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O alvo da apropriação

Uma operação comercial de Jeff Koons e da Louis Vuitton está a perturbar intensamente os mundos da arte e da moda.

30 de Abril de 2017 às 11:00
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Jeff Koons e a Louis Vuitton confirmam precisamente hoje que a construção permanente de um perfil público exuberante é uma condição fundamental para a sua sobrevivência. O artista nova-iorquino, provavelmente o mais fiel discípulo de Warhol, e a marca global de topo lançam hoje para os clientes uma colecção de malas e acessórios para mulher que voltam a tentar o cruzamento entre arte e moda. A colecção recebeu o nome "The Masters" (Os Mestres) e foi criada a partir de alguns dos traços identitários caros a Koons e à Louis Vuitton.

No caso do artista, a ideia central que o guiou é o prosseguimento da prática da apropriação, isto é, em termos simples, o uso do trabalho de outros artistas para criar novas obras de arte, ou, noutra perspectiva, recuperar estas obras de arte clássicas. Na colecção em causa, Koons foi buscar fragmentos da sua série de pinturas "Gazing Balls" e voltou a "recortar" imagens criadas por Leonardo da Vinci, Titian, Rubens, Fragonard e Van Gogh, imprimindo-as nas peças da Louis Vuitton, com uma larga faixa dourada e com o nome do "Mestre" a enquadrar os pedaços de pinturas dos mestres que elegeu.

No caso da marca global, o traço principal é a constante renovação, que tem vindo a ser feita também com outros artistas nos últimos anos, de algumas das suas peças mais icónicas, como as malas The Speedy, The Keepall e The Neverfull, através de uma nova imagem. Os alvos desta operação de alto perfil são vários, e, claro, perfeitos para uma discussão acalorada em várias tipologias de fóruns um pouco por todo o mundo.

Neste último plano, o tema central do debate é a banalização e comercialização da arte. O que os críticos - de historiadores de arte a especialistas de moda - essencialmente apontam é que Koons e a Vuitton voltam, mais uma vez, a usar imagens marcantes para vender produtos. Koons, por seu lado, está habituado a este argumento, a apropriação é um dos traços de todo o seu trabalho, e reage alegando que, ao apropriar-se das imagens e ao dar-lhes um novo lugar e um novo contexto, está a fazer arte.

A Louis Vuitton, por seu lado, não esconde o seu objectivo comercial, o preço de cada peça começa nos 4 mil euros, mas defende que está a "colaborar com o mundo da arte", dando-lhe visibilidade num espaço e num tempo contemporâneos saturado de mensagens. Este é, aliás, um argumento usado pelos apoiantes da operação, curiosamente em maioria críticos de arte, que defendem que é mais um modo de transmitir a beleza dos mestres às gerações de hoje. No entanto, uma análise mais cuidadosa de todos os argumentos invocados, de Los Angeles a Paris, passando por outras capitais, pode levar-nos a questões ainda mais fascinantes.

Na verdade, o que parece determinar os dois agentes da operação, Koons e a Louis Vuitton, é o reconhecimento de que a condição necessária de sobrevivência nos seus mundos profissionais, apesar de cada um deles ter mecanismos próprios, é a da constante reinvenção de uma exuberância pública. A Koons, aparentemente, não basta ser um artista de perfil global alto e um dos mais caros do mercado, se este estatuto não for comunicado, ou agitado, de modo intenso e permanente.

À Louis Vuitton não basta ser uma "griffe" de topo, porque um ligeiro baixar de notoriedade poderá ser implacável para o perfil e para as vendas, dada a concorrência dos seus pares. Visto de outro ângulo, a agitação é crucial, e traz dividendos.


Nota ao leitor: Os bens culturais, também classificados como bens de paixão, deixaram de ser um investimento de elite, e a designação inclui hoje uma panóplia gigantesca de temas, que vão dos mais tradicionais, como a arte ou os automóveis clássicos, a outros totalmente contemporâneos, como são os têxteis, o mobiliário de design ou a moda. Ao mesmo tempo, os bens culturais são activos acessíveis e disputados em mercados globais extremamente competitivos. Semanalmente, o Negócios irá revelar algumas das histórias fascinantes relacionadas com estes mercados, partilhando assim, de forma independente, a informação mais preciosa.


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