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Governo aprova propostas para proteger denunciantes e negociar penas
O Governo aprovou esta quinta-feira em Conselho de Ministro um conjunto de diplomas que concretizam a estratégia nacional contra a corrupção. Haverá medidas para incentivar e proteger denunciantes, passa a ser possível negociar a pena e em alguns casos pode mesmo haver dispensa da pena.
As medidas que atualmente já existem sobre dispensa de pena em determinadas condições vão ser aprofundadas e a situações em que, na fase de julgamento, passará a ser possível negociar a medida da pena, em função do comportamento do arguido e da forma como colabore com as autoridades. Estas são duas das medidas que integram um pacote de diplomas sobre corrupção aprovados esta quinta-feira em Conselho de Ministros.
O Governo concretiza, desta forma, a Estratégia Nacional contra a Corruopção, apresentada no início do mês. Francisca Van Dunem não quer falar em delação premiada, mas diz que foi identificada "uma necessidade de quebrar os pactos de silêncio", lembrando que "a corrupção envolve crimes sem vítima, que lesam interesses macro sociais e envolvem pactos de silêncio", os quais a proposta agora aprovada pelo Executivo pretende "ajudar a romper e facilitar o acesso à prova".
Sublinhando que o "Governo [está] fortemente empenhado neste pacote" de medidas anti-corrupção, a ministra realçou que no âmago das propostas do Executivo está uma "perspetiva de criação de condições efetivas quer à prevenção quer à repressão" de fenómenos de corrupção.
"Não temos a delação premiada, mas o aprofundamento de uma coisa que já temos, que é a dispensa da pena, só que o processo é tão complexo que na prática não se utiliza e o que fizemos foi eliminar os principais obstáculos", concretizou a ministra. Assim, a proposta é que "seja possível a dispensa da pena em determinadas condições, simplificando as regras que hoje já existem".
A diretiva que está agora a ser transposta aplica-se a denunciantes no interior de organizações e a um elenco de crimes relacionados com a transparência dos mercados, livre concorrência e, também, crimes económico-financeiros. "Para além de as pessoas terem um canal que permite que façam denúncias e não se exponham, há uma segunda dimensão que é a insuscetibilidade de ser alvo de retaliação", explicou a ministra. Por outras palavras, o denunciante não poderá ser despedido, não lhe podem mudar as condições de trabalho e, tratando-se de um contrato a prazo, havendo uma expetativa legítima de ser renovado, não pode deixar de haver a renovação, concretizou a governante.
Dispensa obrigatória e facultativa
Quanto à dispensa da pena, a mesma poderá ser aplicada dentro de dois modelos: dispensa obrigatória e dispensa facultativa. Com requisitos: no primeiro caso, é preciso que o agente denuncie o facto antes de instaurado o processo criminal, que retire a promessa que fez, devolva a dádiva recebida e que colabore com o Ministério Público. "Tratando-se de crimes de menor gravidade, a dispensa é apresentada ao juiz que avalia a verificação dos pressupostos", explicou a ministra.
Esta dispensa de pena não se aplicará na corrupção para ato ilícito ao agente que tenha praticado o ato. Já na corrupção para ato lícito, poderá aplicar-se.
Há depois, na fase do julgamento, a possibilidade de acordos para negociar a pena a aplicar. "Vimos de um inquérito em que a prova foi produzida, chega-se a julgamento e perante um contexto em que há muita prova para produzir, extensa prova documental, se o arguido avançar com a confissão integral, admite-se a possibilidade de um acordo não em relação à própria pena, mas entre os limites máximo e mínimo da pena. Neste caso, a medida, que tem vindo a ser aplicada com êxito em vários países", não será apenas para o crime de corrupção".
Ainda que a ministra assegure que nenhuma das medidas agora anunciadas traz novidades face à estratégia anunciada em março devido às decisões da Operação Marquês, Van Dunem frisou a importância de criar condições para a existência de uma "prevenção efetiva através de julgamento e aplicação de sanções", isto de modo a evitar a "incompreensão social" tantas vezes suscitada por "processos muito longos" e "resultados [que] por vezes não coincidem com aquilo que são as expectativas".
Ao nível do processo penal há também novidades, nomeadamente no sentido de evitar "constrangimentos" que hoje existem e "são conhecidos de todos", disse a ministra. Nesse sentido ao nível da conexão de processos, por exemplo, haverá uma intervenção "no sentido de facilitar a separação de processos", evitando os chamados mega-processos, de investigação mais lenta e demorada.
Por outro lado, passa a haver um acesso direto a informação de contas bancárias por parte de um conjunto de entidades ligadas à investigação criminal: Departamento Central de Investigação e Acção Penal, Unidades de Investigação Financeira da Polícia Judiciária, e Gabinete de Recuperação de Ativos. Este acesso ficará, no entanto, limitado "a certas categorias de crimes".
Finalmente, foram uniformizados os prazos de prescrição, que hoje em dia são diferentes no código penal e em legislação avulsa.
(notícia atualizada com mais informação)