Opinião
Clinton: a escandalosa
Deslegitimização das instituições e descredibilização da presidência são duas consequências funestas da campanha eleitoral nos Estados Unidos que se saldará pela investidura mais impopular de sempre.
Clinton poderá obter uma maioria no Colégio Eleitoral, mas dificilmente alcançará uma vitória esmagadora na votação nacional, estando em risco de se confrontar com a hostilidade de um Congresso dominado por republicanos.
As polémicas sobre a utilização por Hillary de um servidor privado para correspondência electrónica enquanto secretária de Estado atingiram o paroxismo com as acusações ao director do FBI de ingerência inaceitável e ilegal na campanha.
James Comey é condenado por parcialidade ao prosseguir investigações a Clinton abarcando e-mails detectados em dispositivos informáticos de Huma Abedin, sua assessora de confiança, e do ex-marido, o antigo representante democrata de Nova Iorque Anthony Weiner, caído em desgraça por envio de imagens sexuais explícitas e abusivas a mulheres e a uma menor.
Atacado por Trump por alegadamente encobrir "comportamento criminoso" de Hillary, pressionado pelo Departamento de Justiça para evitar declarações sobre o assunto durante a campanha, Comey acabou mal com democratas e republicanos que o vinham criticando por complacência ante os Clinton.
Nomeado por Obama em 2013, com um mandato de 10 anos, Comey, caso venha a ter de conviver com Clinton, poderá contar com um ambiente de cortar à faca reminescente dos anos em que Edgar Hoover enfrentou os irmãos Kennedy.
Hillary é, contudo e notoriamente, política de porte duvidoso.
A demonstrá-lo contam-se a incapacidade para sequer entender a gravidade ou tentar esclarecer múltiplos conflitos de interesses provocados pela angariação de fundos da Fundação Clinton, em especial nos anos em que chefiou o Departamento de Estado (2009-2013), e as denúncias de favorecimento e manipulação por parte da liderança do Partido Democrático na compita pela nomeação presidencial contra Bernie Sanders.
A péssima imagem pública de Hillary em matéria de "confiança" e "honestidade" pede meças a Trump e faz mossa em segmentos do eleitorado feminino jovem e de maior escolaridade renitente a votar na antiga primeira-dama, apesar do comportamento inaceitável do candidato republicano.
A consternação no partido é, portanto, tanto maior quanto a reentrada em força na campanha dos e-mails da secretária de Estado, que acentuou a quebra nas intenções de voto por Clinton, desmotivando, eventualmente, eleitores indecisos na opção pela candidata ou por candidatos democratas ao Congresso.
Os líderes republicanos que tentaram distanciar-se de Trump podem dar agora por segura a maioria na Câmara de Representantes (247 vs. 188, presentemente), mas no Senado a vantagem de quatro mandatos continua em risco dependendo de votações em Indiana, Missouri, Carolina do Norte, Nevada, Pensilvânia e New Hampshire.
Se os democratas não conquistarem maioria no Senado, a presidência de Hillary será à partida um fracasso.
De Donald Trump, caso falhe a vitória por margem escassa, é de esperar contestação ao processo eleitoral, incluindo votação e escrutínio, num clamor potencialmente mais danoso do que as polémicas provocadas pela viciação dos resultados no Illinois pelo presidente da Câmara de Chicago, Richard Daley, a favor de John Kennedy contra Richard Nixon, em 1960.
Hillary é uma mulher assolada por escândalos, condenada justa e injustamente por actos, omissões e mentiras, criticada por gente decente que não se perde em delírios políticos ou nos desvarios de Donald Trump, e se chegar à Casa Branca terá tudo menos credibilidade e voto de confiança que é o pior que pode acontecer a um Presidente.
Haja o que houver, estas eleições têm ainda, de resto e desde já, um imenso derrotado e dá pelo nome de Barack Obama.
Jornalista