Notícia
Ganhe 5% por ano nas acções
Os aforradores que procuram receber rendimentos estáveis dos seus activos estão aflitos: os depósitos a prazo, as aplicações de poupança mais popular, rendem taxas de juro cada vez mais magras, conduzidos pela queda vertiginosa das Euribor...
16 de Outubro de 2009 às 09:36
Seleccionando um cabaz de firmas que nunca baixaram os dividendos na última meia década, consegue criar um investimento de rendimento anual estável e quase certo.
Os aforradores que procuram receber rendimentos estáveis dos seus activos estão aflitos: os depósitos a prazo, as aplicações de poupança mais popular, rendem taxas de juro cada vez mais magras, conduzidos pela queda vertiginosa das Euribor.
Nos depósitos a prazo de referência da Caixa Geral de Depósitos, as taxas de juro são inferiores a 1%. Mesmo para ganhar 0,5% líquidos de IRS no banco estatal, é preciso mobilizar 25 mil euros durante mais de seis meses.
As alternativas mais procuradas não são muito melhores: os certificados de aforro, cada vez menos populares entre os portugueses, já capitalizam a taxas líquidas na ordem dos 0,7%.
Depois de desvalorizações de dois dígitos, os rendimentos distribuídos pelos fundos de obrigações podem estar em risco.
O imobiliário já não reúne o consenso como investimento seguro. Comprando obrigações de longo prazo, consegue-se uma taxa anual líquida de cerca de 3%, mas esse rendimento só é garantido se não mexer no dinheiro durante uma década. Neste cenário, os aforradores que querem receber um rendimento frequente poderão voltar-se para um investimento que, à primeira vista, é pouco aconselhável: as acções.
As bolsas de valores são vistas como uma fonte de especulação, mas não tem de ser assim. Os dividendos distribuídos podem ser certos, frequentes e - ainda melhor - crescentes. A Coca-Cola, a sociedade que gere a marca de refrigerantes homónima, nunca falhou um pagamento de dividendos desde 1893, um ano depois de Asa Candler a fundar e sete anos após John Stith Pemberton ter inventado a fórmula da bebida que é hoje servida em 200 países. Além de pagar dividendos ininterruptamente durante mais de um século, a Coca-Cola aumentou o dividendo anual nos últimos 47 anos. Qual é a probabilidade de não pagar no próximo?
É verdade que a maioria das firmas tem reduzido ou eliminado os pagamentos de dividendos desde que a crise financeira estalou e dificultou o acesso ao crédito. Na semana passada, Paul Shutes, responsável pelas vendas do fundo JPMorgan Europe Strategic Dividend, indicou ao Negócios que os dividendos caíram 10%, excluindo o sector financeiro, que reduziu as taxas de dividendo entre 20% e 30%. Todavia, muitas continuam na senda de aumentos de dividendos.
É nos Estados Unidos da América, a sede do capitalismo mundial, que se encontram as recordistas de dividendos. Além da Coca-Cola, Colgate-Palmolive, Exxon Mobil, Eli Lilly, PPG Industries e Stanley Works distribuíram dividendos incessantemente durante os últimos 100 anos e, inclusivamente, aumentaram os pagamentos anuais nos últimos 40 anos consecutivos.
Porém, estes dividendos não são estáveis para os investidores portugueses: como são pagos em dólares, há um risco cambial não desejado pelos aforradores que pretendem obter rendimentos sólidos em euros.
Reduzir o risco da bolsa
Os dividendos são uma variável fundamental na equação dos ganhos de bolsa. "De 1871 a 2003, 97% da acumulação acima da inflação das acções [norte-americanas] veio do reinvestimento dos dividendos. Apenas 3% teve origem em ganhos de capital", afirma Jeremy Siegel, professor da Universidade da Pensilvânia, no livro "The Future for Investors". Embora muitos investidores procurem comprar e vender títulos, beneficiando de potenciais mais-valias, os verdadeiros ganhos de longo prazo estão nos dividendos.
"Uma descoberta desconcertante, mas geralmente aceite, é que a rendibilidade agregada das acções é previsível pela taxa de dividendo", resume Long Chen, professor de Finanças da Michigan State University, num estudo recente. Isto quer dizer que alguém que invista em acções apenas a contar com os bons dividendos, pode estimar que as suas acções se valorizem à medida que os seus títulos recebam pagamentos anuais. Vários estudos académicos demonstram que as acções dos melhores pagadores são mais estáveis do que as que não pagam dividendos.
