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A próxima revolução da produtividade

"Estão novamente a piscar luzes de emergência no painel de instrumentos da economia global", declarou o primeiro-ministro britânico, David Cameron, após a cimeira do G-20 em Novembro. E tem razão. Mas a verdadeira preocupação não está no risco associado a desafios de curto prazo, como o regresso do Japão à recessão em 2014 ou a persistente estagnação da Zona Euro, mas sim nos ventos tempestuosos com que o mundo inteiro se deparará nos próximos 50 anos.

31 de Dezembro de 2014 às 10:00
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Apesar dos desgastantes altos e baixos, os últimos 50 anos renderam um dividendo global de crescimento sem precedentes. Em termos de PIB (uma mensuração reconhecidamente com falhas), a economia mundial sextuplicou. O rendimento per capita praticamente triplicou.

 

No mundo em desenvolvimento, a criação sustentada de riqueza e os progressos em matéria de saúde pública aumentaram a esperança média de vida em 20 anos desde meados da década de 1970, e a iliteracia entre os adultos praticamente foi reduzida em metade nos últimos 30 anos. A desigualdade entre países diminuiu, com mais de mil milhões de pessoas a saírem da pobreza extrema só nas últimas duas décadas.

 

No entanto, se as coisas continuarem como estão, as probabilidades de se alcançarem progressos igualmente impressionantes nos próximos 50 anos não são muito promissoras. Desde 1964, duas forças-chave alimentaram o crescimento excepcionalmente rápido do PIB: a expansão da oferta de mão-de-obra, motivada pelos rápidos aumentos populacionais, e os ganhos regulares em matéria de produtividade. De acordo com um relatório do McKinsey Global Institute (MGI), a taxa de crescimento média anual de 3,5% do PIB em 19 países membros do G-20 (não incluindo a União Europeia) e na Nigéria conta com cerca de 1,8 pontos percentuais provenientes do trabalho e 1,7 pontos percentuais da produtividade.

 

Contudo, à medida que a fertilidade diminui e as populações envelhecem, o contributo do motor laboral para o crescimento cairá fortemente, para pouco mais de 0,3 pontos percentuais de crescimento anual. Mesmo que a produtividade continue a aumentar ao mesmo ritmo, o crescimento mundial do PIB poderá desacelerar para apenas 2% ao ano, em média – o que corresponderá a uma queda de 40% face aos últimos 50 anos.

 

A boa notícia é que esta trajectória pode melhorar. Mas, para tal, é preciso que a focalização transite da redução da desigualdade para a conquista de um crescimento que beneficie simultaneamente os pobres e a classe média.

 

O historiador Ben Friedman sublinhou que a "questão fulcral" na história dos Estados Unidos não é "a pobreza dos mais desfavorecidos" ou "o sucesso dos mais privilegiados; é, sim, "o bem-estar económico da vasta maioria" da população. O mesmo acontece a nível global, com milhares de milhões de potenciais consumidores a erguerem-se e a juntarem-se às fileiras da classe média.

 

No que diz respeito ao mercado laboral, a alavanca mais poderosa para impulsionar o bem-estar da maioria seria aumentar o emprego junto das mulheres, cuja taxa de participação na força de trabalho continua a ficar ainda muito atrás da dos homens – cerca de 40% a nível global. Incluir mais mulheres no mercado de trabalho pressupõe melhores cuidados infantis e outros apoios sociais em muitos países, bem como maiores progressos em matéria de igualdade de salários, nomeadamente uma tributação mais igualitária para a segunda pessoa que contribui com rendimentos para o agregado familiar.

 

Além disso, o MGI estima que a eliminação de barreiras, como a idade obrigatória de reforma e os perversos incentivos fiscais, poderá acrescentar cerca de 200 milhões de trabalhadores com mais de 65 anos à mão-de-obra mundial. Os esforços no sentido de reduzir o desemprego jovem também ajudarão.

 

Estas mudanças, apesar de importantes, teriam um impacto limitado, elevando o contributo do trabalho - para o crescimento futuro - de um quinto para apenas um terço dos níveis do pós-guerra. Aquilo que realmente faz falta ao mundo é acelerar a produtividade – não a um ritmo modesto, mas ao equivalente económico de uma velocidade alucinante.

 

Felizmente, os laboratórios de hoje em dia do sector privado estão repletos de inovações capazes de desencadear grandes melhorias operacionais e tecnológicas, gerando assim um aumento da produtividade. Materiais avançados, como os nanolaminados (lípidos comestíveis), podem – quando utilizados nos alimentos – providenciar protecção contra o ar ou humidade, atrasando a sua deterioração. Os compostos de fibra de carbono estão a fabricar carros e aviões mais resistentes e mais leves, reduzindo assim os seus consumos de combustível. E a "Internet das coisas" irá racionalizar os processos de produção ao detectar antecipadamente potenciais falhas, melhorar o rendimento das colheitas agrícolas ao avaliar a humidade dos campos e reduzir drasticamente o custo de monitorar remotamente a saúde dos doentes.

 

Um pouco mais à frente, nesta fronteira da produtividade, estão os automóveis e camiões de condução automática comercialmente viáveis. Da mesma forma, a biologia sintética será possível dentro de pouco tempo, com os cientistas a recorrerem a cada vez mais dados genéticos – crescentemente disponíveis e não dispendiosos – para conceberem o ADN a partir do zero – uma prática que tem aplicações na medicina e na agricultura e até mesmo na produção de biocombustíveis.

 

No entanto, o sector privado não consegue concretizar este potencial isoladamente. A maioria dos países precisa cada vez mais de um maior investimento do sector público no sentido de apoiar a investigação e desenvolvimento de longo prazo, bem como de regulação mais inteligente e mais amiga da inovação de modo a facilitar futuros ganhos. Uma vez que as maiores oportunidades dependem do impulsionar de um maior ajustamento do ritmo de produtividade, adoptando e difundindo as melhores práticas actuais, os políticos devem continuar a envidar esforços para reduzirem as barreiras regulatórias e comerciais que se colocam à integração de mercado e à concorrência.

 

Talvez mais importante ainda: os mercados laborais têm de se tornar o mais flexíveis possível, devendo os trabalhadores ter uma boa base de formação e beneficiar de sólidas redes de segurança social. Isso permitir-lhes-á superar a transição para os empregos do futuro e permitirá que a economia beneficie de novas vagas de riqueza e de destruição criativa geradora de valor. Importa lembrar que mais de um terço do crescimento do emprego nos EUA, desde 1990, provém de empregos que não existiam – ou que mal existiam – há 25 anos.

 

Alguns países poderão até mesmo querer nomear um "czar do crescimento" que faça a ligação entre todos os pontos destas políticas. No entanto, os actuais números do crescimento não são a grande questão. O que realmente importa é assegurar a melhoria do bem-estar do maior número possível de cidadãos – e isso exige acções concertadas por parte dos dirigentes empresariais, governos e sociedade civil.

 

Dominic Barton é director do departamento de gestão global da McKinsey & Company

 

Direitos de autor: Project Syndicate, 2014.
www.project-syndicate.org

Tradução: Carla Pedro

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