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Os recados de Teodora sobre a gestão do Orçamento
A pouco mais de um mês da apresentação do OE, a presidente do Conselho de Finanças Públicas publicou um artigo onde identifica uma série de preocupações sobre a gestão orçamental em Portugal e deixa ideias sobre o que devia ser feito.
A presidente do Conselho de Finanças Públicas (CFP) publicou um artigo onde deixa uma série de alertas sobre gestão orçamental. Numa altura em que o Governo prepara o Orçamento do Estado para o próximo ano, Teodora Cardoso critica a estratégia orçamental seguida em 2016, de recurso ao PERES, cortes no investimento e uso de "cativações excepcionais". Mas não só.
O artigo, intitulado "A gestão orçamental em Portugal: aspirações em busca de soluções", foi publicado esta quinta-feira pelo CFP.
A presidente do CFP lembra que em 2015 foi aprovada uma alteração à Lei de Enquadramento Orçamental que "finalmente começa a integrar, não só princípios indispensáveis a um processo orçamental compatível com o Estado social que a Constituição consagra, mas também regras e instrumentos de gestão e controlo susceptíveis de promover o seu cumprimento".
Teodora Cardoso reconhece que a complexidade das novas regras obrigou a considerar um período transitório de três anos para a implementação efectiva da nova lei.
Apesar do alargado período de implementação, a presidente da instituição detecta já um problema à partida. É que, "no que respeita à formação prática dos utilizadores [do novo sistema de contabilidade previsto na nova lei], está agora reduzido a menos de um ano, dado a entrada de vigor do SNC-AP estar prevista para 2018".
A presidente da instituição admite que "restará a capacidade de improvisação de que tantas vezes nos orgulhamos, mas cujos resultados habitualmente se traduzem no acumular de problemas".
A receita errada de 2016
No mesmo artigo, Teodora Cardoso refere-se a práticas orçamentais que o Governo usou em 2016 e que considera não serem as melhores para a boa gestão orçamental.
"Observámos entretanto em 2016 o reforço do uso de instrumentos de recurso (como o PERES ou os cortes no investimento) e carecendo de transparência (como as cativações excepcionais) que, ao invés de caminharem na direcção desejada, reiteraram as práticas que o novo enquadramento procura corrigir."
Teodora Cardoso explica que os objectivos de crescimento económico e de segurança social supõem um "quadro de política económica que assente na confiança dos investidores e dos aforradores, não no cumprimento formal de regras mediante mecanismos de intervenção casuística". O recurso a estas soluções pode ter vantagens no curto prazo, admite, "mas constitui um obstáculo ao reforço da capacidade regulatória e orçamental do Estado, o que, como a experiência mostra, acaba por frustrar os objectivos prosseguidos".
Mais responsabilidade para a Administração Pública
Para Teodora Cardoso, a melhoria das capacidades da Administração Pública para a gestão orçamental "vai além da formação" das equipas. A presidente do CFP considera que essa melhoria tem de resultar também de "graus de autonomia e de responsabilização de gestão muito superiores".
Segundo a economista, a Administração Pública "vive desde há décadas num regime de congelamentos, entrecortados de "reformas", que a desligou da realidade circundante". Só com uma Administração Pública capacitada e capaz de "acompanhar e avaliar" um debate de alternativas "segundo critérios de rigor técnico" é possível um processo de tomada de decisões que ajude a melhorar a gestão orçamental. "Esta é uma área em que praticamente tudo está por fazer e que não se resolve mediante cortes e reposições salariais."
Rever despesas juntamente com os serviços públicos
Outro dos temas abordados por Teodora Cardoso no mesmo artigo é a revisão da despesa. A presidente do CFP defende "a instituição de um sistema de revisão abrangente e permanente de despesas que substitua aos habituais argumentos de falta de meios a coerência e priorização dos objectivos e a sistemática avaliação do uso desses meios". O objectivo é fazer este exercício permanentemente e "totalmente integrada no processo de elaboração do Orçamento do Estado".
A revisão de despesas permite identificar poupanças e ajuda a definir prioridades, "o que a distingue de congelamentos e cortes horizontais". Por isso, é um exercício que deve ser supervisionado pelo Ministério das Finanças e só é viável "na presença de um forte compromisso e liderança política".