Notícia
O tempo de África
Um crescimento económico sustentado e um aumento significativo em investimento directo estrangeiro são apenas dois capítulos na narrativa emergente do continente africano na última década. Um estudo publicado pela consultora Ernst & Young, que mistura números e histórias, comprova que África está aberta aos negócios. E que Portugal foi o país que mais projectos realizou em Angola
18 de Maio de 2012 às 12:45
“Até que os leões possam contar as suas próprias histórias, os contos de caça glorificarão sempre o caçador”
O provérbio é africano e “abre” a segunda edição do estudo “Building Bridges – 2012 Atractiveness Survey Africa” realizado pela consultora Ernst & Young sobre o crescimento de África, com especial enfoque para o investimento directo estrangeiro no continente. De acordo com o relatório, Portugal foi o país que mais projectos realizou em Angola (v.caixa), no período entre 2003 e 2011, seguido dos EUA, Reino Unido, Espanha e África do Sul. Em 2011, o número de projectos de investimento em África teve um aumento de 27% face a 2010 e de 153% em termos absolutos desde 2003.
Mas e antes de se passar aos números, o estudo em causa oferece uma história bem contada, não de leões e caçadores, mas sim de um continente em franca expansão e progresso, com enorme potencial e lucros também. Para além de dados internos da própria consultora, foram ainda entrevistados mais de 500 executivos de topo africanos, cujos contributos deram mais cor à história contada por este relatório.
O VER resume o essencial do estudo, com especial atenção não só para as actuais forças, mas também para os principais desafios que o continente tem ainda de enfrentar.
A narrativa africana emergente
As reformas políticas, económicas e regulatórias – um processo que teve início na década de 1990 – continuam a moldar o continente. Os conflitos armados foram significativamente reduzidos, proporcionando a estabilidade relativa exigida para o crescimento económico e para o desenvolvimento. A inflação está a ser controlada, bem como a dívida estrangeira e os défices orçamentais. A abertura à privatização e o fortalecimento dos sistemas legais e regulatórios têm sido reais e são muitas as economias africanas que abriram portas ao comércio internacional.
Estas mudanças estruturais ajudaram a revigorar os mercados e o comércio, criando um ambiente que, de forma crescente, está a atrair novos negócios e investimentos. Com as reformas alargadas em conjunto com melhorias significativas na governança política e, especialmente, com a explosão das commodities, o nível de rendimento disponível aumentou, bem como a urbanização e um sector de serviços em rápido desenvolvimento tem vindo a contribuir para o que os autores do relatório apelidam de “caminho de crescimento sustentável” em África.
Todavia, subsistem ainda algumas barreiras internas ao crescimento, nomeadamente as que impedem o livre comércio intra-regional. Todavia e neste momento, os olhos estão virados para 2014, ano em que se espera que 26 países africanos, com uma população combinada de 600 milhões de pessoas e um PIB de aproximadamente um bilião de dólares se unam numa área comum de comércio livre. Adicionalmente, foram identificadas três outras barreiras importantes que inibem o comércio intra-regional. A primeira consiste na ausência de integração de sistemas que permitam a livre circulação de pessoas, bens e serviços entre fronteiras. A segunda está relacionada com as infra-estruturas deficitárias e a terceira é o facto de não existir uma suficiente diversificação industrial entre os países africanos. Ou seja, em muitos casos, os vizinhos produzem produtos similares e não existem grandes razões para que se estabeleçam relações comerciais entre eles. A solução passa, por isso, por fortalecer a competitividade das economias africanas num conjunto de várias indústrias. E, para ultrapassar este desafio, é necessária uma aposta na educação de excelência e no desenvolvimento de competências, nas reformas microeconómicas e numa gestão macroeconómica mais forte.
