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Os problemas da retoma da atividade

“A atividade tem vindo a ser retomada na área da gastroenterologia, mas o atraso, que já existia nos exames complementares de diagnóstico, especialmente nas colonoscopias, tornou-se ainda maior”, diz Ana Sampaio, presidente da APDI.

30 de Setembro de 2021 às 14:30
Ana Sampaio, presidente da APDI - Associação Portuguesa de Doença Inflamatória, Colite Ulcerosa e Doença de Crohn DR
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"O especialista do aparelho digestivo é responsável por algumas das doenças mais importantes do País, não só em termos de volume, mas também no que diz respeito a morbilidade e mortalidade. Aproximadamente um terço das mortes por cancro são provocadas por cancros do aparelho digestivo, ou seja, não há país saudável sem a atividade do especialista do aparelho digestivo", diz Rui Tato Marinho.

O impacto da pandemia de covid-19, que teve início em março de 2020, foi muito elevado em vários aspetos, até porque se enquadra em muitos aspetos "num cenário de prática de medicina de catástrofe", como refere Rui Tato Marinho.

No que diz respeito às doenças do fígado houve redução do número de tratamentos para a hepatite C, redução do número de exames para avaliação do fígado como seja a elastografia (Fibroscan®), ecografia abdominal. Na fase inicial em alguns dos centros de transplante hepático deu-se a quase suspensão dos transplantes devido à contaminação de membros do corpo de profissionais.

Relativamente aos exames endoscópicos a redução dos exames foi muito marcada, cerca de 90% na fase inicial. "As recomendações internacionais e as orientações nacionais eram no sentido de reduzir os exames às indicações de urgência e casos prioritários no contexto da doença oncológica", recorda Rui Tato Marinho. Quanto às consultas conseguiu-se recorrer à consulta telefónica, em menor grau à telemedicina, de modo a minimizar os riscos de não assistência médica.

Experiência no Algarve

A experiência de Paulo Caldeira no Algarve foi semelhante. O impacto da pandemia nos doentes do foro gastrenterológico e hepatológico foi grande e semelhante às outras áreas da medicina. Deu-se a redução mandatória da atividade clínica para diminuir risco de transmissão, com a redução a cerca de um terço na maioria dos serviços, desvio de recursos humanos e materiais para áreas covid, diminuição da referenciação a partir dos cuidados primários até por receio e faltas dos doentes.

Paulo Caldeira, diretor do Serviço de Gastroenterologia do Centro Hospitalar e Universitário do Algarve.

"A quebra de atividade sentiu-se especialmente na área da endoscopia digestiva, menos na área da consulta externa com passagem a teleconsulta - e pouco na área do internamento. O impacto notou se especialmente no diagnóstico tardio de doença oncológicas do tubo digestivo com doença mais avançada. Doenças crónicas como as inflamatórias intestinais e a cirrose hepática sentiram menos impacto por se ter mantido alguma forma de seguimento em teleconsulta", refere Paulo Caldeira.

Os atrasos pré-pandemia

Como diz Rui Tato Marinho, "estamos a tentar recuperar num contexto de pós-guerra". As consultas como passaram se ser realizadas também de forma não presencial estão a ser estabilizadas e o número de tratamentos, por exemplo para a hepatite C, tem vindo a aumentar também de forma paulatina. O rastreio do cancro do cólon e reto, pelo menos na área de Lisboa, é que registou redução dos rastreados.

Em termos de recuperação da atividade assistencial na área da endoscopia e cirurgia houve "franca retoma, mas poucas unidades de saúde terão voltado à produção pré-pandemia, talvez se tenha chegado aos 80% na maioria dos casos. Os programas de rastreio foram suspensos em 2020 e a retoma é irregular. Na ARS Algarve o rastreio CCR ainda não foi retomado", afirma Paulo Caldeira.

Segundo Ana Sampaio, a atividade tem vindo a ser retomada na área da gastroenterologia, mas o atraso, que já existia nos exames complementares de diagnóstico, especialmente nas colonoscopias, tornou-se ainda maior. Adianta que "as colonoscopias apresentam listas de espera superiores a um ano em muitos hospitais públicos. Este exame é determinante para o diagnóstico da doença e para avaliar a sua progressão e ajuste de medicação, bem como no diagnóstico do cancro dos intestinos". Por isso a presidente da APDI - Associação Portuguesa da Doença Inflamatória do Intestino, Colite Ulcerosa e Doença de Crohn. defende que se permitisse que os doentes que se encontram em lista de espera há mais tempo pudessem realizar estes exames no setor social ou privado.