Se um investidor aplicar o seu dinheiro nas acções das melhores pagadoras de dividendos da Zona Euro que não baixaram as distribuições anuais nos últimos cinco anos, podem contar receber mais de 5% por ano, independentemente da orientação dos mercados. A E.On, a companhia energética alemã, nunca reduziu os dividendos anuais desde 1989, à excepção dos dividendos especiais, mesmo antes de se chamar E.On. Se mantiver o dividendo, quem comprar agora as acções da empresa receberá anualmente o equivalente a 5,37% do seu investimento por ano. Ou seja, em menos de 20 anos, os investidores recebem o que investiram e ainda ficam com as acções. Porém, não é provável que a E.On mantenha o dividendo: é mais certo que a sociedade continue a incrementá-lo, como tem feito nos últimos anos: desde 2000, o aumento foi de 233%.
A taxa de dividendo (ou "dividend yield" em inglês) é a métrica que compara o valor do dividendo com o preço da acção. Este indicador é apresentado em percentagem, uma vez que indica a proporção da cotação que é coberta pelo dividendo anual. Actualmente, a Portugal Telecom é uma das melhores pagadoras de dividendos da Zona Euro, porque os 57,5 cêntimos de euro que distribuiu em Abril representam 7,83% do preço recente dos títulos.
Embora os dividendos das firmas que nunca deixaram de pagar na última meia década sejam prováveis, não são garantidos. Não há qualquer obrigação legal para continuarem a distribuí-los. Aliás, são os próprios accionistas que decidem que parcela dos resultados são destinados a dividendos.
No dia 27 Março, a assembleia geral da Portugal Telecom decidiu, por proposta dos administradores, o pagamento aos accionistas de 589,8 milhões de euros, o que foi aprovado com 99,99% dos votos. Contudo, se uma sociedade necessitar de financiar um grande projecto ou se não tiver lucros, então pode acontecer que, no ano seguinte, o conselho de administração não proponha qualquer dividendo.
Para evitar uma surpresa desagradável na hora de receber dividendos, os investidores que querem rendimentos estáveis das suas acções devem diversificar a fonte de receitas, adquirindo títulos de mais do que uma boa pagadora de dividendos. O Negócios encontrou mais de uma dezena de empresas da Zona Euro que não reduziram os dividendos por acção nos últimos cinco anos e cujas taxas de dividendo ultrapassam os 5%. Um investidor que distribua 100 mil euros na aquisição de acções destas sociedades, se elas mantiverem os dividendos por acção, então receberá uma receita bruta de cerca de 5.825 euros por ano.
Contudo, a este valor é preciso descontar as comissões de compra de acções na bolsa, de guarda de títulos e de pagamento de dividendos, bem como os impostos retidos no pagamento dos dividendos.
Evite a dupla tributação
O grande problema de investir em acções a pensar em dividendos são os impostos. Se os títulos forem nacionais, a retenção de IRS é realizada à taxa liberatória de 20%, o que não o impede de fazer o englobamento, se for conveniente.
Quando se opta pelo englobamento dos dividendos, apenas metade dos dividendos recebidos são contabilizados no apuramento do imposto, se a sociedade que os pagou for residente de um estado-membro da União Europeia. O maior impacto acontece, no entanto, nas acções estrangeiras: além do imposto cobrado pelo fisco português, os títulos podem ser alvo de retenção da autoridade fiscal do seu país de origem. Todavia, em alguns casos, é possível aligeirar a talhada fiscal.
No início de Maio, a Basf, a maior companhia de químicos do mundo, pagou 1,95 euros por acção, mas os investidores portugueses que não se prepararam apenas receberam 60% desse valor. Os intermediários financeiros retiveram 20% do montante para o fisco alemão e outros 20% para o português. A taxa alemã de 20% aplicada aos não residentes poderia ser aligeirada recorrendo à convenção para evitar a dupla tributação assinada entre Portugal e a Alemanha. Se quiser accionar a convenção antes de receber o dividendo, necessita de solicitar um certificado de residência fiscal nas Finanças e entregar junto da entidade responsável pelo pagamento do rendimento. Assim, a taxa cobra pela Alemanha é reduzida para 15%, a percentagem prevista na convenção.
O tratamento do seu pedido pelo intermediário financeiro pode ter custos, por isso, a melhor opção poderá ser accionar a convenção depois de receber o imposto. Quando for entregar o IRS, declare os dividendos no anexo J - Rendimentos Obtidos no Estrangeiro, mas pode optar por não os englobar. O fisco português devolverá parte do imposto pago no estrangeiro, através de um mecanismo de crédito de imposto.
