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O tempo novo

Cá dentro, muita coisa se joga na banca. Há ou não o “banco mau”, o veículo pretendido pelos Costa, António e Carlos, que poderia resolver boa parte do monumental problema do malparado português? Também aqui, boa parte da resposta virá da Comissão Europeia e do BCE.

Bruno Simão
30 de Maio de 2016 às 22:14
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Vive-se um tempo novo neste ano de 2016. Novo cá dentro, com a primeira experiência de um Governo socialista apoiado pelos partidos mais extremados do quadro à esquerda. E novo também lá fora, porque todas as reformas económicas, mas sobretudo políticas e até filosóficas desta Europa desgovernada, ficaram por fazer, semeando ao longo dos tempos a discórdia e os problemas que, mais cedo ou mais tarde, teremos de enfrentar. Uma e outra, as frentes interna e externa jogam entre si, interferem mutuamente, em certas áreas pode ser até do interesse nacional alguma desarmonia europeia. Já lá vamos. 

No 13.º aniversário do Jornal de Negócios, que tem nas suas mãos, no ecrã do seu computador ou no seu telemóvel, colocámos um desafio a uma série de decisores do panorama político, empresarial e financeiro. O 13, número místico, presta-se a todo o tipo de interpretações. Às de azar, mas também às de sorte. Foi com base nesse conceito que lançámos a questão que ocupa as páginas seguintes deste jornal: "O que é que Portugal tem de fazer para não depender da sorte?"

Cada um dos nossos convidados, à sua maneira e consoante a sua área de especialidade, partilham consigo, caro leitor, os seus pensamentos sobre o que precisamos de fazer, enquanto país, para não estarmos ao sabor da sorte, da qual dependem os incautos que não queremos ser.

Seguindo o número 13, decidimos olhar mais perto, não a 13 anos, mas para os próximos 13 meses. Olhar o que aí está e procurar perceber o que aí vem é um desafio difícil, mesmo quando falamos de pouco mais de um ano. É tamanho o que temos pela frente que não é fácil, mesmo do camarote, pegar nas peças e fechar um puzzle completo, coerente e, sobretudo, que nos descanse quanto ao rumo de curto prazo de um país ainda a lamber as feridas da austeridade. E que dela ainda necessita, mesmo que em doses diferentes.

Na frente interna, agora que passam seis meses desde a formação de tão original Governo, pode dizer-se que a geringonça saiu melhor do que a encomenda. Na verdade, tornaram-se claras (e até naturais) as premissas que seguram este acordo. O Executivo é do PS, o apoio parlamentar ao Governo está dependente das linhas vermelhas traçadas com PCP, Bloco e Verdes. E o resto (a Europa, por exemplo) fica de fora, entregue ao engenho táctico e à arte política de António Costa. Tão simples quanto isto, aparentemente tão fácil quanto fazer uma vaca voar.

Até aqui, o líder do PS tem sido capaz de manter e justificar esta aliança, até beneficiando da posição ensimesmada do maior partido da oposição, que tarda em encontrar um rumo que não passe exclusivamente pela cartilha que colocou coerentemente em prática quando esteve no poder. Pedro Passos Coelho poderia (poderá) ter toda a razão do mundo, mas não consegue lidar eficazmente com o facto de, cada vez que fala, lembrar a todos os portugueses os dias que estes querem desesperadamente esquecer. Injustiça? Talvez, mas a política também é feita disso.

O primeiro grande teste à aliança de esquerda promete chegar neste Verão quente, e virá de fora, com a União Europeia a ter os dados na mão. Teremos sanções por falhar o défice? Seremos forçados a um plano B que, necessariamente, terá de trazer austeridade, nem que seja "apenas" na forma costumeira de mais impostos? Daquilo que a Europa nos impuser, e do que António Costa aceitar, dependerá o futuro de curto prazo da convivência à esquerda. E aqui, os problemas da Europa até nos podem dar uma ajuda.

Tal como as sanções a Portugal e Espanha ficaram como ameaça na gaveta devido à indefinição política no país vizinho, também o "Brexit", o referendo inglês à permanência na União Europeia, nos pode indirectamente ajudar. Com tanto em jogo, será que a Europa pretende abrir mais uma frente de fractura interna, colocando mais carga a um país que, dentro de uma flexibilidade própria de um quadro negocial, quer continuar a cumprir com as regras orçamentais? Por mais "research" que se produzam, ninguém sabe muito bem as consequências de uma saída da Grã-Bretanha do Euro. Um dos 13 do próximo ano, sem margem para dúvidas.

