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28 de Maio de 2021 às 12:13

A direita

Aqui há uns anos, a esquerda portuguesa reformulou-se e o Bloco foi o grande obreiro desse movimento.

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Back to basics
A consistência é o derradeiro refúgio daqueles que não têm imaginação.
Oscar Wilde

A direita
Aqui há uns anos, a esquerda portuguesa reformulou-se e o Bloco foi o grande obreiro desse movimento. Inicialmente à esquerda do PCP, acabou por se alojar entre PS e PC e foi habilidosamente alargando esse espaço. Pegou em novas bandeiras de acordo com os tempos, trouxe um léxico diferente para a política e novos protagonistas. Foi o Bloco, mais que o PS, que dinamizou o motor da geringonça, e perceber isso foi a arte de António Costa. E foi o Bloco quem mais se aproveitou, explorando a necessidade de António Costa, e, sobretudo, alimentando o "flirt" que tem mantido com a ala esquerda do PS, visível no namoro descarado a Pedro Nuno dos Santos. Enquanto o Bloco conseguiu ser um íman à esquerda, à direita campeia a desagregação. O PSD perdeu identidade e posicionamento, como oposição tem sido um falhanço sob a batuta de Rio, da mesma maneira que o CDS, que em dado momento cresceu, entrou numa fase minguante de onde não parece ser capaz de sair. As novas forças surgidas desse lado do espectro político levantam em doses iguais curiosidade e repulsa nos eleitorados que não são de esquerda. O centro direita desapareceu, vencido pela direita e pelo populismo, e as sondagens mostram que assim o futuro sorri a Costa. Como se viu no encontro do MEL - Movimento Europa e Liberdade, há demasiados galos para esta capoeira. E não há nenhum discurso mobilizador, a não ser aquele que menos interessa, baseado na demagogia e no ódio. À direita falta um líder, um político agregador, visionário, apostado no progresso e não no regresso. Teme-se o pior.

Semanada

n A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) não aprovou a construção de uma ponte pedonal de madeira para o acesso à praia de Cabanas, hoje em dia apenas assegurado por barcos com motores poluentes n começaram as obras de construção de um hotel com 128 quartos e sete pisos acima do solo no antigo Convento das Mónicas, local inscrito na Carta Municipal do Património, numa zona especial de protecção, projecto aprovado quando Manuel Salgado era vereador do urbanismo da Câmara Municipal de Lisboa, em despacho da sua autoria, sem discussão em reunião de autarquia n o programa de compras de dívida e outros activos engordaram o balanço do Banco de Portugal, que vale agora 192 mil milhões de euros, quase tanto como o PIB anual do país n em 2020, ano em que Mário Centeno iniciou o seu mandato de governador do Banco de Portugal, as compras líquidas de obrigações do Tesouro português mais do que quadruplicaram n o presidente do Tribunal de Contas foi chamado ao Parlamento na sequência de indícios de que a Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna, sob a tutela de Eduardo Cabrita, prestou alegações falsas ao TC sobre pagamentos a empresas prestadoras de serviços à rede de comunicações de emergência, o Siresp, cujo contrato tem 47 anexos, dez deles secretos n a EMEL encomendou em 2019 um estudo sobre o estacionamento em Lisboa que ainda não tem data para ser divulgado n o Estado passou a deter 97,8% da TAP e o Tribunal de Justiça da União Europeia considerou ilegal a ajuda de 1.200 milhões de euros do Estado à companhia aérea no ano passado n  a PSP sugeriu alterações ao conteúdo e diálogos de uma série de televisão e, face à recusa dos autores em fazer essas alterações, bloqueou o aluguer de fardas para as filmagens, cuja entrega chegou a estar agendada.

Dixit
Definir-se como antiqualquer coisa é sempre uma redução do espírito e uma armadilha de pensamento.
António Barreto

Outros tempos
"O Homem do Casaco Vermelho" é o novo romance de Julian Barnes, agora editado em Portugal. Tudo começa no Verão de 1885, quando três cavalheiros franceses chegam a Londres: um era príncipe, outro era conde e o terceiro era um plebeu com apelido italiano. Este último, Samuel Pozzi, médico da melhor sociedade, pioneiro da ginecologia moderna e livre-pensador, com uma vida privada conturbada, era acompanhado pelo conde Robert de Montesquiou e pelo Príncipe de Polignac. O título do livro vem do retrato de Pozzi, pintado em 1881 por John Singer Sargent e que está na capa da obra. Nenhum era muito conhecido fora do círculo social parisiense, mas cada um deles alcançaria um certo grau de notoriedade e contentamento nos anos seguintes. "O Homem do Casaco Vermelho" é um esclarecedor e bem documentado retrato da Belle Époque e de um homem à frente do seu tempo. Pozzi era, nas palavras da Princesa do Mónaco, "irritantemente bonito" e aproveitava-se bem disso. Ao longo da narrativa, surgem personagens como Sarah Bernhardt, com quem Pozzi teve um caso. Esta nova obra de Julian Barnes defende que foi a frutuosa e duradoura troca de ideias através do Canal da Mancha que criou a grandeza da Europa. Como escreveu o The Guardian, "Barnes liberta-nos da superficialidade do presente e lembra-nos que sabemos sempre menos do que pensamos que sabemos". Segundo o próprio autor, ao escrever este livro, ele mergulhou na sociedade parisiense da Belle Époque, "distante, decadente, desordenada, violenta, narcisista e neurótica", em parte como sinal da desilusão que para ele foi o que classifica como a saída masoquista da Grã-Bretanha da União Europeia.

