto dos portugueses. É fundamental uma maior divulgação junto dos portugueses para esta problemática e para as suas consequências do ponto de vista económico. O Parlamento tem vindo a acompanhar esta matéria com muita proximidade. Recentemente, aprovou legislação – o célebre projeto de lei 706 que depois de publicado passou a ser a Lei 82 – que prevê a fiscalização e mecanismos de controlo, remoção e impedimento do acesso, em ambiente digital, a conteúdos protegidos. Isto foi, se calhar, o passo mais significativo que o Parlamento deu para fiscalizar, controlar e ter um mecanismo de remoção para quando são detetados episódios ou circunstâncias de pirataria digital. Para se saber qual a reação que o titular dos direitos de autor poderá ter perante esse facto. O Parlamento tem tido um papel proativo no acompanhamento desta realidade que cada vez mais se discute e tem efeitos nefastos na comunicação social e na liberdade da nossa democracia.
Foram ouvidos os agentes do setor?
Para nós, o PSD foi importante, e sempre nos batemos por isso, que houvesse um envolvimento de todos os “players” do setor quando houve uma discussão e um debate desta matéria. O PSD tem procurado estar atento a esta problemática e, consciente da sua complexidade, tem vindo a auscultar os diferentes “players” do setor e a acolher os seus contributos nos diversos procedimentos legislativos que têm versado sobre esta matéria. Nós consideramos que, para legislar bem, é essencial ouvir o setor. Tivemos esse cuidado, de recolher os vários contributos de empresas e associações, e achamos que o papel do Parlamento também deve ser esse quando exerce funções legislativas. Deve ser um papel de aproximar e discutir com os “players” do setor a legislação e os passos que se vão dando.