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O espírito que anima a nação start-up

“Muitas das universidades são centros de acumulação de conhecimento em vez de serem orientadas para servir o país, a sociedade, as empresas”, afirma Peretz Lavie, que liderou a Technion-Israel Institute of Technology entre 2009 e 2019.

04 de Março de 2020 às 15:30
Peretz Lavie, que presidiu ao Technion durante uma década, foi o orador principal da conferência. Bruno Colaço
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Peretz Lavie foi durante a última década presidente do Technion - Israel Institute of Tecnhology, e foi o orador principal da conferência "O Papel do Ensino Superior no Desenvolvimento Regional", organizada pela Universidade Nova de Lisboa e a CCDR de Lisboa e Vale do Tejo, e contou com o Negócios como Media Partner.

Peretz Lavie veio contar as histórias que unem uma velha universidade, a Technion que nasceu em Haifa em 1912, e uma nova em Nova Iorque, " ambas concebidas como motores de desenvolvimento económico". Um exemplo de inspiração para as universidades portuguesas.

Em 19 de dezembro de 2011, a Cornell of University e o Technion foram os vencedores de um concurso para a criação da NYCTech que visava criar uma alternativa a Silicon Valley e à Route 128 de Boston, um projeto de 100 milhões de dólares para instalar um campus em Roosevelt Island, promovido pelo então mayor, Michel Bloomberg. O campus da NYCTech previa, nos 30 anos seguintes, o reforço da criação de empregos na cidade, 600 spin-offs de empresas e 23 mil milhões de dólares em atividade económica.

Peretz Lavie, então o presidente da Technion, que esteve na base da criação de Israel como a "start-up nation", perguntou a Michael Bloomberg porque tinha escolhido o instituto israelita para o novo campus. O então mayor de Nova Iorque respondeu que a Technion tinha sido a única universidade do mundo a mudar a economia de um país, a transformar um país agrícola num país de tecnologia de ponta, de exportador de laranjas a exportador de semicondutores.

A nação start-up

Como é que o Technion ajudou a transformar Israel numa nação start-up? A história desta universidade demonstra que "a necessidade é a mãe da inovação, é a única possibilidade quando há problemas que têm de ser resolvidos", assinalou na conferência que decorreu na semana passada no auditório da Reitoria da Nova.

Peretz Lavie recorda que a abertura da Faculdade de Engenharia Aeronáutica em 1954 nasceu da necessidade da criação de uma Força Aérea, e as Faculdades de Medicina e Ciência da Computação e o estabelecimento do Instituto de Microeletrónica, em 1969, resultaram das necessidades verificadas depois da Guerra dos Seis Dias em 1967.

"Muitas das universidades são centros de acumulação de conhecimento, de investigação pura, em vez de serem orientadas para servir o país, a sociedade, as empresas", disse o professor, investigador e empreendedor, considerado um dos fundadores da "medicina do sono".

A inovação "é um empreendimento coletivo", em que a interdisciplinaridade é fundamental, cruzando por exemplo a medicina com a engenharia, ou a física com a engenharia mecânica, com o objetivo da abrir novas fronteiras de conhecimento e futuras descobertas. O Technion conta com 18 faculdades e cerca de 60 centros de investigação como a nanotecnologia, a energia, a automação, as ciências da vida, ou as engenharias, que congregam os investigadores e fazem a ponte entre disciplinas e as faculdades, com um orçamento de 400 milhões de euros.

O vale da morte da inovação

A investigação fundamental e a aplicada são as duas faces da mesma moeda e o seu objetivo é a criação de valor para a economia e a sociedade diz Peretz Lavie. Referiu-se ainda à necessidade de fazer pontes entre a universidade e o mercado para evitar o vale da morte da inovação. Na transferência entre a investigação pura e a aplicada perece uma grande parte dos projetos tecnológicos e científicos.

Desde 1995, os licenciados da Technion criaram mais de 2.000 empresas, das quais 811 ainda estão ativas hoje. Mais de 400 graduados estabeleceram pelo menos duas empresas cada e 18 estabeleceram cinco ou mais. Essas empresas criaram, somente em Israel, 100 mil empregos e geraram 30 mil milhões de dólares através de fusões e aquisições.

Por exemplo, 95 empresas oriundas do Technion estão cotadas no NASDAQ, com a Novocure a ser avaliada em 8 mil milhões de dólares e a Mazor Robotics a ser vendida à Medtronics por 1,65 mil milhões de dólares.

Segundo Peretz Lavie há três temas essenciais no ensino de uma universidade ao serviço de um ecossistema de inovação e criação. São eles o fornecimento de ferramentas para a solução de problemas futuros, que ainda não existem, proporcionar competências de liderança e outras "soft-skills", como o trabalho em equipa, as capacidades de comunicação, relacionamento, ética, adaptação, resiliência, e o que Peretz Lavie chama os "meetings of minds".

A inovação é social e os "meetings of minds", eventos que podem ser um dia ou um concurso, reúnem estudantes de vários departamentos e empresas que partilham problemas para chegar a soluções conjuntas, como a "pen drive" inventada por Dov Moran, que costuma encontrar-se todos os anos com os alunos do Technion. Para ser um empreendedor e inovador bem-sucedido são necessárias certas características essenciais como não ter medo de assumir riscos e falhar, questionar tudo, ser direto, fazer perguntas e não ter dogmas.