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Lisboa: Deambulações de um fotógrafo por uma cidade em estado de emergência

No dia a seguir ao primeiro-ministro ter decretado o estado de emergência, mal houve uma aberta no tempo, peguei na máquina e fui registar o momento. Encontrei a minha cidade triste e sem alma, capturada por um silêncio assustador.

22 de Março de 2020 às 17:36
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No dia a seguir ao primeiro-ministro ter decretado o estado de emergência, mal houve uma aberta no tempo, peguei na máquina e fui registar o momento. Encontrei a minha cidade triste e sem alma, capturada por um silêncio assustador.

 

Após ter passado pelo Jardim das Amoreiras, andei pela Avenida D. Carlos I e as poucas pessoas que encontrava estavam a ir à farmácia ou a trabalhar, como os carteiros.

 

Durante o percurso, a única pessoa que me dirigiu a palavra foi um traficante de droga que me perguntou se eu queria alguma coisa, pergunta natural para quem anda com uma máquina fotográfica na zona do Cais do Sodré ou da Baixa. Até usava máscara e luvas…

 

Continuei a minha caminhada, a fotografar o vazio em que estava esta cidade. Falei com dois polícias municipais e perguntei como estavam a correr as coisas até àquela hora. Responderam que as pessoas estavam a acatar bem as medidas e tinham ficado em casa, os mais difíceis eram os idosos. Ainda há pouco tinham abordado um senhor já de certa idade, perguntaram-lhe o que andava a fazer na rua e ele respondeu que andava a passear, que já nada lhe fazia mal, que tinha estado na guerra e tinha voltado…

 

Um pouco mais à frente, ao fotografar uma pizzaria, o dono perguntou-me se havia algo de errado. Respondi-lhe que a única coisa que via de errado ali era a falta de pessoas. Depois estivemos uns bons minutos à conversa, quis até oferecer-me uma fatia de piza. Como não aceitei, ofereceu-me um café. Disse-me que já tinha mandado para casa a maior parte dos trabalhadores, ficando apenas com três, e que ia tentar dar vazão aos alimentos que tinha através das redes sociais, com o serviço take-away. Ainda acrescentou que estava otimista, que daqui a duas semanas tudo voltaria à normalidade, embora lentamente.

 

Confessei-lhe que, mesmo sendo eu um otimista irritante (é o que diz a minha querida mulher), achava pouco provável que isso acontecesse em tão pouco tempo. Entretanto, já estava a ficar tarde e tinha de regressar ao jornal para continuar a editar apesar de, mesmo num dia triste como este, só me apetecer continuar a fotografar até deixar de haver luz.

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