Notícia
Um vinho que nasceu através de “crowdfunding”
O enólogo Hugo Mendes perseguia um vinho branco da região de Lisboa. Não tinha massa para a aventura, pelo que pediu aos amigos para lhe comprarem parte da produção "en primeur". Enfim, uma espécie de “crowdfunding”.
19 de Agosto de 2017 às 13:00
O "crowdfunding" é aquele sistema de financiamento moderno e alternativo com uma boa dose de romantismo à mistura. Hoje, há projectos suportados por "crowdfunding" para tudo e mais alguma coisa, mas eu não tinha era conhecimento de que alguém tivesse criado um vinho através desta lógica. Resolvo assim a questão, apresentando este Hugo Mendes Lisboa, de 2016.
Na realidade, estamos perante uma modalidade peculiar de "crowdfunding". O enólogo Hugo Mendes, conhecido nuns circuitos mais restritos por fazer excelentes vinhos com a casta Arinto (trabalha na Quinta das Murtas, Quinta das Carrafouchas e Vale das Areias), tinha há anos a ideia de explorar por outras vias a casta Fernão Pires, provavelmente a variedade de uva branca mais plantada em Portugal. Como teria de fazer investimentos consideráveis, lançou no mercado uma espécie de petição para a compra "en primeur" (a malta paga antes de ter o vinho porque confia no produtor) para cerca de 800 garrafas de um vinho já feito. Vendeu-as todas a €9 e, com o dinheiro, custeou o engarrafamento de 2300 garrafas. Dito assim, é fácil, não? Pois, mas fundamental é ter a ideia e colocá-la em prática.
Por regra, as uvas Fernão Pires destinam-se à produção de vinhos para consumo rápido, sempre com um perfil muito floral e frutado. A casta é amiga do agricultor, os vinhos escoam-se bem e - muito importante - a preços competitivos.
Agora, a ideia de Hugo Mendes era outra. Como, volta e meia, prova umas garrafas de Fernão Pires que alguém se esqueceu de vender, sabe perfeitamente que, em determinadas circunstâncias, o vinho evoluiu muito bem. Ou seja, em vez de explorar os tais aromas de flores e fruta de polpa branca, caminha para aquele perfil mais cítrico e mineral.
Com isto no juízo, foi à procura da vinha ideal, encontrando-a na Quinta do Carneiro. Ribatejano de origem, cresceu com o cheiro das uvas Fernão Pires que passavam à frente casa nos reboques dos tractores, pelo que tem sensibilidade para perceber o carácter da casta. E, num determinado terroir da Quinta de Alenquer, encontrou as tais uvas que pretendia. Assim, o que faltava? Acidez daquela que é a casta que melhor conhece: o Arinto. Donde, o que temos nesta garrafa Hugo Mendes Lisboa (em que, com muita esperteza, a designação Lisboa se destaca, e de que maneira, da marca Hugo Mendes) é um lote de Fernão Pires mais sério com a frescura natural do Arinto.
Este vinho branco, pela sua história e pelo seu do seu criador, reavivou-me um pensamento antigo que é a associação didáctica entre um enólogo e uma determinada casta. Eu explico. Se hoje sabemos muito sobre Alvarinho, isso deve-se a Anselmo Mendes e Luís Cerdeira; se hoje percebemos a Baga, isso tem muito que ver com a teimosia de Luís Pato. Mas, perguntemos agora: quem é o senhor Arinto? Ou quem é o senhor Fernão Pires? A questão não é quem trabalha a casta ou quem fez coisas interessantes com a mesma. A questão é quem, assim de repente, identificamos como o enólogo que tem um trabalho estruturado e longo com estas castas. Um enólogo que, quando mencionado, a nossa mente associa de imediato ao Arinto e ao Fernão Pires.
E, se eu não conheço (poderá ser ignorância minha), não quero dizer que seja Hugo Mendes. O que quero dizer é que, se continuar por este caminho, ele pode fazer destas castas um trunfo pessoal. Pode fazer a diferença. E o mercado precisa mesmo muito dessa diferença.
Tal diferenciação do mundo do vinho faz-se por diferentes caminhos, sendo que um deles é o estudo do comportamento das castas em diferentes micro terroirs. Infelizmente, e retirando a princesa Touriga Nacional, as castas portuguesas não se discutem fora do âmbito académico ou empresarial. As únicas excepções que conheço foram para "as conversas à volta do Alfrocheiro", em 2016, na Quinta de Lemos, e "a tertúlia sobre a Vital", em 2017, na Casa das Gaeiras".
