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Reabilitação Urbana 2018
Notícia

Viseu: centralidade no país para a investigação aplicada de valorização e reabilitação de património

Foram produzidas quase duas dezenas de teses e trabalhos de investigação científica. 30 investigadores e nove instituições de ensino superior colaboram com o projecto "Viseu Património".

24 de Janeiro de 2018 às 15:17
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Jorge Sobrado é o vereador da Cultura, Património, Turismo e Marketing Territorial da Câmara Municipal de Viseu, uma cidade com um excelente projecto de reabilitação urbana. O vereador explica o que é o "Viseu Património" e a importância do projecto para o aumento da qualidade de vida urbana da cidade, falando igualmente dos desafios que se sente na gestão da cidade, entre outros temas.

 

 

Qual é o objectivo do "Viseu Património"?

 

O projecto "Viseu Património" visa contribuir para o aumento da qualidade de vida urbana de Viseu, alicerçado na sua valorização patrimonial, cultural e humana. O projecto desenvolve-se por via da criação de conhecimento, da salvaguarda, da valorização e da comunicação da sua história de 2.500 anos e do seu património cultural, material e imaterial, mas também por via de uma reflexão sobre a cidade no futuro.

 

A primeira fase do projecto, realizada entre 2016 e 2017, visou o arranque e a estruturação de um processo de reconhecimento do valor patrimonial da cidade, sobretudo dirigido ao património edificado corrente do centro histórico, que é um elemento fundamental e identitário da vida da cidade, em paralelo com a promoção de práticas de reabilitação urbana sustentável, quer de iniciativa municipal quer de promoção privada.

 

Que balanço faz do projecto "Viseu Património"?

 

Um balanço muito positivo. Por um lado, conhecemos melhor hoje a cidade antiga, ou se quiser o coração histórico da cidade de Viseu. Conhecemos melhor a sua identidade construtiva e cultural e alcançámos também, pela investigação de algum edificado, alguns "segredos" do que poderíamos designar de engenharia tradicional, como nos casos do antigo Orfeão de Viseu e da "Casa das Colunas".

 

Dispomos hoje de um levantamento sistemático do edificado do centro histórico de Viseu, a respeito das suas características, dos seus valores mais expressivos, do seu estado de conservação e do seu papel numa perspectiva de conjunto perfeitamente singular. 495 edifícios do centro histórico foram caracterizados, totalizando mais de 100 mil dados registados. Pela primeira vez realizou-se uma inspecção a coberturas, abrangendo 299 edifícios, e avaliado o seu estado de conservação em quase 200.

 

Esta informação torna possível avançar numa reflexão colectiva mais fundamentada sobre as melhores práticas urbanas para Viseu, em matéria de reabilitação do edificado, em particular no centro histórico.

 

Por outro lado, abrimos uma frente de qualificação das práticas de reabilitação da cidade. Temos o desafio de salvaguardar valores patrimoniais relevantes da cidade, ao mesmo tempo que tornamos as intervenções mais sustentáveis, nos planos cultural, ambiental e energético.

 

Finalmente, posso dizer que Viseu é hoje uma centralidade no país para a investigação aplicada de valorização e reabilitação de património. Produziram-se quase duas dezenas de teses e trabalhos de investigação científica, 30 investigadores e nove instituições de ensino superior colaboram com o projecto.

 

Raimundo Mendes da Silva justificou a importância do site – disponível desde Setembro do ano passado – com a necessidade de ir "encontrando maneiras de comunicar com os diferentes públicos", acrescentando ainda a importância de divulgar informação e "recolher a sensibilidade das pessoas". Estes objectivos estão a ser conseguidos com o site?

 

O site é uma ferramenta importante, na medida em que é um repositório vivo e de acesso universal de muita informação técnica relacionada com os projectos de investigação aplicada. Está, assim, aberto o caminho a uma participação informada e à criação de uma massa crítica colectiva que importa à reflexão e actuação na cidade. Mas a comunicação com a população e a comunidade científica faz-se através de outras dimensões.

