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Ana Teresa Lehmann: "Jovens têm de sentir que é prestigiante trabalhar na indústria"

A secretária de Estado da Indústria diz que a nova revolução industrial que está em curso não é só tecnológica mas "sobretudo social". E diz que o grande desafio é atrair jovens para o sector, mostrando-lhes que é uma área "sexy".

07 de Dezembro de 2017 às 12:03
Ana Teresa Lehmann realçou a importância de mostrar aos jovens que na indústria serão bem pagos. Inês Lourenço
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A Indústria 4.0 é um "tema fundamental para a modernização da nossa indústria". Tanto assim é que a secretária de Estado da Indústria, Ana Teresa Lehmann, a elege como uma "principais linhas de actuação" do Governo, e prova disso são os "4,5 mil milhões de euros" que se estima que serão injectados na economia nos próximos quatro anos. Essa verba, que mistura fundos públicos e privados, servirá para adoptar tecnologia para digitalizar todo o processo produtivo, mas não chega.

E não chega porque há uma "escassez de recursos humanos" e "sabemos que a nível digital também há essa escassez". É um "estrangulamento" que tem de ser resolvido. Como? "É fundamental atrair jovens para a indústria", defendeu a governante, durante o almoço executivo promovido pelo Negócios e pela Sage. "O nosso grande desafio não é económico nem financeiro, é demográfico, por isso coloca-se com maior acuidade a eficiência de recursos" e a "atracção de jovens para a indústria".


4,5
mil milhões
Será o montante que vai ser investido até 2021 na modernização da economia, para a adaptar à Indústria 4.0.


Alemanha e Portugal "sempre tiveram indústria relevante" e "têm de continuar a ter". Os serviços "são muito importantes mas nenhuma economia sobrevive só com serviços, tanto mais que somos exemplo de excelência em muitos sectores" na indústria. "Nas últimas duas décadas tenho dedicado muita atenção à indústria e é muito gratificante observar o grau de excelência que existe em tantos sectores em Portugal, há exemplos que nos devem orgulhar muito".

Por isso, "não devendo demitir-nos de continuar a elevar o perfil da indústria na nossa economia. Temos de voltar a fazer os jovens sentir que é prestigiante trabalhar na indústria, que têm orgulho em ter uma actividade industrial". O mais provável é que os jovens, actualmente, optem por "trabalhar para um hotel, um centro comercial", mas é preciso que "conseguir que os jovens tenham vontade de trabalhar numa empresa industrial".
Hugo Oliveira abordou alguns dos desafios para as empresas.
Hugo Oliveira abordou alguns dos desafios para as empresas. Inês Lourenço
E isso pode fazer-se "de muitas formas". Entre elas, "abrir as portas às famílias, aos jovens da escola primária, informarmos os jovens que se forem para a indústria têm uma carreira". A governante tinha estado com os reis da Holanda nessa manhã numa visita à Ogma e isso foi lá comentado. "Hoje em dia um bom soldador, um bom torneiro mecânico, são carreiras bem remuneradas, de longo prazo, que não sofrem de sazonalidade, que não estão sempre a mudar. É importante comunicar a perenidade destas carreiras" e "tornar a industria cada vez mais sexy", como fez o calçado.

Empresas estabelecidas devem ajudar startups

A governante defendeu também uma maior ligação entre a indústria dita tradicional e as startups. "Estes dois mundos não devem viver um sem o outro. Há vantagens mútuas das empresas mais estabelecidas com ajuda das mais emergentes", porque estas "são mais atrevidas, não têm a mesma herança histórica, podem ser mais aguerridas" e as empresas já estabelecidas podem ir "buscar tecnologias mais desafiantes através dessas empresas".

O conceito de cadeia de valor vai contrastar com o conceito tradicional geográfico quando ouvimos falar de mercados. Hoje em dia, temos que pensar que por vezes é mais importante para uma empresa dos moldes entrar na cadeia de valor de um grande fabricante automóvel ou aeronáutico.

Persiste a ideia de que há a indústria tradicional estabelecida, empresas médias e grandes, e as startups. Uma das áreas em que queremos actuar é o tema das ligações. (...) Estes dois mundos não devem viver um sem o outro. 
Ana Teresa Lehmann
Secretária de Estado da Indústria

As start-ups "padecem de um grande risco": às vezes têm "falta de conhecimentos de gestão, de saber como entrar no mercado". Têm "tecnologias muito interessantes, inovam bastante mas depois não sabem a quem vão vender, portanto precisam muito do conhecimento dos empresários já estabelecidos para terem mercados naturais de colaboração e de venda dos seus produtos e serviços, mas também de aprenderem como se internacionaliza e penetra em mercados", e firmando "alianças estratégicas", essencialmente "de vendas de bens e serviços".
Uma das principais ideias que foi transmitida pelos oradores foi que a indústria 4.0 não é uma revolução, mas um aprofundamento da digitalização que já está em curso.
Uma das principais ideias que foi transmitida pelos oradores foi que a indústria 4.0 não é uma revolução, mas um aprofundamento da digitalização que já está em curso. Inês Lourenço
Nesta nova fase, assinalou, uma das novas visões disruptivas já não olha para os mercados do ponto de vista geográfico. "É mais importante entrar na cadeia de valor de uma grande cadeia de retalho de nível mundial do que pensar em expandir-nos para o Brasil ou EUA".

Afinal, o que é a Indústria 4.0?

Como o próprio nome indica, esta é uma quarta fase do processo de transformação industrial. Depois do arranque da produção mecânica com o impulso da máquina a vapor, seguiu-se o reforço da produção em massa já com a energia eléctrica. Tivemos ainda, mais recentemente, uma progressiva e acelerada digitalização da indústria, reforçando o papel da automação e das tecnologias. Agora, o passo em frente é tirar partido das tecnologias cada vez mais inovadoras e usá-las para transformar todo o processo de produção nas suas mais variadas vertentes. Uma possível definição para a Indústria 4.0 é que esta busca a digitalização dos activos físicos e na sua integração em ecossistemas digitais com os vários fornecedores da cadeia de valor. As máquinas vão muito para além do costumeiro hardware, utilizam a inteligência artificial e têm uma maior autonomia nos processos de tomada de decisão. Terá de haver uma forte implementação de recolha e tratamento de dados, em tempo real, que têm de ser tidos em conta nos processos de decisão e de gestão. O Big Data é, assim, um dos pontos-chave desta mudança de paradigma, pelos ganhos de eficiência que pode trazer se for bem aproveitado, algo que é o grande desafio actualmente (que tipo de dados são efectivamente úteis para uma empresa e o que fazer com eles). O objectivo central é que haja todo um ecossistema, incluindo o produtor industrial, os fornecedores e os clientes, que estejam ligados num ambiente digital, permanentemente actualizado, mais ágil e mais eficiente. Elementos como os sensores e a tecnologia blockchain, por exemplo, são algumas das ferramentas em destaque.  
Tiago Freire