Embora tenha bons frutos nos dividendos recebidos de empresas alemãs e francesas, nem sempre vale a pena accionar a convenção para evitar a dupla tributação, porque muitos países aplicam uma taxa de imposto aos não residentes igual ou inferior à taxa prevista na convenção. É o caso de Espanha: não se safa de pagar 15%.
Os aforradores que procuram receber rendimentos estáveis dos seus activos estão aflitos: os depósitos a prazo, as aplicações de poupança mais popular, rendem taxas de juro cada vez mais magras, conduzidos pela queda vertiginosa das Euribor.
As alternativas mais procuradas não são muito melhores: os certificados de aforro, cada vez menos populares entre os portugueses, já capitalizam a taxas líquidas na ordem dos 0,7%.
Depois de desvalorizações de dois dígitos, os rendimentos distribuídos pelos fundos de obrigações podem estar em risco.
O imobiliário já não reúne o consenso como investimento seguro. Comprando obrigações de longo prazo, consegue-se uma taxa anual líquida de cerca de 3%, mas esse rendimento só é garantido se não mexer no dinheiro durante uma década. Neste cenário, os aforradores que querem receber um rendimento frequente poderão voltar-se para um investimento que, à primeira vista, é pouco aconselhável: as acções.
As bolsas de valores são vistas como uma fonte de especulação, mas não tem de ser assim. Os dividendos distribuídos podem ser certos, frequentes e - ainda melhor - crescentes. A Coca-Cola, a sociedade que gere a marca de refrigerantes homónima, nunca falhou um pagamento de dividendos desde 1893, um ano depois de Asa Candler a fundar e sete anos após John Stith Pemberton ter inventado a fórmula da bebida que é hoje servida em 200 países. Além de pagar dividendos ininterruptamente durante mais de um século, a Coca-Cola aumentou o dividendo anual nos últimos 47 anos. Qual é a probabilidade de não pagar no próximo?
É verdade que a maioria das firmas tem reduzido ou eliminado os pagamentos de dividendos desde que a crise financeira estalou e dificultou o acesso ao crédito. Na semana passada, Paul Shutes, responsável pelas vendas do fundo JPMorgan Europe Strategic Dividend, indicou ao Negócios que os dividendos caíram 10%, excluindo o sector financeiro, que reduziu as taxas de dividendo entre 20% e 30%. Todavia, muitas continuam na senda de aumentos de dividendos.
É nos Estados Unidos da América, a sede do capitalismo mundial, que se encontram as recordistas de dividendos. Além da Coca-Cola, Colgate-Palmolive, Exxon Mobil, Eli Lilly, PPG Industries e Stanley Works distribuíram dividendos incessantemente durante os últimos 100 anos e, inclusivamente, aumentaram os pagamentos anuais nos últimos 40 anos consecutivos.
Porém, estes dividendos não são estáveis para os investidores portugueses: como são pagos em dólares, há um risco cambial não desejado pelos aforradores que pretendem obter rendimentos sólidos em euros.
Reduzir o risco da bolsa
Os dividendos são uma variável fundamental na equação dos ganhos de bolsa. "De 1871 a 2003, 97% da acumulação acima da inflação das acções [norte-americanas] veio do reinvestimento dos dividendos. Apenas 3% teve origem em ganhos de capital", afirma Jeremy Siegel, professor da Universidade da Pensilvânia, no livro "The Future for Investors". Embora muitos investidores procurem comprar e vender títulos, beneficiando de potenciais mais-valias, os verdadeiros ganhos de longo prazo estão nos dividendos.
"Uma descoberta desconcertante, mas geralmente aceite, é que a rendibilidade agregada das acções é previsível pela taxa de dividendo", resume Long Chen, professor de Finanças da Michigan State University, num estudo recente. Isto quer dizer que alguém que invista em acções apenas a contar com os bons dividendos, pode estimar que as suas acções se valorizem à medida que os seus títulos recebam pagamentos anuais. Vários estudos académicos demonstram que as acções dos melhores pagadores são mais estáveis do que as que não pagam dividendos.
Se um investidor aplicar o seu dinheiro nas acções das melhores pagadoras de dividendos da Zona Euro que não baixaram as distribuições anuais nos últimos cinco anos, podem contar receber mais de 5% por ano, independentemente da orientação dos mercados. A E.On, a companhia energética alemã, nunca reduziu os dividendos anuais desde 1989, à excepção dos dividendos especiais, mesmo antes de se chamar E.On. Se mantiver o dividendo, quem comprar agora as acções da empresa receberá anualmente o equivalente a 5,37% do seu investimento por ano. Ou seja, em menos de 20 anos, os investidores recebem o que investiram e ainda ficam com as acções. Porém, não é provável que a E.On mantenha o dividendo: é mais certo que a sociedade continue a incrementá-lo, como tem feito nos últimos anos: desde 2000, o aumento foi de 233%.
A taxa de dividendo (ou "dividend yield" em inglês) é a métrica que compara o valor do dividendo com o preço da acção. Este indicador é apresentado em percentagem, uma vez que indica a proporção da cotação que é coberta pelo dividendo anual. Actualmente, a Portugal Telecom é uma das melhores pagadoras de dividendos da Zona Euro, porque os 57,5 cêntimos de euro que distribuiu em Abril representam 7,83% do preço recente dos títulos.
Embora os dividendos das firmas que nunca deixaram de pagar na última meia década sejam prováveis, não são garantidos. Não há qualquer obrigação legal para continuarem a distribuí-los. Aliás, são os próprios accionistas que decidem que parcela dos resultados são destinados a dividendos.
No dia 27 Março, a assembleia geral da Portugal Telecom decidiu, por proposta dos administradores, o pagamento aos accionistas de 589,8 milhões de euros, o que foi aprovado com 99,99% dos votos. Contudo, se uma sociedade necessitar de financiar um grande projecto ou se não tiver lucros, então pode acontecer que, no ano seguinte, o conselho de administração não proponha qualquer dividendo.
Para evitar uma surpresa desagradável na hora de receber dividendos, os investidores que querem rendimentos estáveis das suas acções devem diversificar a fonte de receitas, adquirindo títulos de mais do que uma boa pagadora de dividendos. O Negócios encontrou mais de uma dezena de empresas da Zona Euro que não reduziram os dividendos por acção nos últimos cinco anos e cujas taxas de dividendo ultrapassam os 5%. Um investidor que distribua 100 mil euros na aquisição de acções destas sociedades, se elas mantiverem os dividendos por acção, então receberá uma receita bruta de cerca de 5.825 euros por ano.
Contudo, a este valor é preciso descontar as comissões de compra de acções na bolsa, de guarda de títulos e de pagamento de dividendos, bem como os impostos retidos no pagamento dos dividendos.
Evite a dupla tributação
O grande problema de investir em acções a pensar em dividendos são os impostos. Se os títulos forem nacionais, a retenção de IRS é realizada à taxa liberatória de 20%, o que não o impede de fazer o englobamento, se for conveniente.
Quando se opta pelo englobamento dos dividendos, apenas metade dos dividendos recebidos são contabilizados no apuramento do imposto, se a sociedade que os pagou for residente de um estado-membro da União Europeia. O maior impacto acontece, no entanto, nas acções estrangeiras: além do imposto cobrado pelo fisco português, os títulos podem ser alvo de retenção da autoridade fiscal do seu país de origem. Todavia, em alguns casos, é possível aligeirar a talhada fiscal.
No início de Maio, a Basf, a maior companhia de químicos do mundo, pagou 1,95 euros por acção, mas os investidores portugueses que não se prepararam apenas receberam 60% desse valor. Os intermediários financeiros retiveram 20% do montante para o fisco alemão e outros 20% para o português. A taxa alemã de 20% aplicada aos não residentes poderia ser aligeirada recorrendo à convenção para evitar a dupla tributação assinada entre Portugal e a Alemanha. Se quiser accionar a convenção antes de receber o dividendo, necessita de solicitar um certificado de residência fiscal nas Finanças e entregar junto da entidade responsável pelo pagamento do rendimento. Assim, a taxa cobra pela Alemanha é reduzida para 15%, a percentagem prevista na convenção.
O tratamento do seu pedido pelo intermediário financeiro pode ter custos, por isso, a melhor opção poderá ser accionar a convenção depois de receber o imposto. Quando for entregar o IRS, declare os dividendos no anexo J - Rendimentos Obtidos no Estrangeiro, mas pode optar por não os englobar. O fisco português devolverá parte do imposto pago no estrangeiro, através de um mecanismo de crédito de imposto.
Embora tenha bons frutos nos dividendos recebidos de empresas alemãs e francesas, nem sempre vale a pena accionar a convenção para evitar a dupla tributação, porque muitos países aplicam uma taxa de imposto aos não residentes igual ou inferior à taxa prevista na convenção. É o caso de Espanha: não se safa de pagar 15%.