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"Um provérbio chinês diz que o melhor momento para plantar uma árvore foi há 20 anos e o segundo melhor é agora. O PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) é uma enorme oportunidade para dar um salto e avançar 20 anos em cinco, é um enorme desafio para as empresas", salientou Maria José Campos, administradora executiva do Millennium bcp.
Por sua vez, para Jorge Portugal, diretor-geral da Cotec Portugal, a expectativa com o PRR é que "possa haver um aumento significativo de empresas a apostar em I&D, conhecimento e tecnologia. Nos últimos anos tem sido dado um grande impulso à inovação colaborativa, mas este é mais um impulso a que se aumente a capacidade de colaboração entre as empresas, e entre as empresas e as universidades, que são, na prática, as grandes fornecedoras do conhecimento".
Jorge Portugal referiu que as comparações entre Portugal, Espanha e Itália, que têm implantados modelos como a Cotec, mostram que, pelo rácio de I&D/despesa FEDER e as receitas de produtos inovadores, "Portugal tem 1 euro investido para 1 euro de receitas, a Itália tem 1 euro para 7 de receitas e Espanha 1 para 5. Falta em Portugal o efeito multiplicador, que é transformar".
Doutoramento cria empresa
Alerta para o salto a dar porque este instrumento de recuperação e resiliência permite aumentar a intensidade da colaboração, "mas não basta apenas investir no conhecimento, é preciso torná-lo produtivo, o que significa levar os resultados do trabalho de investigação para o mercado". De que a Critical Software é um bom exemplo.
"A Critical Software está quase a celebrar um quarto de século e tem peças de engenharia espalhadas pelo mundo inteiro, pelos cinco continentes, pelo mar, pelo ar e pelo espaço, que é uma coisa que tanto nos orgulha", disse Bernardo Patrão, diretor de inovação da Critical Software.
Revelou que a própria origem da Critical Software está muito ligada à inovação em conjunto com as áreas de engenharia das instituições universitárias, tendo nascido a partir de uma tese de doutoramento que tinha como propósito resolver um problema que a NASA tinha. "É possível fazer esta transferência tecnológica, de conhecimento das universidades para as organizações", considerou Bernardo Patrão.
"Portugal é muito inovador, temos arte e engenho e é reconhecido internacionalmente", por isso tem de capitalizar este reconhecimento e passar para um nível mais alto na cadeia de valor, ser fornecedor de tecnologia de topo e que nos distinga de todos os outros países. E é isso que procuramos fazer na Critical Software", afirmou Bernardo Patrão.
O modelo dos consórcios
Na opinião de Maria José Campos, "o modelo de consórcios escolhido no PRR para as agendas mobilizadoras é importante porque leva ao envolvimento das academias, empresas tecnológicas, grandes empresas, mas também à participação de empresas médias e pequenas empresas sem músculo para a criação de capacidade de inovação".
Acrescentou ainda que numa altura em que há défice de recursos especializados nas áreas tecnológicas e de engenharia, os consórcios seriam um modelo para reunir plataformas de capacidades partilháveis e utilizáveis "pelas várias empresas ao nível dos dados, da cibersegurança, da inteligência artificial, da robotização. Os consórcios são um mecanismo ideal para viabilizar este modelo e pode ser o segredo de em cinco anos avançarmos vinte".
Maria José Campos apontou a pequena dimensão do mercado nacional e o facto de a Europa estar muito longe de ter o ecossistema de financiamento de startups e projetos emergentes, que têm os Estados Unidos. Considera contudo que há muitos outros fatores para a capacidade de inovação. Um dos grandes desafios é o repensar do que são os produtos, a oferta, os serviços, com um foco muito grande no cliente, conseguir reimaginar o que é a combinação de tecnologias e a sua aplicação que permite propostas de valor muito diferentes.
Outro fator para a inovação é prescindir do hábito instituído em muitas empresas de um over-management e um underlead, no sentido em que as vezes há menos desafio, o "porque é que não…", e muito controlo dos passos que as equipas e as empresas seguem para o desenho das propostas de valor.
Um dos aspetos referidos foi o impacto da inovação na gestão de risco e nas formas de financiamento. Jorge Portugal citou uma boutade que diz que se os bancos tentassem financiar as empresas que estavam na Web Summit não financiavam nenhuma, "mas explicou que não é essa a vocação da banca, pois para maior risco existem outro tipo de instrumentos".
No entanto, sublinhou que a banca "vai ter de dominar os ativos intangíveis, como faz hoje com os ativos tangíveis. Quando há empresas em que as vendas são influenciadas pela inovação, pelo I&D, terá de ser capaz de avaliar, como faz hoje uma empresa com ativos físicos, os ativos intangíveis que vão ter a capacidade de produzir para poder multiplicar vendas e ser fiável. Este é um terreno novo para as empresas e para os financiadores. Na Europa, a Irlanda e a Suécia são países em que o investimento em ativos intangíveis já ultrapassou o investimento em ativos tangíveis. Portugal, Espanha e Itália estão na média", concluiu Jorge Portugal.
"É possível que Portugal se torne numa fábrica de boas empresas, que poderão não chegará valorização de mil milhões de dólares que é a definição de unicórnio, mas poderão crescer muito acima do que são hoje, porque o problema de Portugal é que tem empresas com crescimentos anémicos. Têm capacidade de inovação, têm ideias, os empresários são criativos, têm boas equipas, mas depois não têm capacidade para sair dos 10 milhões de euros e chegar aos 100 milhões de faturações".
Jorge Portugal referiu ainda um estudo sobre a síndrome de Peter Pan, empresas que não querem crescer. "É muito difícil passar dos 50 milhões porque há muitos incentivos e instrumentos públicos que fazem com que as empresas não queiram crescer e pensem que a partir dos 50 milhões ou 250 trabalhadores já não são consideradas PME e desaparece uma grande parte dos incentivos."