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Salvação do rei dos cogumelos suspensa por 30 dias

Os credores do grupo Sousacamp têm 10 dias para votar o plano de viabilização do maior produtor ibérico de cogumelos, que prevê um perdão de 40 milhões de euros com o Novo Banco à cabeça, e cuja homologação ficará ainda pendente de acordo sobre duas condições suspensivas.

No verão de 2016, Marcelo Rebelo de Sousa visitou a empresa fundada por Artur Sousa (à direita, na foto). José Coelho/Lusa
03 de Março de 2020 às 18:00
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Ainda não foi esta terça-feira, 3 de fevereiro, que foi decidido o destino do maior produtor ibérico de cogumelos.

 

Após ter sido adiada duas vezes, a assembleia de credores da Varandas de Sousa, o braço industrial do insolvente grupo Sousacamp, decidiu dar 10 dias para que seja votado por escrito o plano de viabilização da empresa, cuja homologação pelo tribunal ficará ainda dependente da aprovação de duas condições substanciais.

 

São condições suspensivas que, caso não sejam cumpridas nos próximos 30 dias, impedirão a luz verde judicial ao plano de recuperação do grupo, mesmo que este seja favoravelmente votado pelos credores até 13 de março.

 

Em causa está o acordo entre o Novo Banco, a massa insolvente, o novo investidor - a capital de risco Core - e o Instituto de Financiamento da Agricultura e Pesca (IFAP) para suspender a garantia bancária prestada a esta entidade pública, no valor de 5,2 milhões de euros, por conta do financiamento de 17 milhões de euros de um projeto que parou a meio.

 

A outra condição para a viabilização do grupo Sousacamp passa pelo fecho de negociações, nos próximos 30 dias, para a venda dos créditos do Novo Banco e do Crédito Agrícola à Core Capital.

 

Recorde-se que, para uma dívida total de cerca de 60 milhões de euros, o credor maioritário, o Novo Banco, aceitou fazer um "haircut" de 24 milhões de euros dos mais de 34 milhões de euros que tinha a haver, enquanto o grupo Caixa Agrícola Mútuo fez um desconto de 11 milhões aos 15,9 milhões de euros que reclamava.

 

Já os credores comuns foram obrigados a perdoar praticamente todos os seus créditos sobre a Varandas de Sousa. Estão em causa empresas como o grupo Galp (203 mil euros), a EDP (42 mil), a Euroguano (270 mil), a Saica Pack (262 mil) ou a Caterpillar (162 mil euros).

 

Com os créditos do Fisco (2,4 milhões de euros) e da Segurança Social (881 mil euros) a serem pagos na totalidade, resta saber o destino dos créditos do IFAP.

 

O plano de recuperação em votação prevê um investimento de 13 milhões de euros nas fábricas de Benlhevai (Vila Flor) e Vila Real, a realizar pelo novo investidor, assim como a dispensa de cerca de 90 dos atuais 450 trabalhadores, efetivo entretanto reduzido para 430 face à saída de 20 por comum acordo, de acordo com a informação prestada pelo administrador de insolvência da empresa.

 

Prevendo para este ano uma faturação a rondar os 17 milhões de euros, mais três milhões do que no ano passado, o plano de recuperação da Sousacamp projeta chegar aos 26 milhões de euros dentro de cinco anos, já depois do investimento de 13 milhões prometido pela Core Capital.

Falência do BES marcou o início da queda do "rei" Artur

Artur Sousa, filho de produtores de azeite e cortiça de Vila Flor, distrito de Bragança, trocou o curso de Engenharia Eletrotécnica, no Porto, pelo de Microbiologia, em Eindhoven, onde despertou para algo praticamente inexistente em Portugal: a produção de cogumelos. Voltou para Benlhevai e, em 1989, investiu 25 mil contos (125 mil euros) na criação da Sousacamp.

 

A meio da primeira década do novo século, o crescimento da produtora de cogumelos determina a expansão fabril para outras geografias, concretamente para Mirandela, Paredes, Sabrosa e Vila Real. Depois, adquiriu duas unidades em Espanha.

 

Apresentava-se então como o maior produtor europeu de cogumelos e um dos maiores do mundo. Chegou a empregar mais de 500 pessoas e a faturar 50 milhões de euros.

 

Depois de ter investido 50 milhões de euros – tanto quanto dizia faturar – na abertura de fábricas em Portugal e Espanha, o grupo arrancou em 2013 com a construção de uma unidade de produção de cogumelos exóticos e outra de transformação de cogumelos em conserva (em lata e congelados), em Vila Real, num investimento orçado em 45 milhões de euros e que iria criar 200 postos de trabalho.

 

"Será um dos maiores complexos do mundo no setor", afiançava Artur Sousa (que tem 60,9% do capital), em outubro desse ano, numa publicação patrocinada pela Espírito Santo Ventures (ES Ventures), que detinha 39,1% na Sousacamp.

 

Apontada diversas vezes como um "case study", a Sousacamp vinha acumulando prémios e distinções. Por exemplo, ganhou o 1.º Prémio Nacional de Jovem Empreendedor (1990) e o Prémio Nacional de Inovação Ambiental (2001) pelo European Environmental Press e pela revista "Indústria e Ambiente".

 

A falência do BES, no Verão de 2014, marca o início da queda da Sousacamp. O Novo Banco "fechou a torneira" ao grupo e vendeu, em 2016, os fundos de capital de risco ES Ventures, que passaram a ser geridos pela Armilar Venture Partners, que têm a Sonae como um grande investidor.

 

A acumular prejuízos, o grupo aderiu, no final de 2017, ao Processo Especial de Revitalização (PER), o qual, depois de chumbado um primeiro plano de recuperação, viria a converter-se no processo de insolvência em curso.

 

A principal razão apontada para a situação em que o grupo se encontra foi mesmo a queda do BES, que até então [Verão de 2014] estava a financiar a construção da gigantesca unidade de produção de cogumelos, cuja obra, onde foram já investidos cerca de 20 milhões de euros, ficou a meio.

 

A 5 de julho de 2016, Marcelo Rebelo de Sousa, em visita à fábrica da Sousacamp, em Vila Flor, Trás-os-Montes, proferia a sua mais conhecida metáfora sobre estabilidade política, enquanto olhava para os dois fungos que tinha nas mãos, que acabou por provar. 

 

"É o chamado duplo cogumelo - cogumelo gigante, presidencial, isto é o cogumelo presidencial com este tamanho. Não, tem de ser, este é o Presidente da República e este é o Governo que é mais pequenino. Solidariedade institucional, o Presidente para aguentar o Governo por uns tempos", proclamou, na altura, o Chefe de Estado.

 

Artur Sousa era conhecido como "o rei dos cogumelos".



(Notícia atualizada às 18:21)

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