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Notícia

Região Centro aposta na valorização económica inovadora de recursos tradicionais

Projetos estruturantes que estão no terreno, como o da valorização das fileiras do queijo da região Centro, do vinho e da floresta, capacitam e valorizam as cadeias de valor, criando mais emprego e riqueza nestes territórios.

11 de Janeiro de 2019 às 13:06
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A presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDR Centro), Ana Abrunhosa, quer combater a desertificação. Como? Tornando a região mais atrativa para os 2.4 milhões de habitantes e atraindo novas pessoas para trabalhar e viver no Centro do país. A sua estratégia passa pela valorização dos recursos e dos produtos tradicionais, com uma clara aposta em projetos geradores de mais emprego. Um bom exemplo é o da valorização da fileira do queijo da região Centro, o do vinho e o da floresta, já no terreno.

Só o projeto da fileira do queijo conta com um investimento de três milhões de euros e um consórcio de 15 entidades. Tudo em prol da valorização de queijos de Denominação de Origem Protegida (DOP): Serra da Estrela, Beira Baixa e Rabaçal. Outro dos objetivos é aportar o conhecimento, inovação e tecnologias para as atividades tradicionais, como a da pastorícia e do queijo. Nesse sentido, vai nascer um projeto pioneiro em Portugal: uma escola do pastor.

Ana Abrunhosa explica nesta entrevista os pilares da estratégia de desenvolvimento que está a ser seguida na CCDR Centro.

 

Defende que as pessoas da região Centro devem ter as mesmas oportunidades que as que vivem no resto do país. Como se torna isto uma realidade?

Este é o objetivo dos fundos europeus, promover a coesão social e territorial. Uma característica destes territórios é que não têm pessoas que, considerando critérios meramente de população e económicos, justifiquem os equipamentos sociais, de saúde, educação e de justiça, que têm que existir, tendo o país que estar disponível para fazer estes investimentos. Caso contrário, não conseguimos estancar a desertificação destes territórios.

Há investimentos que fazemos na região que, se considerarmos os critérios meramente da população ou económicos, não os faríamos. Temos a obrigação de os fazer na mesma, porque o país tem de contrariar a desertificação destes territórios.

 

Como se combate a desertificação?

Não podemos ter a utopia de ambicionar acabar com a desertificação em todos os territórios. Nesta perspetiva realista, temos que, em primeiro lugar, tornar estes territórios atrativos para as pessoas que lá vivem e trabalham, e garantir que têm as mesmas oportunidades em termos de carreira, de acesso aos serviços de lazer e outros serviços básicos que têm as pessoas que vivem noutros territórios.

Se forem atrativos, além da valorização económica inovadora dos recursos endógenos, temos também que tentar encontrar condições para atrair novas empresas e pessoas para estes territórios, de modo a diversificar a sua base económica.

 

Que condições são necessárias para criar pólos de atratividade?

Temos de criar condições, em termos de política pública, diferenciadoras para estes territórios, e que os tornem efetivamente mais atrativos para nova atividade económica. O país tem de estar disposto a fazer este investimento.

O pior que podemos fazer é tratar igual o que é diferente. Portanto, estes territórios são mais frágeis, mas têm potencialidades enormes por explorar e que o país não deve desperdiçar. Sabemos que com os projetos em curso não vão travar a desertificação, mas permitem que a sangria de pessoas e de atividade económica não seja tão grande.

Muitas vezes o problema destes territórios nem é um problema de falta de recursos, mas da maneira como utilizamos esses recursos. Se trabalharmos em rede, um cêntimo é multiplicado mais vezes do que se trabalharmos individualmente.

Em rede criamos sinergias e complementaridades, partilhamos competências e riscos. E isto é ainda mais verdade nos territórios mais frágeis, onde faltam instituições e onde muitas das vezes temos enormes falhas de mercado. O grande problema destes territórios é a falta de pessoas!

 

E o poder de atração das cidades?

O poder de atração das cidades é incontornável. Temos um dilema grande. É nos centros urbanos que a maior parte da população vive, trabalha e se diverte, mas esta concentração de pessoas e de atividade económica gera problemas e necessidade de investimento público. É também onde temos problemas graves. Temos, por exemplo, que ter hospitais grandes, universidades com qualidade. Temos de investir onde estão as pessoas, mas não podemos deixar de investir nos territórios mais frágeis, que têm falta de pessoas.