De maneira que, no meu entender, este vinho e o próprio percurso profissional de Hugo Mendes são uma boa justificação para se juntar à volta de uma mesa os interessados em vinhos de Fernão Pires e Arinto. Com vinhos novos e antigos, vinhos do centro, sul e norte, vinhos varietais ou vinhos de lote.
E, para isso, nem será necessário nenhuma iniciativa de "crowdfunding". Digam onde querem fazer o encontro que a aqui a malta do Negócios aparece e divulga. Pela educação dos leitores enófilos, fazemos tudo.
Na realidade, estamos perante uma modalidade peculiar de "crowdfunding". O enólogo Hugo Mendes, conhecido nuns circuitos mais restritos por fazer excelentes vinhos com a casta Arinto (trabalha na Quinta das Murtas, Quinta das Carrafouchas e Vale das Areias), tinha há anos a ideia de explorar por outras vias a casta Fernão Pires, provavelmente a variedade de uva branca mais plantada em Portugal. Como teria de fazer investimentos consideráveis, lançou no mercado uma espécie de petição para a compra "en primeur" (a malta paga antes de ter o vinho porque confia no produtor) para cerca de 800 garrafas de um vinho já feito. Vendeu-as todas a €9 e, com o dinheiro, custeou o engarrafamento de 2300 garrafas. Dito assim, é fácil, não? Pois, mas fundamental é ter a ideia e colocá-la em prática.
Agora, a ideia de Hugo Mendes era outra. Como, volta e meia, prova umas garrafas de Fernão Pires que alguém se esqueceu de vender, sabe perfeitamente que, em determinadas circunstâncias, o vinho evoluiu muito bem. Ou seja, em vez de explorar os tais aromas de flores e fruta de polpa branca, caminha para aquele perfil mais cítrico e mineral.
Com isto no juízo, foi à procura da vinha ideal, encontrando-a na Quinta do Carneiro. Ribatejano de origem, cresceu com o cheiro das uvas Fernão Pires que passavam à frente casa nos reboques dos tractores, pelo que tem sensibilidade para perceber o carácter da casta. E, num determinado terroir da Quinta de Alenquer, encontrou as tais uvas que pretendia. Assim, o que faltava? Acidez daquela que é a casta que melhor conhece: o Arinto. Donde, o que temos nesta garrafa Hugo Mendes Lisboa (em que, com muita esperteza, a designação Lisboa se destaca, e de que maneira, da marca Hugo Mendes) é um lote de Fernão Pires mais sério com a frescura natural do Arinto.
Este vinho branco, pela sua história e pelo seu do seu criador, reavivou-me um pensamento antigo que é a associação didáctica entre um enólogo e uma determinada casta. Eu explico. Se hoje sabemos muito sobre Alvarinho, isso deve-se a Anselmo Mendes e Luís Cerdeira; se hoje percebemos a Baga, isso tem muito que ver com a teimosia de Luís Pato. Mas, perguntemos agora: quem é o senhor Arinto? Ou quem é o senhor Fernão Pires? A questão não é quem trabalha a casta ou quem fez coisas interessantes com a mesma. A questão é quem, assim de repente, identificamos como o enólogo que tem um trabalho estruturado e longo com estas castas. Um enólogo que, quando mencionado, a nossa mente associa de imediato ao Arinto e ao Fernão Pires.
E, se eu não conheço (poderá ser ignorância minha), não quero dizer que seja Hugo Mendes. O que quero dizer é que, se continuar por este caminho, ele pode fazer destas castas um trunfo pessoal. Pode fazer a diferença. E o mercado precisa mesmo muito dessa diferença.
Tal diferenciação do mundo do vinho faz-se por diferentes caminhos, sendo que um deles é o estudo do comportamento das castas em diferentes micro terroirs. Infelizmente, e retirando a princesa Touriga Nacional, as castas portuguesas não se discutem fora do âmbito académico ou empresarial. As únicas excepções que conheço foram para "as conversas à volta do Alfrocheiro", em 2016, na Quinta de Lemos, e "a tertúlia sobre a Vital", em 2017, na Casa das Gaeiras".
De maneira que, no meu entender, este vinho e o próprio percurso profissional de Hugo Mendes são uma boa justificação para se juntar à volta de uma mesa os interessados em vinhos de Fernão Pires e Arinto. Com vinhos novos e antigos, vinhos do centro, sul e norte, vinhos varietais ou vinhos de lote.
E, para isso, nem será necessário nenhuma iniciativa de "crowdfunding". Digam onde querem fazer o encontro que a aqui a malta do Negócios aparece e divulga. Pela educação dos leitores enófilos, fazemos tudo.