Cá dentro, muita coisa se joga na banca. Há ou não o "banco mau", o veículo pretendido pelos Costa, António e Carlos, que poderia resolver boa parte do monumental problema do malparado português? Também aqui, boa parte da resposta virá da Comissão Europeia e do BCE, e das excepções que estejam dispostos a conceder-nos. Mas, banco a banco, somam-se os dossiês bicudos. A Caixa Geral de Depósitos já tem novo presidente, mas ainda não tem uma administração. E, sobretudo, tem uma necessidade de capital que pode rondar os quatro mil milhões de euros, com impacto nas contas públicas e que será necessário negociar... com Bruxelas, novamente.

Depois há todo o dossiê Novo Banco. Uma venda, uma boa venda, é absolutamente essencial. No entanto, não só o prazo está a apertar como há nuvens no horizonte. A incerteza nos mercados (o "Brexit", por exemplo) não ajuda e pode servir de desculpa para novo adiamento; enquanto a incerteza jurídica que ainda subsiste acerca das obrigações seniores pode afastar potenciais interessados. Uma coisa é certa: com ou sem venda, Eduardo Stock da Cunha está de regresso a Londres e ao seu Lloyd’s. Se tudo falhar, novo problema para os Costa, sobretudo Carlos, que já falhou uma vez neste capítulo.

No BPI, os próximos meses são também de definição, num problema que se tornou nacional com a intervenção do primeiro-ministro e do seu negociador de confiança. Os prazos apontam a OPA para o início do Outono, mas a eventual oposição dos reguladores – nomeadamente o Banco Nacional de Angola – poderia deitar tudo por terra.

No meio deste rebuliço, o BCP vê a oportunidade de casar com o Novo Banco e procurar afirmar-se como o grande banco privado nacional. Não será fácil.

A nível económico, precisamos de mais indicadores fiáveis sobre a evolução do país. O crescimento teima em não arrancar, o desemprego em não soçobrar. Teremos necessidade de um Orçamento Rectificativo? E o que trará? A nível de contas públicas, mais uma vez, são os impostos indirectos quem vai segurando o défice sob controlo, enquanto a despesa sobe – fruto do cumprimento de promessas eleitorais e acordo com os partidos mais à esquerda. Até quando? Até ser possível, e não é claro onde está o limite.

No campo das exportações, se Espanha está pujante e a dar uma preciosa ajuda, Brasil e Angola vivem tempos conturbados. Sobretudo esta última, com o FMI de bilhete confirmado. Se a crise do petróleo se prolongar, não é apenas com as exportações para Angola que devemos estar preocupados. Devemos pensar se temos a capacidade para reabsorver os novos "retornados", os expatriados que, cada vez em maior número, regressam a Portugal. Que efeitos no mercado de trabalho? Ninguém sabe.

Na frente política, é obrigatório acompanhar o evoluir da relação Marcelo/Costa, depois do enlevo da "lua-de-mel" que parece ter entrado numa nova fase. Quando o Presidente "deixa cair", inocentemente, a questão das autárquicas do próximo ano, está a mandar duas mensagens. Uma para o PS, assegurando que não será factor de desestabilização até lá, esperando ver resultados; e outra para o PSD, que terá de ter a cabeça arrumada até ao início do Outono de 2017, para que possa tirar partido, ou as devidas consequências, dos resultados dessas eleições. Marcelo, que sonha com os consensos que sabe decisivos para que o país ultrapasse, de vez, velhos constrangimentos, também sabe que com Costa e Passos não há sorte a dois. Mas não é fácil que um deles caia em tempo útil. Sobretudo se houver pressa.

Como vemos, o caderno de encargos que nos espera, enquanto país, não é modesto. Há mais questões do que respostas, dúvidas do que certezas. Vivemos tempos apaixonantes, e é dessa forma que os devemos enfrentar, com paixão, interesse e controlo mediático e de cidadania.

É o que nós, Jornal de Negócios, faremos, e fizemos ao longo dos últimos 13 anos. Pensando nos temas, ajudando os nossos leitores a fazer o mesmo. Começamos por esta edição, construída nas sugestões dos nossos convidados, para que o país possa, de uma vez por todas, deixar de depender da sorte. Não estamos lá ainda, é certo. Mas, se todos quiserem, ficaremos mais perto. Podem contar connosco.
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