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Quatro burlas à portuguesa

Muitos dos esquemas de burla ou fraude praticados em Portugal inspiram-se em esquemas conhecidos. Mas também há histórias de crimes inovadores, como o perpetuado por Artur Alves dos Reis.

04 de Março de 2009 às 13:02
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Muitos dos esquemas de burla ou fraude praticados em Portugal inspiram-se em esquemas conhecidos. Mas também há histórias de crimes inovadores, como o perpetuado por Artur Alves dos Reis.

As notas de 500 escudos de Alves dos Reis

Em 1925 o sistema financeiro português sofria uma das maiores burlas de sempre. Artur Alves dos Reis conseguiu contornar o sistema de supervisão, ingénuo e sem os meios que hoje lhe conhecemos, falsificando um contrato do Banco de Portugal para conseguir 290 mil contos em notas de 500 escudos, qualquer coisa como o equivalente a 2,6% do PIB da altura.

Com um currículo extenso de actividades fraudulentas, Alves dos Reis iniciou a sua carreira de "burlão" com apenas 19 anos, em Angola, onde conseguiu um cargo de funcionário público depois de forjar uma licenciatura em engenharia por Oxford.

A pouco e pouco consegue enriquecer e estabelecer contactos que lhe seriam muito úteis para perpetuar a fraude das notas de 500 escudos. Em 1924 é preso por desfalque e durante os cerca de 50 dias que esteve preso prepara o seu maior golpe: a falsificação de um contrato do Banco de Portugal. Todo o processo foi minuciosamente preparado por si com a ajuda de alguns cúmplices.

Alves dos Reis preparou um contrato fictício do Banco de Portugal, que lhe permitiu conseguir notas de 500 escudos falsas, mas impressas pela empresa que imprimia as notas de escudos na época, o que conferia ao dinheiro uma grande autenticidade. A extraordinária capacidade financeira permitiu-lhe fundar o Banco Angola e Metrópole, e de quase controlar a autoridade monetária portuguesa.

No seu julgamento, no qual foi condenado a 25 anos de prisão, Alves dos Reis reconheceu o seu esquema de falsificação, descrevendo a sua actuação como patriótica e guiada para o desenvolvimento de Angola.

Generosa e amiga do povo termina em Branca... rota

De famílias humildes e com uma formação escolar básica, Maria Branca dos Santos foi autora do maior e mais conhecido esquema Ponzi montado em Portugal.

Inicia a sua carreira de "banqueira do povo" no final dos anos 50, recebendo depósitos aos quais acrescia um juro mensal de 10% - 120% ao ano, muito acima do praticado pelas instituições bancárias. A sua actividade consistia num esquema de pirâmide em que utilizava o dinheiro dos mais recentes depositantes para pagar os juros aos clientes mais antigos.

Considerava-se generosa e quando o seu esquema de Ponzi foi descoberto, afirmou que o seu único intuito era ajudar aqueles que menos tinham. No entanto, entre os clientes de Dona Branca contavam-se clientes de todos os sectores da sociedade.

O ruir do seu império teve início em Março de 1983, quando o Jornal "Tal & Qual" publicou uma reportagem onde dava a conhecer o esquema de pirâmide. A investigação jornalística chamou não só à atenção das autoridades, mas sobretudo dos clientes da Banqueira do Povo, que com receio de perder os seus juros, corriam em massa aos seus escritórios para levantar os seus depósitos.

A corrida aos depósitos atingiu tais proporções que muitos clientes de Dona Branca não conseguiram reaver nem o dinheiro, muito menos os juros. No final de 1984, depois uma investigação movida pelas autoridades, Maria Branca dos Santos é presa onde fica à espera de julgamento. No final da década de 80 Dona Branca, juntamente com mais 68 arguidos, foi condenada a pena de prisão por burla agravada, emissão de cheques sem cobertura, entre outros crimes económicos.

Especulação na bolsa terminou em dívidas milionárias

A década de 80 demonstrou-se pródiga para a bolsa de Lisboa e para muitos dos seus corretores. Pedro Caldeira, um dos profissionais mais influentes da praça portuguesa, acompanhou os anos de ouro da especulação, mas acabou por ser arrastado com o fim de um ciclo de euforia bolsista. Mergulhado em dívidas e numa série acusações de crimes financeiros, acabou ilibado pelo tribunal ao virar do século.

Caldeira entra na bolsa em 1973 e no início da década de 80 inicia a sua ascensão. É nomeado corretor oficial da bolsa e passa a dirigir o escritório de Valentim Lourenço. Entre 1985 e 1987, Caldeira aproveita o "boom" da bolsa para efectuar negócios de milhões de contos e consolidar a sua carteira de clientes. Por esta altura chegou a deter uma quota de mercado de 12%.

No entanto, em 1987, o "crash" bolsista desvenda uma dívida do corretor de 1,9 milhões de contos. O declínio de Pedro Caldeira tem início em 1988, quando fica inibido de exercer as suas funções durante três meses.

Após cumprir a pena, Caldeira ainda tenta recuperar o prestígio de outros tempos, mas a obrigação de pagar a dívida leva-o a contrair vários empréstimos. Em Julho de 1992 foge para os Estados Unidos, deixando para trás uma dívida de cerca de 2,5 milhões de contos. A Interpol lança um mandato de captura e o corretor é preso em Atlanta, EUA.

Posteriormente regressa a Portugal, onde é julgado pela prática de 65 crimes de burla agravada e 17 crimes de abuso de confiança, e ainda pelo uso indevido de 2,5 milhões de contos. Contudo, em 2000, o Ministério Público não consegue provar as acusações, sendo Pedro Caldeira unicamente condenado ao pagamento de pedidos cíveis.

Selos prometiam juros de 6%

A empresa filatélica Afinsa protagonizou um dos crimes económicos mais conhecidos em Portugal e Espanha no século XXI. Esta empresa, uma das mais conceituadas no seu sector a nível mundial, vendia produtos de investimento em selos e prometia aos seus clientes rendimentos elevados, utilizando um esquema de pirâmide em que clientes mais recentes pagavam os rendimentos e juros aos clientes mais antigos.

Foi criada no início da década de 80 por Albertino Figueiredo e os investidores eram atraídos pela Afinsa devido aos juros avultados, 6%, que a empresa prometia a quem investisse em selos raros, que ela própria avaliava.

Em Março de 2006, as autoridades espanholas desencadearam uma investigação à Afinsa e ao Forúm Filatélico, encontrando indícios da prática de branqueamento de capitais, delitos contra o Ministério das Finanças, administração desleal e falsificação de documentos.

A investigação policial levou à prisão preventiva de vários responsáveis da Afinsa e do Forúm Filatélico, entre os quais Albertino Figueiredo e o seu filho, Carlos Figueiredo Escriba, estando entre as acusações a compra em 2003 de um lote de selos por 60 milhões de euros - um preço já considerado excessivo para os selos em causa - para vendê-los em seguida por 700 milhões aos seus clientes.

Ao todo, o buraco gerado pela Afinsa e pelo Forúm Filatélico ronda os 1,82 mil milhões de euros e envolve mais de 190 mil clientes e entidades, na maioria portugueses e espanhóis.

Na altura em que tiveram início as investigações, os responsáveis pelas duas empresas afirmaram que as intervenções judiciais contra as companhias foram premeditadas e danosas.

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