Cozinhado paciente
O arroz negro não é fácil de cozinhar e, sobretudo, requer muita paciência. Convém lavá-lo primeiro em água corrente, e depois deixar escorrer. Eu ponho um pouco de azeite no fundo do tacho, com gengibre em lâminas finas, que salteio ligeiramente antes de adicionar o arroz. Não faz parte da receita original, mas é este o ponto em que deito um pouco de vinho branco de boa qualidade e depois mexo, a deixar evaporar. Entretanto junto duas folhas de louro, sal a gosto, e adiciono água, cerca do dobro da quantidade de arroz. Dou uma mexidela e tapo. O arroz negro precisa de cozer muito tempo, para o meu gosto não menos de uma hora. Tem de ser vigiado, é necessário ver se é preciso adicionar água, usar lume muito brando. Originário da China, este arroz é conhecido naquele país como o arroz proibido, pois o seu uso estava reservado aos imperadores. Não o deixem cru - coisa que acontece se não tiver mesmo uma cozedura demorada. Os aromas e o sabor delicado só se libertam quando está bem cozido. Uma vez chegado ao ponto ideal, coloco os troços de tentáculos de polvo, entretanto bem cozidos, envolvo-os bem no arroz, tempero com pimenta-preta a gosto, moída na altura, desligo o fogão e tapo, deixando a repousar uns cinco minutos. No final, quando vai para a mesa, polvilho com cebolinho. Se as duas cozeduras estiverem ok - a do arroz e a do polvo -, sentirão uma explosão de sabores e poderão surpreender os convidados. Como dizem cá em casa, é coisa muito instagramável.

Arco da velha
Um homem que arrastou a mulher pelo pescoço na rua foi absolvido porque uma juíza do tribunal de Paredes considerou não haver crueldade suficiente para o acto ser considerado violência doméstica.

Arte interrogativa
Cristina Ataíde mostra até 26 de Junho, na Galeria Diferença, obras feitas em diversas épocas. A série de esculturas agora expostas data de 1994, mas os desenhos - quer os que estão colocados na parede, quer os que integram o livro de artista, que acaba por ser uma peça marcante da exposição - são de 2021. E existe um desenho em papel chinês, suspenso, intitulado "Yes I Am! , feito entre 2015 e 2021. Boa parte das esculturas integravam a exposição "Oposições", que Cristina Ataíde fez em 1994 na Galeria Graça Fonseca. Três décadas depois, as esculturas aparecem de forma diferente em "Who Am I? Who Are You?", com curadoria de João Silvério, um título que, segundo a artista, relaciona a duplicidade e a diferença com a proximidade e a cumplicidade. O livro de artista é baseado num questionário, que os visitantes da Galeria são convidados a preencher, e cada página de questionário é acompanhada por um desenho inspirado nas imagens dos testes de Rorschach. Esta é uma exposição de peças marcantes, que, entre si, mostram os eixos maiores do trabalho da artista e a sua permanente evolução ao longo do tempo.

Outro destaque: inserida no conjunto de eventos ligados à comemoração do centenário do nascimento de Ernesto de Sousa, um dos mais importantes artistas portugueses do século XX, criador de uma obra multidisciplinar e responsável pela divulgação da obra de muitos outros artistas, o Museu Nacional de Arte Contemporânea apresenta "Meu Amigo - Obras e Documentos da Colecção Ernesto de Sousa", que estará patente até 26 de Setembro, proporcionando o cruzamento entre documentação e obras de arte que foram oferecidas a Ernesto de Sousa, ao longo da vida, por alguns dos mais relevantes artistas nacionais e internacionais, entre as décadas de 1940 e 1980 do século XX. São cerca de 124 obras, de 62 artistas: pintura, desenho, gravura, escultura, fotografia, objetos e documentação diversa, do neo-realismo à década de 80, de Almada Negreiros a Wolf Vostell, passando por Joseph Beuys.

Ouvir
Chrissie Hynde, a carismática voz e líder dos Pretenders, é uma fã de Dylan. Em 1984, esteve ao seu lado em Wembley, a cantar "It’s All Over Now, Baby Blue", e em 1991 fez uma versão de "I Shall Be Released" que o próprio Dylan elogiou. Pois bem, durante o confinamento, Hynde decidiu pegar em canções menos conhecidas de Dylan, juntou nove delas, e gravou um álbum com uma produção simples e crua, com a ajuda do guitarrista James Walbourne, e a que deu o título de "Standing In The Doorway". A quase totalidade das canções escolhidas de Dylan vem da primeira metade dos anos 1980, como a muito politicamente incorrecta "Sweetheart Like You", que hoje facilmente levará o rótulo de manifesto sexista. Da mesma época há uma canção de namoro, "Don’t Fall Apart On Me Tonight", completamente transformada do original que Dylan gravou, inspirado no reggae. Outros pontos altos são a interpretação de Hynde para "You’re A Big Girl Now", onde a voz e a guitarra acústica trazem, sozinhas, outra dimensão à versão original. "Standing In The Doorway", a faixa-título, saída do álbum de 1997 "Time Out Of Mind", tem também uma nova dimensão, entre o piano, a guitarra e a voz. E é a voz de Hynde, fora do registo original de Dylan, que torna este disco tão interessante - e que faz sobressair talvez a melhor de todas as versões aqui incluídas, "Blind Willie McTell", do álbum "Infidels", onde o piano, a harmónica, a guitarra acústica e o bandolim de Walbourne se encaixam na intensidade colocada por Chrissie Hynde na forma de cantar.

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