Percepção versus realidade
Quando se compara África a outras regiões (tanto desenvolvidas como emergentes), o continente africano é visto como pouco atractivo enquanto destino de investimento, comparável apenas aos antigos estados soviéticos. Todavia e de acordo com o relatório, as comparações negativas e generalistas de África com outras regiões acaba por mascarar uma visão esmagadoramente positiva entre aqueles que têm já uma presença de negócios no continente. E é essa distorção que o relatório também pretende demonstrar, especialmente porque os investidores potenciais da Europa são os que menos positivos se mostram relativamente à região. A título de exemplo, os investidores norte-americanos consideram África com mais potencial de atractividade do que o Médio Oriente e os asiáticos preferem-na aos antigos estados soviéticos e à América Central.
Os resultados do inquérito revelam ainda que as percepções negativas sobre África são, em primeiro lugar, relacionadas com os factores de risco político, citando a instabilidade do ambiente político, a corrupção e as fracas condições de segurança como os maiores obstáculos ao investimento.
Por outro lado, os números reflectem também uma ambivalência clara. Desde 2007, em particular, e mesmo contando com o impacto negativo da recessão económica global, existiu um forte crescimento no número de projectos de IDE em África (a uma taxa de crescimento perto dos 20%). A tendência manteve-se o ano passado, com o número de projectos muito próximo do pico de 2008 e com uma taxa de crescimento anual na ordem dos 27%. Mas e apesar de estas cifras reflectirem a resiliência e a atractividade crescente de África como um destino de investimento, ao mesmo tempo, o continente no seu todo só conseguiu atrair 5,5% dos projectos globais de IDE em 2011. E, apesar de tal representar um aumento sólido comparativamente aos 4,5% do ano anterior, e de ser, na verdade, a maior proporção de IDE global jamais investido no continente, não reflecte, de acordo com os autores, a sua verdadeira história de crescimento.
Sendo assim, por que motivo existe este abismo em termos de percepção relativa? Um dos factores principais é o gap de percepção existente entre as crenças históricas sobre o continente e a realidade positiva do seu crescimento ao longo da última década. E, como resultado, os investidores continuam a ter uma abordagem demasiado cautelosa quando pensam fazer negócios em áfrica. Assim, para os autores do estudo, é importante identificar e desmistificar os factores que mais contribuem para esta inibição:
África em democratização acelerada
A democratização do continente é bastante real, sendo os estados com um partido único uma excepção crescente e não a regra. A maioria dos países africanos já trilhou o seu caminho de transição para alguma forma de democracia participativa e este processo de liberalização política tem vindo a ser acompanhado por um declínio significativo nos conflitos armados em todo o continente.
Para contextualizar, se, em 1990, a maioria dos estados africanos eram definidos como “autocracias”, hoje apenas a Eritreia e a Suazilândia são classificados como tal. Em contraste, só no sudeste asiático, a mesma classificação assenta para a China, para a Coreia do Norte e para o Vietname.
Adicionalmente e de acordo com o Índice de Democracia 2011 publicado pela Economist Intelligence Unit, países africanos como Cabo Verde, as Maurícias e a África do Sul aparecem à frente de países desenvolvidos como a França e a Itália e bem destacados face a todos os BRIC e à grande maioria de mercados emergentes, incluindo a Argentina, a Colômbia, a indonésia, a Malásia, a Polónia, a Tailândia e a Turquia.
O desafio da corrupção
Em conjunto com a instabilidade política, a corrupção constitui um dos riscos mais comummente citados para (não) se fazer negócios em África. Não é possível escamotear a realidade de que a corrupção é um verdadeiro problema, sendo ela particularmente evidente em estados com ambientes políticos instáveis, como o Chade, o Sudão ou República Democrática do Congo, e naqueles que vivem uma maior dependência de uma única e facilmente controlada commodity, como é o caso de Angola e da Nigéria.
Mas a verdade é que de acordo com o mais recente ranking de “facilidade para fazer negócios” publicado pelo Banco Mundial, 14 países africanos posicionam-se, neste indicador, à frente da Rússia; 16 com melhores resultados do que o Brasil e 17 a terem uma nota superior à Índia. Por outro lado, e apesar de a corrupção continuar a ser um dos maiores desafios da região, de acordo com a Transparency International, e com o seu índice de percepção da corrupção, são 14 os países africanos que obtêm melhor classificação comparativamente à Índia e 35 relativamente à Rússia.
De forma similar, no índice de corrupção publicado pelo Fórum Económico Global, relativamente a 2010-2011, as comparações são ainda mais surpreendentes. Por exemplo, no item “pagamentos irregulares e subornos”, o Botswana, o Ruanda e Cabo Verde situam-se numa posição muito melhor do que os Estados Unidos e, para além de estes três países, também a Gâmbia, as Maurícias, a Namíbia e a África do Sul alcançam uma classificação melhor comparativamente ao Brasil e à China. Dezasseis países africanos – incluindo a Etiópia, Moçambique e o Zimbabué – estão á frente da Índia e um total de 19 bem acima da Rússia.
Facilidade crescente para fazer negócios em África
Tal como existem inúmeras pessoas que assumem automaticamente que África é a região mais instável e corrupta do planeta, existe um outro pressuposto automático que dita que o continente é, também, aquele que mais desafios encerra quando a ideia é fazer negócios. Existem, indubitavelmente, muitos desafios reais a ultrapassar. E, talvez o mais proeminente, seja a dimensão astronómica e a complexidade do continente, combinada com o relativo subdesenvolvimento de muitos dos seus países. É que apesar de África ser muitas vezes encarada como se fosse um único país é, como sabemos, um enorme continente com 54 estados soberanos, aos quais correspondem 54 diferentes e muitas vezes fragmentados conjuntos de regras, regulamentações, stakeholders e mercados.
Mas e mesmo assim, o relatório aponta para a crescente facilidade de se fazer negócios em muitas regiões africanas. E são também vários os mercados africanos que, comparativamente a outros mercados de rápido crescimento noutras regiões, se estão a comportar muitíssimo bem. Utilizando-se a pesquisa do Banco Mundial “Doing Business” como um dos principais indicadores desta tendência, são muitas as economias africanas que apresentam progressos substanciais. Entre as 30 economias que, a nível global, melhoraram o ambiente regulatório para os negócios, especialmente nos últimos cinco anos, um terço pertence à África subsaariana. E, durante esse mesmo período, 13 países africanos figuram no top 10 de “reformadores de negócios” do Banco Mundial. Em 2011, e com base na mesma pesquisa, 78% dos governos da África subsaariana - um número recorde – alteraram o seu ambiente económico regulatório para facilitar os negócios. Este tipo de progresso é traduzido num aumento constante de performance para muitos países africanos no ranking “Doing Business” do Banco Mundial.
E, já na edição correspondente a 2012, o mesmo ranking coloca oito países africanos à frente da China – o mais bem posicionado país entre os BRIC – 14 à frente da Rússia, 16 à frente do Brasil e 17 à frente da Índia. O mais bem posicionado país africano – as Maurícias – está à frente da Áustria, Bélgica, França, Holanda e Suíça. E a África do Sul, o país seguinte mais bem qualificado, situa-se acima da maioria dos mercados emergentes.
Guia de forças e fraquezas para os investidores
De uma forma geral, os incentivos para o investimento em África podem ser agrupados em quatro categorias: a procura de recursos, de mercados, de eficiência e de estratégia. Todos eles com pontos fortes e fracos. Seguem-se os principais
RECURSOS
No que respeita aos pontos fortes desta categoria, é sobejamente conhecida a riqueza em termos de recursos naturais do continente. Angola e Nigéria posicionam-se no top 20 dos maiores produtores de petróleo no mundo. E, por outro lado, dos 15 países com mais reservas petrolíferas, 11 são africanos. A África do sul, o Gana e a Tanzânia estão entre os 20 maiores produtores de ouro do mundo, e a República Democrática do Congo e a Zâmbia estão no top 20 dos produtores de cobre.
Força de trabalho alargada. Está previsto um crescimento da população em idade activa em África bastante superior ao dos países emergentes na Ásia ou na América Latina nos próximos 10 anos.
Custos laborais muito competitivos. É expectável que os custos laborais unitários se mantenham baixos na próxima década. Salários mais altos na China e na Índia irão abrir as portas a novas oportunidades por parte de outros mercados emergentes em África enquanto produtores de baixo custo.
Os desafios
Baixos níveis de educação. Na maioria dos países da África subsaariana, os níveis de educação são baixos, apesar de estarem a melhorar. Exemplos vindos da América Latina e da Ásia demonstram que os vastos progressos no sentido de se atingir os 100% em termos de educação no secundário podem ser alcançados em 25 anos.
Assegurar os benefícios do IDE para as comunidades. Na maioria das vezes, quando um país cresce depressa demais, a desigualdade acompanha esse crescimento e os países africanos têm de assegurar que os acordos no que respeita ao investimento directo estrangeiro beneficiam as suas comunidades.
MERCADO
Mercado de consumo alargado para certos produtos e serviços, como por exemplo telemóveis e serviços financeiros. Em Angola, no Senegal, na Nigéria e na Tanzânia, pelo menos metade da população possui um telemóvel, algo praticamente inexistente há uma década. Prevê-se um crescimento significativo contínuo destes números.
Grande potencial para o turismo. O sector do turismo já é responsável por mais de 20% das receitas de exportação em muitos países africanos, incluindo a Etiópia, o Egipto e a Tanzânia, e são muitos os países com enorme potencial para explorar este sector com investimento apropriado.
Os desafios
Dimensão do mercado. A maioria das economias de África é demasiado pequena comparativamente a países localizados em outras regiões do mundo, sendo o mercado subsaariano muito fragmentado.
PIB per capita. Muitos dos países de elevado crescimento na África subsaariana, como o Gana, a Nigéria, e a Etiópia possuem ainda rendimentos per capita muito baixos comparados com países emergentes de outras regiões, apesar de estarem a gozar de um elevado crescimento nos últimos anos. O que é em parte devido à elevada desigualdade existente em muitos destes países.
Aumento dos gastos dos consumidores. Apesar de a base de consumidores em África ser extensa, os rendimentos actuais são baixos, o que irá limitar a dimensão do mercado para a venda de produtos de consumo no início, mas com bastante potencial para um crescimento no futuro.
EFICIÊNCIA
Proximidade e laços históricos, culturais e linguísticos com a União Europeia. Em 2011, mais de 50% das exportações dos Camarões, Moçambique, Marrocos e Tunísia teve como destino a zona euro. O norte de África possui uma proximidade particularmente importante com a Europa, em conjunto com boas ligações comerciais com este continente. Até 2020, espera-se que as exportações da Europa para África e Médio Oriente sejam 50% superiores às exportações para os Estados Unidos.
Fusos horários semelhantes aos da Ásia, Estados Unidos e Europa. África partilha partes dos seus dias de trabalho com a Ásia, os EUA e a UE.
Os desafios
Infra-estruturas. As redes de transportes e de telecomunicações são ainda pouco desenvolvidas relativamente a outras regiões emergentes como a Ásia e a América Latina. Todavia, os progressos afiguram-se contínuos.
Facilidade em fazer negócios. Muitos países da África subsaariana posicionam-se abaixo da Ásia e da América Latina no índice “Doing Business” do Banco Mundial. Contudo, o relatório revelou que 36 em 46 governos melhoraram o seu ambiente económico regulatório para os negócios domésticos em 2010-11, um número recorde desde 2005.
MOTIVOS ESTRATÉGICOS
As previsões apontam para um crescimento mais rápido de África nos próximos cinco anos, relativamente à média mundial.
