A Associação Portuguesa de Bancos (APB) acredita que 2017 será um ano de viragem para o sector bancário nacional.
A crise soberana e a consequente recessão económica provocaram uma destruição significativa de capital e da rentabilidade da banca nacional, mas existiram importantes desenvolvimentos recentemente que ajudaram a fortalecer a estabilidade do sector, dos quais merecem destaque: os reforços de capital e as reestruturações accionistas nos maiores "players" do sector, que melhoraram a sua solvência e a resiliência global do sistema, e o aumento da robustez dos balanços.
Daqui em diante, os tempos são de grandes desafios. Catarina Cardoso, directora do Centro de Assessoria Económica e Financeira da APB, destaca como mais significativos a recuperação da rentabilidade, a atracção de capitais privados e a alteração do modelo de negócio, fruto da digitalização.
Dos desafios que assinala, quais são os mais estimulantes e quais os mais perigosos?
No que respeita à rentabilidade, a sua melhoria depende, por um lado, de factores cíclicos, como a procura de crédito, a recuperação das taxas de juro e das comissões, e, por outro, de factores estruturais, como a melhoria da eficiência e a redução do stock de crédito malparado (NPL).
A baixa rentabilidade penaliza a possibilidade de se gerar organicamente capital e de atrair investidores e, nessa medida, a recuperação da rentabilidade é um imperativo do sistema bancário nacional.
Por seu turno, a digitalização e a inovação tecnológica trazem grandes desafios em termos do modelo de negócio, mas acarretam igualmente enormes oportunidades ao nível da redução de custos e do aumento da eficiência.
A internet obrigou a sector financeiro a reinventar-se?
Pela sua própria natureza, os bancos adoptam activamente a tecnologia financeira no desenvolvimento e aperfeiçoamento contínuo dos seus produtos e serviços, por forma a dar resposta às necessidades dos clientes.
Nalguns casos, a transformação digital tem vindo a ser feita através do estabelecimento de parcerias com start-ups, enquanto noutros, os bancos estão a transformar-se por conta própria. Mas é importante que se perceba que os bancos são eles próprios "fintech". A tecnologia financeira faz parte do ADN do sector.
Ao contrário da ideia que tem passado, o sector entende que a competição entre bancos e não bancos é saudável para o mercado e deve ser incentivada. Mas é importante garantir que assenta num quadro legal e regulatório comum. Por isso, aquilo que defendemos é: "Same business, same risks, same rules, same supervision."
Como encaram a ascensão da banca online no panorama financeiro?
A banca online e a mobile são uma realidade já muito enraizada no sistema bancário nacional, embora o quadro legal e regulamentar vigente não permita tirar total partido das suas potencialidades. Este é um aspecto em que a APB tem vindo intensamente a trabalhar, identificando e sensibilizando os legisladores e reguladores, nacionais e europeus, para a necessidade de remoção de obstáculos legais e regulamentares que impeçam ou dificultem a transformação digital dos seus associados.
Importa referir que encontrámos no supervisor nacional igual preocupação com estas questões, sendo de assinalar uma recente alteração regulamentar levada a cabo pelo Banco de Portugal, que passou a permitir aos bancos portugueses a abertura de contas à distância, eliminando uma desvantagem competitiva dos bancos nacionais face aos congéneres europeus.
A próxima grande evolução será ao nível do estabelecimento de outras relações de negócio à distância, no qual se colocam ainda alguns desafios, designadamente em termos de assinatura digital.
O sector está a seguir no bom caminho?
Sim, há importantes desenvolvimentos a assinalar no que respeita ao reforço da estabilidade do sistema, como já referido. Relativamente à transformação digital, está em pleno andamento nos bancos portugueses, porventura com menos divulgação do que nalgumas instituições noutros países, mas é um facto indiscutível que os bancos nacionais estão claramente apostados no desafio da digitalização e no desenvolvimento de produtos e serviços que melhor respondam às novas necessidades dos clientes. Visa-se a aproximação rápida aos casos de maior sucesso, como o dos países nórdicos.
Como é que a APB vê a banca do futuro?
A banca do futuro, que é já, aliás, a banca do presente, é uma banca centrada no cliente e multicanal, que oferece respostas diferenciadas de acordo com as necessidades de cada cliente, assentes em diferentes plataformas.
As instituições estão preparadas?
Como já foi referido, a tecnologia e a inovação sempre fizeram parte do ADN do sector. Os bancos sempre apostaram em tecnologia, com o objectivo de disponibilizar produtos e serviços inovadores, prestar um melhor serviço aos seus clientes e garantir um nível de segurança elevado.
Exemplo disso são alterações significativas na forma como estávamos habituados a lidar com o nosso banco, desde o aparecimento do Multibanco ao "homebanking" 24 horas por dia, até aos dias de hoje, em que já é possível fazer pagamentos instantâneos com um telemóvel.
A banca sempre foi pioneira na inovação, pelo que estamos certos de que com o desafio da digitalização não será diferente.
Que recomendações daria à banca num momento em que estão a digitalizar-se para atender às necessidades das novas gerações de utilizadores?
A banca deve pensar na digitalização não só para servir as necessidades das novas gerações, mas aproveitar a transformação digital para repensar, como já se encontra a fazer, os seus processos internos, de forma a tornar-se mais eficiente e servir melhor todos os clientes.