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Mais ou menos impostos? A "tragédia" já é mudar

O receio é de que a rede fina da confiança possa rasgar. Com ela, negócios perdidos. A instabilidade fiscal não agrada ao imobiliário nem ao alojamento local. Até porque os estrangeiros estão bem atentos.

03 de Novembro de 2016 às 11:39
O novo imposto sobre o imobiliário esteve em destaque no painel que discutia a recuperação deste mercado. Inês Lourenço
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Não foi preciso muito tempo para que o problema fosse colocado em cima da mesa. O painel da segunda edição do Observatório: O Imobiliário em Portugal discutia "A Recuperação do Mercado Imobiliário". Até que ponto ela está em risco com um novo imposto?

Em causa está a intenção do Governo em taxar o património imobiliário acima dos 600 mil euros com um IMI adicional. A proposta faz parte do Orçamento do Estado para 2017 e está a deixar o sector do imobiliário à beira de um ataque de nervos.

Mais do que pelo imposto em si, pela mensagem que ele transmite além-fronteiras. "Que sinal é que estamos a dar aos estrangeiros? Sempre ouvi dizer: sem palhaço não se faz a festa", afirmou Luís Lima.

O presidente da APEMIP, que representa as agências imobiliárias nacionais, lamenta que o sector não tenha sido ouvido pelo Governo de António Costa antes de ter avançado com este novo imposto. "Não acredito que vá em frente. Isto é uma tragédia para nós. Até para o comércio e serviços", realçou.

A perspectiva é que o investimento estrangeiro em imobiliário português - um sector "que é a árvore das patacas" - atinja a fasquia dos quatro mil milhões de euros este ano, com os estrangeiros a protagonizar uma em quatro operações.

Até ao momento, Luís Lima diz que o impacto ainda não se faz sentir. Até porque só se estão a assinar negócios que já têm três ou quatro meses, anteriores à nova medida. "Nos negócios de maior valor está a afectar, o que não quer dizer que não se façam", diz Luís Lima. Os agentes e consultores imobiliários ouvidos pelo Negócios ao longo das últimas semanas confirmam o cenário.

Todos estão preocupados com o cenário de instabilidade fiscal, considerando-o uma "tragédia" num sector que vive assente na confiança dos investidores e na estabilidade das condições de negócio.

Luís Lima recorda a injustiça do novo imposto num país marcado por assimetrias: "Lisboa e Porto é uma coisa. O resto do país não é bem assim. E vai-se criar um novo imposto?".


600
Património
Um novo imposto incidirá sobre o património imobiliário acima dos 600 mil euros.


Jorge Figueiredo, sócio da PricewaterhouseCoopers (PwC), acredita que o novo imposto pode adiar a decisão de investir. Contudo, não afectará o fecho de negócios. "Tudo o que é discutido aqui, sabe-se lá fora. Os estrangeiros só não sabem se estiverem muito distraídos", avisou.

O novo imposto acaba por ser um sinal contraditório numa altura em que a própria banca começa a mostrar maior disponibilidade para o crédito, embora sem os níveis a que se assistiu no passado, acabou por ser destacado. "Não se vai fazer na mesma dimensão, escala e velocidade que se fez no passado, em que se acreditou num retorno demasiado rápido dos investimentos", posicinou Manuel Puerta da Costa, administrador do BPI Gestão de Activos durante os trabalhos da conferência realizada a 18 de Outubro.

Mas o imobiliário não foi o único a apontar o dedo ao Governo na hora de discutir aumentos de impostos no Orçamento do Estado para 2017. Neste caso, o documento prevê quem presta actividades de alojamento a turistas passe a pagar IRS e IRC sobre 35% das vendas, contra os 15% actuais.

Mais do que o aumento do imposto, "o que mais ressente o mercado é não entender as motivações e qual pode ser a evolução futura", posicionou o líder da ALEP. Eduardo Miranda lembrou que o sector do turismo é uma "rede muito fina" que pode ser quebrada com qualquer instabilidade, como a fiscal. "Como um todo, temos de agir estrategicamente", afirmou.

O sector do imobiliário, até porque tem fortes ligações com o turismo, concorda. As alterações fiscais pensadas a "curto prazo" podem manchar a reputação de um país que se vinha afirmando, mais do que pelos seus preços, pela sua estabilidade e garantias. Mais do que uma simples "tragédia", é uma "tragédia autêntica", resume Luís Lima.