Os desafios
Estabilidade política e Democracia. No curto prazo, a estabilidade política consiste na principal preocupação para o Médio Oriente e para o norte de África. A médio e longo prazo, fortalecer as fundações da democracia e melhorar o ambiente para os negócios deverá ajudar a estimular do potencial de crescimento num número significativo de países da África subsaariana.
Para ler o artigo na íntegra clique aqui
O provérbio é africano e “abre” a segunda edição do estudo “Building Bridges – 2012 Atractiveness Survey Africa” realizado pela consultora Ernst & Young sobre o crescimento de África, com especial enfoque para o investimento directo estrangeiro no continente. De acordo com o relatório, Portugal foi o país que mais projectos realizou em Angola (v.caixa), no período entre 2003 e 2011, seguido dos EUA, Reino Unido, Espanha e África do Sul. Em 2011, o número de projectos de investimento em África teve um aumento de 27% face a 2010 e de 153% em termos absolutos desde 2003.
O VER resume o essencial do estudo, com especial atenção não só para as actuais forças, mas também para os principais desafios que o continente tem ainda de enfrentar.
A narrativa africana emergente
As reformas políticas, económicas e regulatórias – um processo que teve início na década de 1990 – continuam a moldar o continente. Os conflitos armados foram significativamente reduzidos, proporcionando a estabilidade relativa exigida para o crescimento económico e para o desenvolvimento. A inflação está a ser controlada, bem como a dívida estrangeira e os défices orçamentais. A abertura à privatização e o fortalecimento dos sistemas legais e regulatórios têm sido reais e são muitas as economias africanas que abriram portas ao comércio internacional.
Estas mudanças estruturais ajudaram a revigorar os mercados e o comércio, criando um ambiente que, de forma crescente, está a atrair novos negócios e investimentos. Com as reformas alargadas em conjunto com melhorias significativas na governança política e, especialmente, com a explosão das commodities, o nível de rendimento disponível aumentou, bem como a urbanização e um sector de serviços em rápido desenvolvimento tem vindo a contribuir para o que os autores do relatório apelidam de “caminho de crescimento sustentável” em África.
Todavia, subsistem ainda algumas barreiras internas ao crescimento, nomeadamente as que impedem o livre comércio intra-regional. Todavia e neste momento, os olhos estão virados para 2014, ano em que se espera que 26 países africanos, com uma população combinada de 600 milhões de pessoas e um PIB de aproximadamente um bilião de dólares se unam numa área comum de comércio livre. Adicionalmente, foram identificadas três outras barreiras importantes que inibem o comércio intra-regional. A primeira consiste na ausência de integração de sistemas que permitam a livre circulação de pessoas, bens e serviços entre fronteiras. A segunda está relacionada com as infra-estruturas deficitárias e a terceira é o facto de não existir uma suficiente diversificação industrial entre os países africanos. Ou seja, em muitos casos, os vizinhos produzem produtos similares e não existem grandes razões para que se estabeleçam relações comerciais entre eles. A solução passa, por isso, por fortalecer a competitividade das economias africanas num conjunto de várias indústrias. E, para ultrapassar este desafio, é necessária uma aposta na educação de excelência e no desenvolvimento de competências, nas reformas microeconómicas e numa gestão macroeconómica mais forte.
Percepção versus realidade
Quando se compara África a outras regiões (tanto desenvolvidas como emergentes), o continente africano é visto como pouco atractivo enquanto destino de investimento, comparável apenas aos antigos estados soviéticos. Todavia e de acordo com o relatório, as comparações negativas e generalistas de África com outras regiões acaba por mascarar uma visão esmagadoramente positiva entre aqueles que têm já uma presença de negócios no continente. E é essa distorção que o relatório também pretende demonstrar, especialmente porque os investidores potenciais da Europa são os que menos positivos se mostram relativamente à região. A título de exemplo, os investidores norte-americanos consideram África com mais potencial de atractividade do que o Médio Oriente e os asiáticos preferem-na aos antigos estados soviéticos e à América Central.
