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O turismo faz bem à cultura

Era importante conseguir chamar alguns desses turistas para a nossa indústria de entretenimento. Por outro lado é fundamental ter uma estratégia de ocupação dos tempos livres dos turistas.

01 de Junho de 2017 às 12:20
Sofia Escobar diz que era importante chamar turistas para os espectáculos culturais. Inês Lourenço
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A indústria do entretenimento é estratégica e tem de ter em conta a população flutuante, que é formada sobretudo para turistas. Como referiu Carlos Vargas, presidente do Teatro Nacional de São Carlos, "esta dimensão da indústria é fundamental para o entretenimento, porque, para estas populações flutuantes e intermitentes nas cidades, a ocupação dos tempos livres é determinante. Importa definir estratégias de ocupação dos tempos livres desta população flutuante e intermitente que não têm as mesmas necessidades das populações permanentes".

"O turismo faz bem à cultura" disse Sofia Escobar, cantora e rosto das campanhas do Banco Popular. Mas a artista portuguesa, que fez grande parte da sua carreira em Londres, refere que se nota muitas diferenças em termos de mercado. "Um turista em Londres vai muitas vezes ver uma peça de teatro, especialmente os musicais. Nós ainda não temos esse apelo em relação ao mundo do espectáculo" refere.

Uma outra concepção de cultura

"O turista procura em Portugal outro tipo de atracções como a boa comida, boa disposição, o clima, as pessoas, o sol, o mar, a praia. Era importante conseguir chamar alguns desses turistas para a nossa indústria de entretenimento". Não seria tanto no teatro mas abrem-se possibilidades nas outras artes performativas. "No caso da música é diferente já é mais acessível, as pessoas estão mais predispostas a irem assistir a um espectáculo de ópera, concerto de música clássica porque a linguagem é comum e universal" resume Sofia Escobar.

Para Carlos Vargas "a cultura não é exactamente a dimensão entretenimento; é uma dimensão mais complexa, não é nem pior nem melhor, não há uma escala de valores, mas é distinta". Invoca o trabalho teórico de Raymond Williams, sociólogo galês, que nos anos 1960 escrevia que "cultura é tudo o que é excelência, que é difícil de alcançar e que exige competências que a maior parte das pessoas não tem". Mas a cultura também é "um modo de vida, tudo o que uma determinada comunidade entende que é um valor em si".

Esta teoria alterou as concepções espartilhadas entre a alta cultura e as elites e alargou o seu sentido. A cultura deixa de ser "aquilo que as elites cultivam, o saber literário, das imagens, da música mais complexa mas é também um modo de vida a gastronomia, as práticas religiosas, o desporto, que é uma das práticas culturais mais interessante do nosso tempo, é a ecologia, a saúde e o bem-estar. Tudo isto vai contribuir nesta complexidade para a construção de um turismo sustentável".

A resposta cultural do São Carlos ao entretenimento

"O Festival ao Largo é a resposta do Teatro de São Carlos à procura no domínio do entretenimento mas do domínio cultural" diz Carlos Vargas. O Teatro Nacional de São Carlos é um teatro do século XVIII que opera com uma tecnologia oitocentista em madeira, cordas, manual, o que é em si "um valor cultural absolutamente insubstituível", ou como diz Paula Araújo Silva, "São Carlos é um masterpiece de arquitectura e de história do teatro".

A pressão do entretenimento e uma maior procura por parte dos turistas e do público implica respostas. "O problema é que o São Carlos não tem capacidade para responder à procura porque tem uma oferta limitada" diz Carlos Vargas. Além disso cada vez que há um espectáculo "para as cerca de 700 pessoas que estão a assistir estão outras 700 por detrás entre orquestra, figurantes, bombeiros, etc.. O espaço tem em 3 ou 4 horas uma pressão humana brutal, é preciso equilibrar a qualidade do valor patrimonial com a função que a pressão da indústria torna cada vez maior. Já para não dizer que os espectáculos são cada vez mais tecnológicos" acentua Carlos Vargas.

O Festival ao Largo surgiu para dar uma resposta mas não foi para fazer entretenimento. "O que faz é trazer para a rua o aparato da música erudita, traz a orquestra, o bailado. Não há concessões" conclui Carlos Vargas. Em cada sessão do Festival ao Largo cabem cerca de 2500 pessoas.