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Filipe Duarte Santos: "Sem crescimento económico é mais difícil vencer os desafios da sustentabilidade"

No PIB per capita em paridades do poder de compra na UE, Portugal baixou da 15.ª posição em 2000 para a 19.ª posição em 2019. “Um desempenho deficiente na economia prejudica o desempenho nas componentes social e ambiental”, defende Filipe Duarte Santos.

20 de Julho de 2021 às 14:15
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Professor catedrático jubilado de Física na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Filipe Duarte Santos é um especialista internacional em alterações climáticas. Desde 2017 que é presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável (CNADS), que é um órgão nacional independente com funções consultivas que procura consensos alargados relativamente às políticas de ambiente e de desenvolvimento sustentável. Entre os seus membros, contam-se especialistas como Miguel Bastos Araújo, da Universidade de Évora, João Ferrão, da Universidade de Lisboa, Teresa Andresen, do Instituto de Agronomia, Luísa Schmidt, Universidade de Lisboa Faculdade Ciências e Tecnologia/UNL, e representantes de 22 entidades de setores económicos, centrais sindicais, ambientalistas, municípios, entre outros.

Quais os grandes desafios que se colocam em termos de sustentabilidade em Portugal?
O desenvolvimento sustentável tem, como se sabe, três componentes: social, económica e ambiental. Portugal, como Estado-membro da UE, partilha as características dos desafios da União, que é uma das regiões mais desenvolvidas do mundo, integra países com economias avançadas, e por essa razão tem preocupações de sustentabilidade de um nível geralmente mais elevado do que o conjunto das economias emergentes e em desenvolvimento.

Portugal, segundo dados da Pordata, baixou da 15.ª posição em 2000 na UE, no que respeita ao PIB per capita em paridades do poder de compra, para a 19.ª posição em 2019. Este deslizar da economia portuguesa no conjunto dos países da UE, caso não seja travado, torna mais difícil vencer os desafios da sustentabilidade dado que esta integra as três referidas componentes. Por outras palavras, uma atuação deficiente na economia prejudica o desempenho nas componentes social e ambiental.

O que está a ser feito e o que falta fazer, em termos relevantes, no âmbito Agenda 2030 e Objetivos de Desenvolvimento Sustentável?
As Nações Unidas fazem uma avaliação anual do progresso no processo de cumprimento das metas quantificadas estabelecidas para cada um dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. De um modo geral, estas avaliações à escala global concluem que estamos mais próximos de cumprir em 2030 as metas relativas aos objetivos relativos a indicadores humanos do que a indicadores ambientais. A UE e Portugal não fogem a este padrão.

Para dar um exemplo concreto, Portugal tem ainda um longo caminho a percorrer no que respeita aos ODS 14 e 15 relativos à conservação dos ecossistemas marinhos e terrestres, que é dificultado, especialmente no que respeita ao 15, pela progressão das alterações climáticas. De acordo com os últimos dados disponíveis da Agência Europeia do Ambiente, Portugal, no período de 2013-2018, tinha 75% dos habitats e 62% das espécies, ambas com estatuto conhecido, em estado mau ou desfavorável.

Os três programas comunitários para esta década – o PRR, o PT2030 e o INvestEU 21-27 – estão marcados pelas agendas digitais e de sustentabilidade. Qual pode ser o impacto destes instrumentos na sustentabilidade em Portugal?
O Plano de Recuperação e Resiliência teve a sua origem, como todos sabemos, na pandemia da covid-19, que gerou uma grave crise sanitária, social e económica na maior parte do mundo, incluindo Portugal, e destina-se prioritariamente a recuperar o país e a conferir-lhe maior resiliência. É uma oportunidade única de investimento e é necessário aproveitá-la o mais possível de forma transparente e eficaz, pensando não só nos problemas do curto prazo, mas também nos desafios de médio e longo prazo.

A agenda da digitalização, da ciência e das suas aplicações, inovação tecnológica, do ensino e da qualidade e nível de formação profissional são essenciais no mundo atual para que o país se possa afirmar e competir internacionalmente. Os outros dois programas estão alinhados e coerentes com o PRR e representam um grande investimento da UE em Portugal. Contudo, é necessário que Portugal também desenvolva as políticas que aumentam a capacidade de o país atrair investimentos significativos de outras fontes de financiamento.


De acordo com os últimos dados disponíveis da Agência Europeia do Ambiente, Portugal, no período de 2013-2018, tinha 75% dos habitats e 62% das espécies, ambas com estatuto conhecido, em estado mau ou desfavorável. Filipe Duarte Santos,
presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável