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Gamificação, a nova arma para ganhar a sustentabilidade

Uma das formas de incutir hábitos sustentáveis é torná-los um desafio, com recompensas e benefícios para quem os adota. As empresas estão a entrar neste jogo. A EDP lançou o Planeta Zero e há uma aplicação alemã que quer espalhar a gamificação.

04 de Novembro de 2020 às 11:00
A capital austríaca contratou a Changers, que reembolsa os munícipes com pontos que podem ser usados em bilhetes para eventos culturais. Lisi Niesner
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E se a sustentabilidade fosse um jogo? As empresas estão a lançar o desafio, envolvendo clientes e trabalhadores. Foi o que fez a EDP, e é o que a Changers quer convencer mais empresas a fazer em Portugal. Ambas garantem que, com um toque de entretenimento, conseguem mover multidões no sentido da mudança.

Esta lógica, que agora é posta ao serviço da sustentabilidade, chama-se gamificação, e consiste em usar elementos que são típicos de um jogo - como sistemas de pontos ou dinâmicas de competição - de forma a conquistar a adesão do utilizador.

A EDP lançou recentemente o programa Planeta Zero, dentro do qual, através da app Zero ou do site da EDP Comercial, os clientes podem acumular pontos - os Zs - de cada vez que demonstram boas práticas ambientais e sociais. Enquanto a Zero nasceu em setembro no seio da elétrica, a Changers, uma aplicação semelhante de origem alemã, veio para o mercado português em outubro para "emprestar" a sua tecnologia a várias empresas e até a municípios.

Estas aplicações vêm ajudar a tornar os funcionários e cidadãos mais verdes. Edgar Kampers
Agente de vendas Changers
A Changers quer estrear-se ainda este ano em Portugal, Holanda, Bélgica e Espanha, estando já operacional na Alemanha, Suíça e Áustria. Por cá, está agora em negociações com empresas e com cinco municípios.

"É uma questão de assumir a responsabilidade. Estas aplicações vêm ajudar a tornar os funcionários e cidadãos mais verdes e mais responsáveis", defende Edgar Kampers, da Changers. Já no lançamento do Planeta Zero, a EDP esclareceu que o programa surge como resposta à crescente preocupação dos consumidores com a degradação ambiental.

O desafio

No caso da EDP, com a acumulação de Zs, os clientes vão conseguir atingir novos patamares e, quanto mais alto nesta escala, mais ofertas, descontos e experiências ganham. Entre os desafios estão a limpeza de praias ou florestas, e as compensações vão desde workshops até à possibilidade de participar no sorteio de um carro elétrico.

A Changers, já que vem servir terceiros, deixa os clientes escolherem entre vários desafios e recompensas, e pode até adaptar o aspeto da app à imagem de cada entidade. Um dos desafios mais comuns é optar por transportes amigos do ambiente, obtendo-se mais pontos quanto menos forem as emissões poluentes - algo que é verificado através da localização GPS ou perguntando diretamente ao utilizador. "A maioria não faz batota", garante Kampers. Uma alimentação mais saudável ou o envolvimento na integração de colegas também podem ser promovidos através da aplicação.

4Países
Portugal é um dos quatro países - além de Espanha, Bélgica e Holanda - nos quais a Changers pretende entrar em 2020.
220Utilizadores
Pouco antes de fazer dois meses de lançamento, o Planeta Zero da EDP já conta 220 mil utilizadores.
1,4Lixo
Através dos desafios do Planeta Zero, a EDP contou com os utilizadores para limpar 1,4 toneladas de lixo da praia.
30Mudança
Na Bélgica, as localidades que aderiram a sistemas de incentivos viram mudanças de hábitos em 30% dos lares. 
No final, os pontos podem ser usados para comprar um conjunto de produtos sustentáveis - desde cabeças de chuveiro mais económicas até jantares vegetarianos -, ou mesmo para os transformar em doações para instituições de solidariedade. Na capital austríaca, que contratou o serviço, os pontos podem ser usados em bilhetes para eventos culturais.

Mas funciona?

A gamificação "já existe há muito tempo mas está longe de se ter massificada, precisamente porque é difícil", afirma Paulo Cardoso do Amaral, professor de Inovação Digital na Universidade Católica. Um exemplo paradigmático, afirma o professor, é o jogo Pokemon Go. "Foi um jogo que ativou uma cultura existente e com técnicas de envolvimento social extremamente eficazes, e, no entanto, ao fim de algum tempo, perdeu todo o interesse". Os interesses próprios de cada pessoa serão a base da interação, e a dificuldade estará em "casar essa predisposição com os objetivos estratégicos", sendo que o sucesso vai depender do fator emocional que se conseguir desenvolver com cada consumidor. A adesão pode também variar entre culturas, já que algumas têm "comportamentos mais próximos do que consideramos ser infantil. Não é por acaso que os vales de desconto (cupões) têm muito mais sucesso nos Estados Unidos que na Europa".

Lançado há quase dois meses, o Planeta Zero já teve a adesão de mais de 220 mil pessoas, adianta a EDP ao Negócios. Desde então, as atividades disponibilizadas na app têm esgotado em menos de 48 horas, com audiências de 200 pessoas para cada um dos mais de 10 workshops sobre desperdício zero e hábitos sustentáveis. Fora do ecrã, esgotaram também as vagas de voluntariado ambiental em outubro. Paralelamente, mais de 50 mil pessoas já se inscreveram no sorteio do Planeta Zero para ganhar o carro Smart Eletric.

Entretanto, os clientes já cumpriram cerca de 5000 desafios individuais de mudança e, com a ajuda dos clientes e em parceria com a Brigada do Mar, foram limpas 1,4 toneladas de lixo na praia da Fonte da Telha, na Costa de Caparica. "Para a EDP Comercial, estes números demonstram de forma inequívoca que este programa é um passo importante na promoção de um futuro mais sustentável", escreve a empresa.

Já a Changers, que ainda não está operacional em Portugal, dá outro exemplo: na Bélgica, em 2014, a província de Limburg quis estimular a reutilização e separação de lixo e a compostagem. Entre 40 municípios, apenas sete usaram um sistema de incentivos, enquanto os restantes fizeram campanhas de sensibilização, com o mesmo orçamento. No grupo de sete, a mudança comportamental verificou-se em 30% dos lares, enquanto nos restantes a taxa de sucesso ficou-se pelos 2%.
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