Opinião
Uma Bolsa à Benfica
Nos últimos meses, a Bolsa está para campeões: é só ganhar. Mas os ganhos sucessivos são tão inebriantes como as goleadas do Benfica. Como se ganhar por seis jogo após jogo fosse perpétuo.
Nos últimos meses, a Bolsa está para campeões: é só ganhar. Mas os ganhos sucessivos são tão inebriantes como as goleadas do Benfica. Como se ganhar por seis jogo após jogo fosse perpétuo.
As cabazadas na Luz enchem o papo aos benfiquistas, mas parecem-lhes boas de mais para serem verdade. Na Bolsa, a sensação é a mesma, mas o período refractário, quando chegar, não se mede em emoções, conta-se em euros.
A Bolsa é um excelente local de investimento. E quem avisa por militância pessimista que a Bolsa há-de cair sabe duas coisas: que é uma questão de tempo até ter razão; e que vai perder durante esse tempo todo o dinheiro da valorização das acções. Foi por isso que aqui se escreveram este ano dois editoriais evidenciando as possibilidades de valorização que estavam pela frente.
Quase 50% depois, os "eu-bem-avisei" não servem para nada. Mas dão legitimidade a que se recomende um compasso de espera para olhar para a carteira de acções, actual e potencial.
Desde Março, a Bolsa portuguesa valorizou-se 47,5%, o DJ Stoxx600 sobe 53,4%%, o S&P500 vai em 57,40%. São valorizações fortes e raras. Como marcar 17 golos em três jogos.
Esta subida teve razões sólidas. Houve um "bilhete grátis" para quem entrou no mercado há sete meses, que decorre do simples facto de as economias globais não terem passado da recessão para a depressão, repetindo a queda livre de 1929, como se temia. Não foi assim há tanto tempo que o mundo se encontrava numa península de três recessões simultâneas (EUA, Europa e Japão) em que a única ligação à terra da economia era a China. E foi ainda há menos tempo que o perímetro do "subprime" na banca estava por delimitar, como quem tem um saco só com bolas pretas mas não se sabe quantas.
O "bilhete grátis" das subidas espectaculares estava nessa sobre-reacção do mercado após a falência do Lehman. Dos 4.000 pontos que o Dow Jones caiu depois desse dia fatídico, já foram recuperados quase 3.500 pontos. Mas ainda estamos a metade do último pico bolsista: daqui para a frente, a subida tem de ser suportada pelos resultados das empresas, que por sua vez dependem da recuperação das economias. A americana já arribou, a europeia longe disso.
Esta subida em Bolsa está a ser um tónico para os fundos de pensões e para as empresas: as carteiras valorizam agora depois da descida anterior como um ioiô. E há bancos, incluindo os desditos bancos de investimento, que se preparam para lucros-recorde. Lembra-se da polémica do "fair value", que empolou os prejuízos? Baah, viva o "fair value" outra vez.
Voltemos à lição básica do PER, o rácio que compara cotação com lucros por acção (e que quanto menor é, melhor é). O problema está no "E", no "earnings", o lucro. Estamos numa fase em que os PER antigos são exageradamente maus e em que os estimados para o futuro podem estar a ser exageradamente bons. Por exemplo, o PER do Dow Jones dos últimos 12 meses é de 50,51 (o que por simplificação significa que um investidor teria de esperar 50 anos para reaver em dividendos o seu investimento). Mas o PER estimado é de... 15,4.
A Bolsa já não está para campeões e nunca foi para anjinhos. Mas quem a diaboliza por preconceito está a perder dinheiro e oportunidades de diversificação. Para fanatismos, basta o Benfica. Como disse esta semana um afamado filósofo, "um vintém é um vintém, um cretino é um cretino". Nem mais. E nem menos.
PS: Não invisto em Bolsa por razões éticas de ser jornalista. Sou benfiquista sei lá porquê.
psg@negocios.pt
As cabazadas na Luz enchem o papo aos benfiquistas, mas parecem-lhes boas de mais para serem verdade. Na Bolsa, a sensação é a mesma, mas o período refractário, quando chegar, não se mede em emoções, conta-se em euros.
Quase 50% depois, os "eu-bem-avisei" não servem para nada. Mas dão legitimidade a que se recomende um compasso de espera para olhar para a carteira de acções, actual e potencial.
Desde Março, a Bolsa portuguesa valorizou-se 47,5%, o DJ Stoxx600 sobe 53,4%%, o S&P500 vai em 57,40%. São valorizações fortes e raras. Como marcar 17 golos em três jogos.
Esta subida teve razões sólidas. Houve um "bilhete grátis" para quem entrou no mercado há sete meses, que decorre do simples facto de as economias globais não terem passado da recessão para a depressão, repetindo a queda livre de 1929, como se temia. Não foi assim há tanto tempo que o mundo se encontrava numa península de três recessões simultâneas (EUA, Europa e Japão) em que a única ligação à terra da economia era a China. E foi ainda há menos tempo que o perímetro do "subprime" na banca estava por delimitar, como quem tem um saco só com bolas pretas mas não se sabe quantas.
O "bilhete grátis" das subidas espectaculares estava nessa sobre-reacção do mercado após a falência do Lehman. Dos 4.000 pontos que o Dow Jones caiu depois desse dia fatídico, já foram recuperados quase 3.500 pontos. Mas ainda estamos a metade do último pico bolsista: daqui para a frente, a subida tem de ser suportada pelos resultados das empresas, que por sua vez dependem da recuperação das economias. A americana já arribou, a europeia longe disso.
Esta subida em Bolsa está a ser um tónico para os fundos de pensões e para as empresas: as carteiras valorizam agora depois da descida anterior como um ioiô. E há bancos, incluindo os desditos bancos de investimento, que se preparam para lucros-recorde. Lembra-se da polémica do "fair value", que empolou os prejuízos? Baah, viva o "fair value" outra vez.
Voltemos à lição básica do PER, o rácio que compara cotação com lucros por acção (e que quanto menor é, melhor é). O problema está no "E", no "earnings", o lucro. Estamos numa fase em que os PER antigos são exageradamente maus e em que os estimados para o futuro podem estar a ser exageradamente bons. Por exemplo, o PER do Dow Jones dos últimos 12 meses é de 50,51 (o que por simplificação significa que um investidor teria de esperar 50 anos para reaver em dividendos o seu investimento). Mas o PER estimado é de... 15,4.
A Bolsa já não está para campeões e nunca foi para anjinhos. Mas quem a diaboliza por preconceito está a perder dinheiro e oportunidades de diversificação. Para fanatismos, basta o Benfica. Como disse esta semana um afamado filósofo, "um vintém é um vintém, um cretino é um cretino". Nem mais. E nem menos.
PS: Não invisto em Bolsa por razões éticas de ser jornalista. Sou benfiquista sei lá porquê.
psg@negocios.pt
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