 

Qual é a importância dos projectos estruturantes regionais?

O importante nos projetos estruturantes regionais é ter uma visão de conjunto do território, dos seus problemas, dos seus recursos e dos agentes, trabalhar em rede, numa perspetiva de completar, capacitar e valorizar as cadeias de valor. Só assim será possível criar mais emprego e riqueza nestes territórios.

 

É o caso do programa de valorização da fileira do queijo da região Centro?

Sim, esse projeto insere-se no âmbito de uma estratégia que temos implementado na região e que consiste em valorizar economicamente os nossos principais recursos, explorando as suas potencialidades numa perspetiva de cadeia de valor.

Isso obriga-nos a trabalhar em rede, articulando os vários atores e instituições que fazem parte da cadeia de valor em causa. Também incorporamos nos projetos uma componente de conhecimento e de inovação, mesmo (ou sobretudo!) quando estamos a falar de atividades tradicionais. É o caso da fileira do queijo, que é um dos produtos regionais identitários da região, mas também na área do vinho, na área da floresta e do agro-alimentar.

 

O projeto do queijo é o mais recente? Quanto envolve de financiamento?

Sim, é o mais recente. Este projeto tem um investimento de cerca de três milhões de euros, tem financiamento do Programa Centro 2020 de dois milhões euros e tem um financiamento para a rota turística por parte do Programa Valorizar promovido pelo Turismo de Portugal de 200 mil euros. Portanto, é um projeto que também diversificou as fontes de financiamento.

 

Que territórios abrange o programa de valorização económica da fileira do queijo?

O âmbito do projeto são os territórios onde há queijos de Denominação de Origem Protegida (DOP) – regiões da Serra da Estrela, Beira Baixa e Rabaçal. Estes queijos são produzidos por vários produtores, que se agrupam em cooperativas, fundamentais para que o produto ganhe alguma escala no mercado. O projecto ocupa uma parte muito importante da região, mas sobretudo estamos a falar da Beira Baixa, Beiras e Serra da Estrela e Viseu e Dão-Lafões. No caso do queijo do Rabaçal já estamos a falar da região de Coimbra.

 

Quais os principais objetivos do projeto?

Um dos principais objetivos é tornar a fileira do queijo mais atrativa e competitiva em termos de atividade económica porque existe um problema de falta de atratividade de pessoas mais jovens para este setor de atividade e também um problema de falta de terras para o pastoreio. Além disso, visa-se valorizar o produto final no mercado, através de uma maior aposta na certificação, garantia de qualidade e segurança alimentar para o consumidor.

Qual a sustentabilidade desta atividade se as gerações mais novas não estão sensibilizadas para a mesma? Como se contorna esta situação?

A maioria dos pastores já têm uma idade avançada, havendo poucos jovens. É uma das características do setor, porque os atores desta atividade económica não se têm rejuvenescido. Isso é uma realidade, como noutras áreas de atividade, nestes territórios. Tornar esta atividade económica mais atrativa para os mais novos, através, por exemplo, de uma escola de pastores, como já é feito em Espanha e noutros países poderá ser uma solução, que está, aliás, contemplada no projeto.

A ideia é ajudar os jovens com formação intensiva e apoiá-los no início da atividade com o "vale pastor". Os conteúdos da formação são definidos pelos institutos politécnicos que também estão envolvidos neste projeto. Também está previsto um banco de terras, que será tarefa das autarquias, e o apoio aos produtores na certificação do queijo, de modo a aumentar a produção do queijo DOP.

Como se sabe, há muito queijo à venda que não é queijo DOP e isto não quer dizer que não seja queijo bom, mas o queijo DOP é um produto certificado que dá garantias adicionais ao consumidor. Claro que a certificação tem custos e, ao ter custos, muitas das vezes os produtores não têm o estímulo para certificarem o seu produto.

 

Como se convence os produtores a investir dinheiro na certificação?

