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Produto agrícola tem de se diferenciar para não ser commodity

A crise sanitária foi uma oportunidade para as plataformas digitais, que aproveitaram para integrar os pequenos produtores nas cadeias de distribuição. No Vale do Minho, o Alvarinho conquista mercados internacionais e no Alqueva a água continuou a correr.

06 de Outubro de 2020 às 11:00
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Engenheiro, agricultor e produtor de arroz, Filipe Núncio defende que o produto agrícola se deve diferenciar para não se tornar numa commodity. "Temos de diferenciar e segmentar o produto agrícola por variedades e qualidade. Esta tem a ver com a qualidade alimentar, mas também com a segurança alimentar que vem dos modos de produção aplicados no campo. A tendência do consumidor atual é saber mais sobre a origem, o tipo e o modo de produção utilizado na criação do produto. No caso da indústria tem de se garantir que esta tem toda a informação para depois transformar, embalar e informar o consumidor e assim captar mais valor na cadeia".

 

Neste processo são fundamentais as plataformas digitais, os marketplaces, como o Agri Marketplace de que Filipe Núncio foi um dos quatro fundadores em 2016. É uma plataforma para aproximar a indústria compradora de produtos agrícolas da produção agrícola e dos agricultores. "Faz a redução da intermediação na cadeia de abastecimento e foi potenciada por esta crise sanitária. Beneficiou com a dificuldade dos brokers e dos traders, operadores e vendedores se deslocarem para adquirir ou vender os seus produtos em várias partes do mundo", assinalou.

 

Como salientou Pedro Barreto, administrador do BPI, a agricultura não parou durante o confinamento da pandemia de covid-19 e os dados do banco apontam para que "tenha sido o setor que apresentou maior resiliência nesta crise pandémica". A que se junta o desenvolvimento da agricultura na última década, e que a par do turismo têm sido prioridades estratégicas do BPI.

 

A crise sanitária provocou uma maior procura de mercados de proximidade em detrimento de mercados externos. Para o marketplace foi uma oportunidade para ir ao encontro dos pequenos produtores de frescos, vegetais, frutos, e ligá-los diretamente ao consumidor final das regiões.

 

Segundo Filipe Núncio, "sempre que há uma cadeia de abastecimento de proximidade torna-se preferencial, porque dá mais segurança e sustentabilidade na cadeia e a pegada de carbono é mais reduzida".

 

Alvarinho de 2021 vendido

 

Pelas terras do vale do Minho, com destaque para Melgaço, o impacto da crise sanitária provocada pela covid-19 foi mista. "A perceção de que o campo é menos perigoso e com menor risco deu atratividade a muitos territórios e atraiu o turismo. Nós não estávamos à espera que houvesse uma pandemia para nos tornarmos atrativos, até porque isso implica que houve um trabalho anterior ao nível do turismo, que tem sido alavancador das nossas economias", disse Manoel Batista, presidente da ADRIMinho e presidente da Câmara Municipal de Melgaço.

 

Mas nos primeiros meses, o período de confinamento entre março e abril, "a agricultura sofreu um estremecimento, sobretudo a produção de vinho alvarinho, fundamental para a região", reconhece Manoel Batista. Mas rapidamente se recompôs e conseguiram inverter a tendência. Recuperaram vendas no mercado nacional e no internacional. "Segundo alguns produtores, a procura cresceu fortemente e alguns produtores até já têm reservada a colheita de 2021."

 

Para este autarca os desafios para os pequenos territórios que se caracterizam pelo minifúndio são ter a capacidade para fazer a transferência conhecimento para o território e para os pequenos produtores e fazer das associações de desenvolvimento local o "melhor instrumento para que os financiamentos comunitários e públicos cheguem os pequenos produtores", refere Manoel Batista.

 

Água sempre a correr

 

Durante este período de pandemia, tanto no período de confinamento como depois, o ritmo de investimentos no regadio de Alqueva não parou de subir. "De 2019 para 2020 aumentaram 7 mil hectares de inscrições, o que significa investimentos agrícolas de dezenas de milhões de euros. Se contarmos com os custos de transação da terra estamos a falar de uma ou duas centenas de milhões de euros de investimento", salientou José Pedro Salema, presidente da EDIA (Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva).

 

Referiu ainda que a água não faltou e a procura também não diminuiu. "As nossas equipas operacionais tiveram de vencer o medo e o pânico que a covid-19 provocou nos serviços, porque nunca estiveram confinadas, porque desde o primeiro dia disse que não faltaria água aos nossos clientes".

 

Explicou que o regadio é fundamental para Portugal porque no clima mediterrânico quando as plantas precisam de água a natureza não lhes dá. "Se queremos que as plantas cresçam no verão, que é quando têm mais radiação, calor, condições para crescer, só através do regadio se ultrapassa esta limitação. Quando se faz aumenta-se muito a produção, em que, em média se multiplica por seis, mas há casos em que se aumenta o rendimento por 10 ou 12 vezes. Se todas as explorações do Sul tivessem 15% de regadio multiplicava-se muito o VAB agrícola", disse José Pedro Salema. Defendeu ainda que se deve caminhar para uma agricultura intensiva sustentável.