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O banco como ecossistema e como produtor

Estes dois caminhos implicam parcerias para incorporar no seu portefólio produtos e serviços complementares à mera oferta financeira e canais diferentes para comercializar os seus produtos e serviços.

Negócios 26 de Outubro de 2020 às 15:30
Nuno Cordeiro partner da deloitte dr
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Confiança e segurança, a base de clientes e a riqueza de informação são as principais vantagens competitivas dos bancos face a empresas de outros setores de atividade na opinião de Nuno Cordeiro, partner da Deloitte.

Qual é o impacto da pandemia de covid-19 e as suas sequelas económicas, sociais, financeiras na transformação digital dos bancos e do sistema financeiro?
A pandemia de covid-19 tem vindo a revolucionar a forma como as pessoas vivem e se relacionam a nível global. Um dos sinais mais evidentes é o elevado crescimento do número de novos utilizadores dos canais digitais dos bancos, onde se observaram crescimentos de 10% a 20% nos últimos 6 meses, duas a três vezes superiores ao normal.

É expectável que a alteração do comportamento digital dos clientes se mantenha no futuro, contribuindo para a aceleração dos processos de transformação digital dos bancos. Este será sobretudo visível através do aumento da oferta de produtos e serviços para uma base de clientes cada vez mais digital. Contudo, não deverão ser negligenciadas as oportunidades que se verificam internamente, nomeadamente a revisão do modelo operativo das instituições, onde o reforço da utilização de metodologias de trabalho e de decisão mais ágeis, a automatização de processos e o ajuste dos circuitos internos para um contexto de trabalho não presencial assumirão um papel primordial.

Quais são os principais desafios tendo em conta o contexto com menos margens, mais concorrência, mais regulação, tecnologias disruptivas?
Num estudo recente publicado pela Deloitte em parceira com o Institute of International Finance procurámos, precisamente, sistematizar os principais desafios que as instituições financeiras enfrentam no contexto atual.

Destaco como mais relevantes, a pressão sobre as margens, já que a expectativa por parte dos agentes económicos de as taxas de juro permanecerem negativas nos próximos anos poderá afetar a capacidade dos bancos gerarem receita com a sua atividade tradicional de captação de depósitos e concessão de crédito.

Em segundo lugar, a gestão do crédito em incumprimento, com a pandemia a impactar de forma severa a capacidade das famílias e empresas cumprirem com o pagamento das prestações de crédito. Segue-se a redução de custos em resultado dos desafios anteriores mas também da maior adoção de canais digitais por parte dos clientes

O quarto desafio a previsível nova vaga de regulação que procurará reforçar ainda mais a resiliência e solvabilidade dos bancos e a proteção dos clientes em situações de crise. O quinto tem a ver com os novos concorrentes no mercado e, por fim, uma nova cultura de inovação e talento, que levará os bancos a terem de recrutar, desenvolver e reter equipas com as competências adequadas para suportar os processos de transformação e modernização necessários à sua sustentabilidade futura.

Quais são os principais contornos do ecossistema bancário e financeiro e qual será a sua evolução?
No mais recente documento publicado pelo World Economic Forum em parceria com a Deloitte, o desenvolvimento de ecossistemas beyond finance é apontado como um dos eixos prioritários das instituições financeiras no atual contexto.

Quando ao papel futuro dos bancos na economia e sociedade a discussão centra-se numa questão fundamental: "de que forma os bancos poderão ser cada vez mais relevantes para os seus clientes, num mundo onde a disputa pela atenção e interesse dos consumidores é cada vez mais intensa?"

Esta reflexão deverá partir do reconhecimento de quais são as vantagens competitivas dos bancos. Acredito que são essencialmente duas: por um lado, a confiança e segurança, sendo o banco a entidade em quem os clientes confiam para guardar as suas poupanças e, por outro, a base de clientes e a riqueza de informação uma vez que os bancos são das entidades com mais informação e maior conhecimento sobre a vida dos clientes.

Importa também reconhecer quais as grandes tendências que estão a impactar o mundo empresarial, e consequentemente o setor bancário, e que passam por quatro pilares: a hiperconectividade dos indivíduos; a proliferação de negócios baseado em plataformas; a utilização inteligente de dados para transformar radicalmente a experiência dos clientes; e a quebra de fronteiras entre diferentes setores de atividade, com criação de ecossistemas multiproduto que visam satisfazer de forma mais abrangente as necessidades dos clientes.

Cruzando as grandes tendências com os fatores distintivos dos bancos e considerando os desafios, acredito que os bancos devem perseguir dois caminhos: o primeiro numa ótica de "banco como ecossistema", através da incorporação no seu portfolio de produtos e serviços complementares à oferta financeira, alargando assim o espetro de necessidades de clientes às quais consegue dar resposta, e o segundo como "banco como produtor", encontrando parceiros para comercializar os seus produtos e serviços e ganhar uma vantagem competitiva face aos concorrentes, conseguindo assim chegar a novos clientes sem estar dependente dos seus próprios canais.
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