Os resultados do inquérito revelam ainda que as percepções negativas sobre África são, em primeiro lugar, relacionadas com os factores de risco político, citando a instabilidade do ambiente político, a corrupção e as fracas condições de segurança como os maiores obstáculos ao investimento.
Por outro lado, os números reflectem também uma ambivalência clara. Desde 2007, em particular, e mesmo contando com o impacto negativo da recessão económica global, existiu um forte crescimento no número de projectos de IDE em África (a uma taxa de crescimento perto dos 20%). A tendência manteve-se o ano passado, com o número de projectos muito próximo do pico de 2008 e com uma taxa de crescimento anual na ordem dos 27%. Mas e apesar de estas cifras reflectirem a resiliência e a atractividade crescente de África como um destino de investimento, ao mesmo tempo, o continente no seu todo só conseguiu atrair 5,5% dos projectos globais de IDE em 2011. E, apesar de tal representar um aumento sólido comparativamente aos 4,5% do ano anterior, e de ser, na verdade, a maior proporção de IDE global jamais investido no continente, não reflecte, de acordo com os autores, a sua verdadeira história de crescimento.
Sendo assim, por que motivo existe este abismo em termos de percepção relativa? Um dos factores principais é o gap de percepção existente entre as crenças históricas sobre o continente e a realidade positiva do seu crescimento ao longo da última década. E, como resultado, os investidores continuam a ter uma abordagem demasiado cautelosa quando pensam fazer negócios em áfrica. Assim, para os autores do estudo, é importante identificar e desmistificar os factores que mais contribuem para esta inibição:
África em democratização acelerada
A democratização do continente é bastante real, sendo os estados com um partido único uma excepção crescente e não a regra. A maioria dos países africanos já trilhou o seu caminho de transição para alguma forma de democracia participativa e este processo de liberalização política tem vindo a ser acompanhado por um declínio significativo nos conflitos armados em todo o continente.
Para contextualizar, se, em 1990, a maioria dos estados africanos eram definidos como “autocracias”, hoje apenas a Eritreia e a Suazilândia são classificados como tal. Em contraste, só no sudeste asiático, a mesma classificação assenta para a China, para a Coreia do Norte e para o Vietname.
Adicionalmente e de acordo com o Índice de Democracia 2011 publicado pela Economist Intelligence Unit, países africanos como Cabo Verde, as Maurícias e a África do Sul aparecem à frente de países desenvolvidos como a França e a Itália e bem destacados face a todos os BRIC e à grande maioria de mercados emergentes, incluindo a Argentina, a Colômbia, a indonésia, a Malásia, a Polónia, a Tailândia e a Turquia.
O desafio da corrupção
Em conjunto com a instabilidade política, a corrupção constitui um dos riscos mais comummente citados para (não) se fazer negócios em África. Não é possível escamotear a realidade de que a corrupção é um verdadeiro problema, sendo ela particularmente evidente em estados com ambientes políticos instáveis, como o Chade, o Sudão ou República Democrática do Congo, e naqueles que vivem uma maior dependência de uma única e facilmente controlada commodity, como é o caso de Angola e da Nigéria.
Mas a verdade é que de acordo com o mais recente ranking de “facilidade para fazer negócios” publicado pelo Banco Mundial, 14 países africanos posicionam-se, neste indicador, à frente da Rússia; 16 com melhores resultados do que o Brasil e 17 a terem uma nota superior à Índia. Por outro lado, e apesar de a corrupção continuar a ser um dos maiores desafios da região, de acordo com a Transparency International, e com o seu índice de percepção da corrupção, são 14 os países africanos que obtêm melhor classificação comparativamente à Índia e 35 relativamente à Rússia.
De forma similar, no índice de corrupção publicado pelo Fórum Económico Global, relativamente a 2010-2011, as comparações são ainda mais surpreendentes. Por exemplo, no item “pagamentos irregulares e subornos”, o Botswana, o Ruanda e Cabo Verde situam-se numa posição muito melhor do que os Estados Unidos e, para além de estes três países, também a Gâmbia, as Maurícias, a Namíbia e a África do Sul alcançam uma classificação melhor comparativamente ao Brasil e à China. Dezasseis países africanos – incluindo a Etiópia, Moçambique e o Zimbabué – estão á frente da Índia e um total de 19 bem acima da Rússia.
Facilidade crescente para fazer negócios em África
Tal como existem inúmeras pessoas que assumem automaticamente que África é a região mais instável e corrupta do planeta, existe um outro pressuposto automático que dita que o continente é, também, aquele que mais desafios encerra quando a ideia é fazer negócios. Existem, indubitavelmente, muitos desafios reais a ultrapassar. E, talvez o mais proeminente, seja a dimensão astronómica e a complexidade do continente, combinada com o relativo subdesenvolvimento de muitos dos seus países. É que apesar de África ser muitas vezes encarada como se fosse um único país é, como sabemos, um enorme continente com 54 estados soberanos, aos quais correspondem 54 diferentes e muitas vezes fragmentados conjuntos de regras, regulamentações, stakeholders e mercados.
Mas e mesmo assim, o relatório aponta para a crescente facilidade de se fazer negócios em muitas regiões africanas. E são também vários os mercados africanos que, comparativamente a outros mercados de rápido crescimento noutras regiões, se estão a comportar muitíssimo bem. Utilizando-se a pesquisa do Banco Mundial “Doing Business” como um dos principais indicadores desta tendência, são muitas as economias africanas que apresentam progressos substanciais. Entre as 30 economias que, a nível global, melhoraram o ambiente regulatório para os negócios, especialmente nos últimos cinco anos, um terço pertence à África subsaariana. E, durante esse mesmo período, 13 países africanos figuram no top 10 de “reformadores de negócios” do Banco Mundial. Em 2011, e com base na mesma pesquisa, 78% dos governos da África subsaariana - um número recorde – alteraram o seu ambiente económico regulatório para facilitar os negócios. Este tipo de progresso é traduzido num aumento constante de performance para muitos países africanos no ranking “Doing Business” do Banco Mundial.
E, já na edição correspondente a 2012, o mesmo ranking coloca oito países africanos à frente da China – o mais bem posicionado país entre os BRIC – 14 à frente da Rússia, 16 à frente do Brasil e 17 à frente da Índia. O mais bem posicionado país africano – as Maurícias – está à frente da Áustria, Bélgica, França, Holanda e Suíça. E a África do Sul, o país seguinte mais bem qualificado, situa-se acima da maioria dos mercados emergentes.
Guia de forças e fraquezas para os investidores
De uma forma geral, os incentivos para o investimento em África podem ser agrupados em quatro categorias: a procura de recursos, de mercados, de eficiência e de estratégia. Todos eles com pontos fortes e fracos. Seguem-se os principais
RECURSOS
No que respeita aos pontos fortes desta categoria, é sobejamente conhecida a riqueza em termos de recursos naturais do continente. Angola e Nigéria posicionam-se no top 20 dos maiores produtores de petróleo no mundo. E, por outro lado, dos 15 países com mais reservas petrolíferas, 11 são africanos. A África do sul, o Gana e a Tanzânia estão entre os 20 maiores produtores de ouro do mundo, e a República Democrática do Congo e a Zâmbia estão no top 20 dos produtores de cobre.
Força de trabalho alargada. Está previsto um crescimento da população em idade activa em África bastante superior ao dos países emergentes na Ásia ou na América Latina nos próximos 10 anos.
