- Partilhar artigo
- ...
"Portugal apresenta ainda uma produção aquém do desejável na área da investigação médica orientada para a clínica, a qual não tem acompanhado o ritmo de crescimento de áreas científicas afins, nomeadamente no que respeita à utilização e aplicação dos conhecimentos por estas produzidos" escrevia-se recentemente num resolução conjunto dos ministérios da Saúde e da Ciência.
"A investigação clínica é não só reconhecida pelo Governo como pelas unidades de saúde como uma mais valia para um melhor tratamento dos doentes, maior eficiência e atracção de terapias inovadoras" refere Emília Monteiro, professora Nova Medical School, que acrescenta que "a investigação clínica tornou-se primordial porque como estamos na Europa". Acrescenta que "há benchmarking e há a necessidade de fazer a acreditação de unidades de saúde, o que em muitos casos só é possível se tiverem centros de investigação. Por outro lado temos a percepção de que recursos são finitos e as unidades perceberam que quando mais espirito crítico os médicos têm melhor gerem os recursos. Há mais eficiência e não aceitam tudo".
A investigação clínica, ou do médico-cientista como se dizia no início do século XX, é uma necessidade. Um relatório recente sobre a Saúde promovido pela Fundação Gulbenkian referia que "deve destacar-se que a investigação biomédica teve progressos notáveis em Portugal na última década, devido a uma intervenção intensiva na educação científica, nomeadamente através de doutoramentos internacionais e da criação dos chamados "Laboratórios Associados" do Ministério da Ciência. No entanto, a articulação entre a investigação básica e a investigação aplicada e a promoção de uma "medicina de translação" mais eficaz ainda não se concretizaram de forma satisfatória".
Mais médicos
Mas Emília Monteiro alerta para o facto esta investigação necessitar de se mover num ambiente e contexto internacional "porque precisa de amostras de grande dimensão e cada vez mais estratificadas. Os ensaios clínicos são quase todos internacionais e multicêntricos". Depois a complexidade da investigação é grande e a inovação nasce no cruzamento de saberes por isso as ligações internacionais são fundamentais. Acrescenta ainda que "não há investigação clínica sem médicos bem formados, sem equipas de investigação com pessoas a full-time e sem terem estruturas administrativas que tratem dos procedimentos todos (Comissões de Ética, Infarmed, CNPC, etc.), das harmonizações legais com países europeus e os Estados Unidos, que preparam todo o trabalho para o médico".
A investigação clínica, ao contrário da fundamental, tem uma grande complexidade burocrática com uma grande carga de ‘paper work’. Acontece por razões éticas pois tem de assegurar os direitos e a protecção das pessoas. Além disso, como é um tipo de investigação que pode gerar patentes e produtos comerciais, como medicamentos ou dispositivos médicos, está sujeita a grande regulação para protecção dos interesses científicos e dos comerciais, o que tem implicações burocráticas e administrativas. Finalmente tem de garantir a qualidade dos dados que na investigação clínica são amostras na ordem dos milhares, recolhidas em vários países e continentes. Isto implica que haja software e sistemas de qualidade dos dados, que, como diz Emília Monteiro, "é mais pesado do que na investigação básica".
A importância da investigação clínica mede-se pelo facto de os hospitais privados estarem a fazer um esforço neste sentido porque, segundos estudos de consultoras como a Deloitte, os hospitais privados se não tiverem investigação e ensino ao fim de dez anos perdem a sua sustentabilidade e distanciam-se na inovação e das terapêuticas inovadoras.