Convencendo-os de que o seu produto será mais valorizado pelo mercado e que vão receber mais pelo produto que vendem.

 

Os consumidores pagarão mais pelo facto de o queijo ser DOP?

É preciso fazer ações de sensibilização junto dos consumidores para mostrar a importância e a diferença de qualidade, de higiene e de segurança que envolve um produto certificado. Sabemos que, como não temos quantidade, temos de ter qualidade. Este é um produto para nichos de mercado e a ideia é que cada quilograma e cada unidade tenha um valor maior de mercado. Se o consumidor estiver disposto a pagar mais, esse maior valor vai-se repercutir pela cadeia, desde o pastor até ao vendedor. Deste modo, compensará ao produtor investir na certificação.

Relativamente a este aspeto, é muito importante promover-se a capacitação das cooperativas e das associações que certificam o queijo, e dotando-as de tecnologias mais inovadoras, estimulando-as a adotarem procedimentos mais ágeis e eficazes, ou seja, ajudando-as a serem mais competitivas face às exigências que hoje um produtor de queijo tem.

Qual é o papel da marca Queijo Portugal neste projeto?

A ideia é usar a marca Queijo Portugal na internacionalização, porque a multiplicação de marcas é, muitas vezes, um factor de ruído. A questão da marca Queijo Portugal permite ter uma marca única e conjunta para os queijos, mas respeitando a identidade de todos os queijos.

 

Que impacto e importância tem este projeto para a região Centro?

Primeiro, é uma forma de ocuparmos e valorizarmos o território, bem como os recursos e produtos que temos e que são tradicionais. A atividade não tem de ser feita ou continuar a ser feita da forma tradicional como no tempo dos nossos avós. Também não tem de passar a ser um produto industrial. Combinamos a tradição com a modernidade, garantindo ao consumidor um produto com identidade e que não existe em mais parte alguma do mundo.

A mesma lógica de valorização da fileira do queijo está a ser aplicada no projeto do vinho?

O projeto do vinho tem a mesma metodologia do projeto do queijo. Na região Centro temos cinco comissões vitivinícolas regionais (CVR): Tejo, Lisboa, Bairrada, Beira Interior e Dão. Cada uma delas solicitava recursos para os seus projetos, de forma individual. Reunimos as cinco CVR, que se sentaram à mesma mesa de trabalho pela primeira vez, e fizemos-lhes o desafio de trabalharem um projeto de fileira em conjunto, desde a investigação até à promoção do produto.

Os politécnicos da região estão muito envolvidos neste projeto na componente de investigação, fazendo parcerias com os produtores de vinho, cujas vinhas são o próprio campo de investigação.

É a mesma lógica do projeto do queijo. Um projeto de fileira/cadeia de valor, que envolve os atores relevantes em consórcio, desde os politécnicos às comissões vitivinícolas regionais, passando pelos produtores de vinho até aos promotores turísticos do território.

A ideia central é que cada vez mais produtores vendam o seu vinho certificado. O objetivo é o mesmo: qualificar e valorizar os produtos, trazendo, por essa via, mais riqueza para a região.

 

E o projeto da floresta?

Consiste na valorização económica dos produtos da floresta. Permite integrar os diversos agentes da fileira da floresta, desde viveiristas, produtores florestais, associações de produtores, municípios, cluster da floresta, centros de investigação, universidades e politécnicos.

Começa com o desenvolvimento e implementação de um projeto piloto que permitirá desenvolver e otimizar técnicas e soluções de gestão florestal, ferramentas e soluções para gestão integrada, desenvolver produtos e soluções de maior valor acrescentado e testar soluções avançadas que viabilizem a articulação da produção florestal com as necessidades da indústria.

Pretende-se que seja um projeto iminentemente demonstrador, que posteriormente possa ser replicado e em que o conhecimento produzido, testado e validado possa ser utilizado noutros territórios. Visa-se demonstrar que é possível melhorar de forma transversal as condições de exploração da floresta; a silvicultura de prevenção pode ser muito eficiente na mitigação de riscos; a certificação e promoção permitem incrementar de forma significativa o valor acrescentado; existe um potencial elevado de criação de pequenas empresas e negócios para responder a problemas existentes.

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