Custos laborais muito competitivos. É expectável que os custos laborais unitários se mantenham baixos na próxima década. Salários mais altos na China e na Índia irão abrir as portas a novas oportunidades por parte de outros mercados emergentes em África enquanto produtores de baixo custo.
Os desafios
Baixos níveis de educação. Na maioria dos países da África subsaariana, os níveis de educação são baixos, apesar de estarem a melhorar. Exemplos vindos da América Latina e da Ásia demonstram que os vastos progressos no sentido de se atingir os 100% em termos de educação no secundário podem ser alcançados em 25 anos.
Assegurar os benefícios do IDE para as comunidades. Na maioria das vezes, quando um país cresce depressa demais, a desigualdade acompanha esse crescimento e os países africanos têm de assegurar que os acordos no que respeita ao investimento directo estrangeiro beneficiam as suas comunidades.
MERCADO
Mercado de consumo alargado para certos produtos e serviços, como por exemplo telemóveis e serviços financeiros. Em Angola, no Senegal, na Nigéria e na Tanzânia, pelo menos metade da população possui um telemóvel, algo praticamente inexistente há uma década. Prevê-se um crescimento significativo contínuo destes números.
Grande potencial para o turismo. O sector do turismo já é responsável por mais de 20% das receitas de exportação em muitos países africanos, incluindo a Etiópia, o Egipto e a Tanzânia, e são muitos os países com enorme potencial para explorar este sector com investimento apropriado.
Os desafios
Dimensão do mercado. A maioria das economias de África é demasiado pequena comparativamente a países localizados em outras regiões do mundo, sendo o mercado subsaariano muito fragmentado.
PIB per capita. Muitos dos países de elevado crescimento na África subsaariana, como o Gana, a Nigéria, e a Etiópia possuem ainda rendimentos per capita muito baixos comparados com países emergentes de outras regiões, apesar de estarem a gozar de um elevado crescimento nos últimos anos. O que é em parte devido à elevada desigualdade existente em muitos destes países.
Aumento dos gastos dos consumidores. Apesar de a base de consumidores em África ser extensa, os rendimentos actuais são baixos, o que irá limitar a dimensão do mercado para a venda de produtos de consumo no início, mas com bastante potencial para um crescimento no futuro.
EFICIÊNCIA
Proximidade e laços históricos, culturais e linguísticos com a União Europeia. Em 2011, mais de 50% das exportações dos Camarões, Moçambique, Marrocos e Tunísia teve como destino a zona euro. O norte de África possui uma proximidade particularmente importante com a Europa, em conjunto com boas ligações comerciais com este continente. Até 2020, espera-se que as exportações da Europa para África e Médio Oriente sejam 50% superiores às exportações para os Estados Unidos.
Fusos horários semelhantes aos da Ásia, Estados Unidos e Europa. África partilha partes dos seus dias de trabalho com a Ásia, os EUA e a UE.
Os desafios
Infra-estruturas. As redes de transportes e de telecomunicações são ainda pouco desenvolvidas relativamente a outras regiões emergentes como a Ásia e a América Latina. Todavia, os progressos afiguram-se contínuos.
Facilidade em fazer negócios. Muitos países da África subsaariana posicionam-se abaixo da Ásia e da América Latina no índice “Doing Business” do Banco Mundial. Contudo, o relatório revelou que 36 em 46 governos melhoraram o seu ambiente económico regulatório para os negócios domésticos em 2010-11, um número recorde desde 2005.
MOTIVOS ESTRATÉGICOS
As previsões apontam para um crescimento mais rápido de África nos próximos cinco anos, relativamente à média mundial.
Os desafios
Estabilidade política e Democracia. No curto prazo, a estabilidade política consiste na principal preocupação para o Médio Oriente e para o norte de África. A médio e longo prazo, fortalecer as fundações da democracia e melhorar o ambiente para os negócios deverá ajudar a estimular do potencial de crescimento num número significativo de países da África subsaariana.
Para ler o artigo na íntegra clique aqui