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Aninhada num vale no centro do Chile, perto de lagos e montanhas cobertas de neve, fica uma das cidades mais poluídas do mundo.
Todos os invernos, a sonolenta Temuco mergulha no ranking global de qualidade do ar. Embora megacidades notoriamente poluídas, como Pequim e Nova Déli, tenham populações quase 100 vezes maiores do que o total da pequena cidade chilena, a contaminação de Temuco não provém da atividade económica. Vem da pobreza.
De junho a agosto, os termómetros em Temuco caem para 4º Celsius. Os temuquenses de baixa renda da cidade de 220 mil habitantes não têm escolha a não ser queimar lenha barata - geralmente molhada - para se aquecer.
Da janela da sua sala de estar, Patricia Bravo, de 60 anos, diz que às vezes mal consegue ver a rua do seu bairro de Temuco. O resto é tudo fumaça cinza. "É como viver numa cidade com neblina permanente, exceto que é pela fumaça da chaminé", diz Bravo, que mora na cidade desde que era jovem. Ela acostumou-se ao ardor nos olhos e ao cheiro de fumaça na sala de estar, diz, mesmo quando a sua própria chaminé está apagada e as janelas fechadas.
De acordo com dados compilados pela Bloomberg Green e OpenAQ, uma organização sem fins lucrativos, Temuco teve a pior qualidade do ar do mundo em pelo menos cinco dias nas últimas oito semanas, incluindo por dois dias consecutivos, em 8 e 9 de julho. 25 das 30 cidades mais poluídas da América do Sul estão no Chile, segundo relatório anual de 2019 da consultoria suíça IQAir.
À medida que o ar piora, o mesmo ocorre com várias doenças. É um ciclo que, segundo Fernando Lana, se repetiu todos os invernos nos 40 anos em que trabalhou como cardiologista em Temuco. "Existe uma correlação quase perfeita entre os níveis de contaminação e as visitas ao médico para doenças cardíacas ou insuficiência cardíaca", afirma Lana.
A tendência é especialmente preocupante neste ano para residentes e autoridades de saúde, à medida que a Covid-19 avança nas Américas. Mais de 3,6 milhões de pessoas foram infetadas pela doença na América Latina.
O governo do Chile está preocupado com os picos periódicos de poluição no sul do Chile e tenta reduzir as contas de energia para que mais chilenos possam usar eletricidade para aquecimento em vez de madeira, disse o ministro da Energia, Juan Carlos Jobet, em entrevista à Rádio Bloomberg no mês passado. Mas isso levará tempo e provavelmente não afetará os hábitos neste inverno.
A madeira húmida é "barata para o comprador", disse Jobet, "mas muito cara para a sociedade".