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A década perdida do Brasil: os custos invisíveis da recessão

O colapso económico e político em que caiu o Brasil é particularmente visível no aumento da pobreza e na degradação das infra-estruturas. Os cortes orçamentais prejudicam especialmente os mais pobres e dificultam a ascensão social.

27 de Agosto de 2017 às 12:00
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O aumento da mendicidade nas ruas e a deterioração das infra-estruturas talvez sejam os sintomas mais evidentes do colapso económico e político do Brasil. No entanto, as consequências menos visíveis — como o cancelamento de refeições escolares e os cortes em pesquisas médicas que poderiam salvar vidas — são as que podem deixar um legado mais devastador.

Anos de ajustes após o fim do 'boom' das 'commodities' restringiram a despesa governamental em educação, saúde, investigação e policiamento. A redução da presença policial levou ao aumento da criminalidade e à desflorestação da Amazónia — antigos problemas brasileiros que agora estão piores.

As consequências da austeridade exacerbam o desprezo quase universal da elite política do país após três anos de escândalos. E realçam um fenómeno que se reflecte numa tendência crescente em todo o mundo, ao agravar o risco de de fazer chegar ao poder um 'outsider' nas eleições gerais do próximo ano.

"Recuperar o desenvolvimento perdido consumirá, no mínimo, todo o mandato do próximo presidente, isto se tudo correr bem", disse Carlos Langoni, ex-presidente do Banco Central e director do Centro de Economia Mundial da Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro. "A nossa grande frustração, como economistas e brasileiros, é que o país já poderia estar noutro nível de desenvolvimento e bem-estar social, e estamos a perder tempo."


Outrora a 'queridinha' de Wall Street dos mercados emergentes, a economia brasileira passou de um crescimento de 7,5%, em 2010, para uma contracção de praticamente a mesma percentagem nos últimos dois anos. O desemprego aumentou para um patamar quase recorde, o PIB per capita caiu para os níveis de 2009 e o défice orçamental está em torno de 10% do PIB. Não existem sinais de que o gigante latino-americano irá recuperar em breve o estatuto de grau de investimento.

Os recuos recentes dissiparam grande parte da esperança que os brasileiros detinham em relação ao país ao longo da década de 2000, quando o aumento dos preços da soja, do café e do açúcar triplicaram as exportações e encheram os cofres do governo. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu inúmeros elogios internacionais por começar a acabar com alguns dos símbolos do atraso do Brasil, como a desnutrição e a destruição de grandes áreas da Amazónia.

Milhões de brasileiros saíram da pobreza durante o governo Lula e começaram a apreciar o estilo de vida da classe média. Hoje, escalar a estrutura socio-económica do Brasil, notoriamente rígida, é impossível para a maioria das pessoas.

Cortes no orçamento

Estudar com o estômago vazio, afirmam os especialistas, prejudica a aptidão escolar e diminui potencialmente o desempenho no mercado de trabalho. Na Bahia, estado do Nordeste, as autoridades locais culpam os cortes no orçamento realizados pelo governo federal pela falta de refeições escolares.

"Este ano a situação piorou", disse Rui Oliveira, da Associação dos Professores Licenciados do Brasil – Secção da Bahia. "No interior do estado, onde a situação é mais intensa, esta é a única fonte de alimento das crianças."

Saullo Rosa, de 26 anos, é filho de pais analfabetos funcionais de uma cidade assolada pela criminalidade, perto do Rio de Janeiro. Seria o primeiro membro da família a formar-se na faculdade — até o estado ficar sem dinheiro para pagar professores e a escola suspender as operações.

Para os brasileiros com idade entre os 14 e os 24 anos de idade, o mercado de trabalho apresenta-se particularmente desolador, sendo que mais de um em cada quatro jovens estão desempregados, de acordo com o Instituto de Pesquisa Económica Aplicada, administrado pelo governo.



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