 

Os eventos participativos que se organizaram para o reconhecimento do edificado (como o "Viseu Freeze"), os seminários técnicos sobre intervenções em estruturas antigas e o contacto das equipas de investigação com proprietários e residentes constituíram um importante passo de interacção com a comunidade, com resultados muito positivos e que se espera poder potenciar com a realização, a curto prazo, de acções temáticas dirigidas a diversos públicos-alvo.

 

Quais são os principais desafios que se prendem hoje com a construção e a gestão da cidade?

 

O maior desafio actual na gestão de qualquer cidade é a sua sustentabilidade, encarada na perspectiva mais abrangente que concilie as preocupações culturais, de justiça social e de qualidade de vida. Nesta equação que temos para resolver, estão incluídas as dimensões ligadas quer à habitabilidade moderna quer à preservação da identidade da cidade, a atractividade económica e a criação de empregos, a eficiência energética e as questões de educação para o património.

 

A progressiva valorização cultural da cidade consolidada, a sua reabilitação responsável e repovoamento humano e económico são os contributos mais importantes para este desígnio.

 

Existe alguma estimativa ou estudo relacionado com o valor do património em Viseu que pode ser reabilitado? Existem dados por freguesias?

 

Nos últimos quatro anos, foram transaccionados no centro histórico de Viseu – na chamada Área de Reabilitação Urbana (ARU) – 203 imóveis, correspondendo a um volume financeiro de 20 milhões de euros. Na sua esmagadora maioria, estas transacções visaram ou visarão no curto prazo operações de reabilitação e edificado. Na esfera do investimento público, a reabilitação ou a valorização do edificado do centro histórico representará um esforço financeiro próximo dos 18 milhões de euros.

 

O que está a ser feito em matéria de sustentabilidade e eficiência energética na reabilitação de Viseu?

 

Existe uma sensibilidade crescente das entidades públicas e dos investidores privados em matéria de sustentabilidade e eficiência energética, o que também se repercute nas acções de reabilitação. Isto é positivo.

 

Uma das linhas de investigação aplicada do projecto "Viseu Património" vai no sentido da caracterização in situ do comportamento térmico das construções tradicionais no centro histórico (nomeadamente os tabiques), através de um equipamento móvel de monitorização, com início previsto para os próximos dias de uma ampla campanha de monitorização das condições de conforto interior (temperatura e humidade) em edifícios do centro histórico já reabilitados, a aguardar reabilitação, ocupados e devolutos. É uma medida muito inovadora.

 

Está também criada uma ferramenta de apoio aos projectistas na verificação da sustentabilidade das operações de reabilitação, em sentido lato, que será testada a curto prazo.

 

Há ainda um longo caminho a percorrer, em Viseu e no país. Acredito que os instrumentos de incentivo precisam de uma maior adequação e atractividade, mas há também necessidade de optimização de soluções técnicas que respondam às especificidades dos edifícios existentes, da sua diversidade e das suas condicionantes.

 

Viseu está preocupado e quer reabilitar o seu património. Mas, na sua opinião, as autarquias portuguesas estão hoje mais sensíveis às mudanças que são precisas fazer, muitas vezes, nos seus territórios?

 

Viseu tem o seu percurso próprio, com uma visão muito clara da relevância do património cultural na política de reabilitação. Temos uma estratégia e um conjunto integrado de projectos dos quais se espera que resulte uma consciência e uma prática consolidada de reabilitação urbana sustentável. A própria regulamentação municipal está a adaptar-se para promover uma salvaguarda e uma valorização patrimonial nas operações de reabilitação de edificado.

 

A preocupação com a reabilitação urbana em geral, com a reabilitação do edificado corrente e com a preservação e valorização do património cultural edificado mais tradicional ou erudito, é claramente crescente em Portugal, ainda que, naturalmente, assuma diferentes ritmos e seja traduzida em diversas abordagens.

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