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Como apoiar as empresas, as famílias e as pessoas

Se vierem a ser destruídos 200 mil empregos, um valor, ao que tudo indica, optimista. Se cada emprego exigir um investimento, em média, de 10 mil euros, se o desemprego durar 6 meses e obrigar a um subsídio de desemprego, em média, de 700 euros, teremos a módica quantia de 8 400 milhões de euros.

26 de Março de 2020 às 20:05
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Parafraseando uma antiga anedota, posto perante o dilema "o dinheiro ou a vida", se responde "o dinheiro faz-me tanta falta!", dir-se-ia que o governo tem vindo a hesitar entre a vida (da economia) e o superavit. É que o superavit dava-lhe tanto jeito! Mesmo as medidas anunciadas a 19 de Março, para além de serem quantitativamente poucas e do erro de escolher sectores por serem os mais imediatamente atingidos por esta crise (alguns deles também foram os mais beneficiados pelo boom anterior pelo que talvez se devessem ter prevenido melhor), são sobretudo garantias. Dinheiro próprio, ou melhor, dinheiro nosso que o Governo gere, é pouco. Talvez um critério pudesse ser este: quanto custará criar os postos de trabalho que, eventualmente, virão a ser destruídos (suponhamos que serão 200 mil - um valor, ao que tudo indica, optimista). Se cada emprego exigir um investimento, em média, de 10 mil euros (um valor baixo que admite que muita da capacidade já está instalada e só precisará de ser reativada), se o desemprego durar 6 meses e obrigar a um subsídio de desemprego, em média, de 700 euros, teremos a módica quantia de 8 400 milhões de euros. Se o Governo, gastando metade, conseguir evitar metade, ficamos a ganhar, pois a economia real não se retrairá tanto e o impacto social será menor. Deste ponto de vista, temos de evitar que a dicotomia público-privado se repita. No sector público, saber se há salário no fim do mês, não faz parte da angústia gerada pelo covid19. No privado, exponencia a angústia. Por isso, para além dos apoios diretos às empresas, o Estado tem de pôr, rapidamente, em marcha um plano de apoio às pessoas e famílias que passa, também, por garantir que a rede de instituições de solidariedade não desaba. Nem os ditos neoliberais acham, aqui e agora, que as empresas (o mercado) sozinhas dão conta do recado. O Governo está à espera de quê?

Dois pesos e duas medidas

Avizinha-se o fim do mês. Para muitos, para além da chatice da quarentena e do, maior ou menor, pânico quanto aos efeitos do covid19, a angústia não passa por saber se têm salário ao fim do mês. São funcionários públicos, uma designação que ganha um sentido especial em todos os que estão diretamente (indiretamente, temos de estar todos) envolvidos na luta pela salvaguarda da saúde pública.

Em muitos mais lares de trabalhadores do setor privado, a angústia domina. E muitos, como os trabalhadores dos supermercados, mercearias e de todas as empresas que trabalham para garantir o abastecimento público, merecem ser incluídos naqueles que, às 22 horas, aplaudimos. Também eles prestam um serviço público. E, no entanto, mesmo entre eles haverá os que, na melhor das hipóteses, verão o seu salário reduzido pela via do lay-off, enquanto outros terão no desemprego o seu destino imediato e no respectivo subsídio a sua fonte de rendimento.

Dois pesos e duas medidas. Outra vez? Bem sei que, neste caso, não foi a disfunção do setor estatal a causar a crise mas não deixa de ser algo paradoxal que o governo pouco, ou nada, tenha anunciado tendo as pessoas e as famílias como destinatários. Admitir que, mais linha de crédito menos linha de crédito, as empresas (o mercado) resolverão o problema é mais neoliberal do que os próprios ditos neoliberais admitem. Por mais responsabilidade social que as empresas demonstrem, muitas delas não terão condições, nem perspectivas, para garantir o emprego. Para além de simplificar, e agilizar, a atribuição do subsídio de desemprego, impõe-se que, num prazo muito curto, o governo desenhe um esquema de rendimento garantido transitório que pode ir de isentar, sem perda de direitos, o trabalhador em lay-off de fazer a sua contribuição para a segurança social, um cheque a ser atribuído a cada trabalhador por conta de outrem que veja o seu rendimento reduzido.

Não faz sentido discriminar empresas

Ao contrário do Governo, não creio que faça sentido discriminar as empresas, em geral, e as PME, em particular, pelo seu sector de actividade e, se o fizesse, tenho a maior das dúvidas que as indústrias da hotelaria e restauração fossem prioritárias (estão entre as mais afectadas mas também foram das que mais beneficiaram com o boom turístico, esperando-se que tenham uma situação mais sólida do que, por exemplo, o comércio em geral). Aceito que as PME tenham um apoio prioritário: em média, são as que têm maior vulnerabilidade a esta crise. Mas, ao arrepio do que parece consensual, defendo que as empresas industriais que possam deveriam manter-se em actividade. Por nós e pelos outros. Já pensaram o que sucederia se todos os países passassem a produzir só para eles próprios? Nós nem duraríamos 15 dias antes que fosse preciso o racionamento. Como não sou doido, sei que para isso são precisas medidas muito concretas, dando protecção a esses trabalhadores (incluindo empresários e gestores). Devem ter condições de deslocação seguras. Se tiverem carro, devem-no utilizar, sendo-lhes fornecidas senhas para abastecimento. Se não, será preciso organizar transportes gratuitos que permitam manter as distâncias de segurança que, também, protejam os motoristas. A todos devem ser disponibilizados testes regulares do covid19 para garantir a sua segurança e a dos seus colegas. Como é óbvio, este tipo de medidas e apoios devem ser generalizadas a quem está a trabalhar por nós e para nós. Para eles, toda a prioridade. É esse um dos princípios da economia de guerra que, num primeiro momento, talvez escapem a governantes de perfil citadino.

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