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China tem o desafio de convencer o mundo a confiar nas suas vacinas
Apesar de ter na terceira fase de estágio diversas vacinas, a China necessita de convencer o mundo da eficácia das suas soluções.
02 de Janeiro de 2021 às 20:00
De todos os países em desenvolvimento que testam as vacinas contra a Covid-19 da China, poucos têm relações mais amigáveis com o governo de Pequim do que o Paquistão. Nos anos que antecederam a pandemia, a China financiou em cerca de 70 mil milhões de dólares as estradas e os caminhos ferroviários do país situado no sul da Ásia. O Paquistão tem agora dois ensaios clínicos chineses em andamento, sendo que até mesmo autoridades do governo já foram vacinadas.
No entanto, segundo foi apurado através de entrevistas à população de Karachi - a maior cidade do Paquistão - e às populações de outros países em desenvolvimento, tais como a Indonésia e o Brasil, a China ainda não conseguiu convencer milhões de pessoas de que podem depender das suas vacinas.
"Eu não vou tomar a vacina chinesa", disse Farman Ali Shah, trabalhador de uma espécie de Uber em Karachi, enquanto as lojas locais fechavam antes do toque de recolher às 20 horas por causa da pandemia. "Não confio", salienta ainda Shah.
Esta desconfiança e, simultaneamente, a dependência de dezenas de países mais pobres para com a China, por quererem imunizar as suas populações, pode criar um cenário pouco positivo a nível político, caso os cidadãos que recebam a vacina chinesa a vejam como um produto inferior aos existentes no mercado.
Em resposta às perguntas da Bloomberg, o Ministério de Relações Exteriores da China disse que as empresas chinesas que desenvolvem vacinas cumprem rigorosamente a lei e que os ensaios clínicos nas duas primeiras fases demonstraram que as vacinas eram seguras e eficazes. O governo chinês administrou mais de um milhão de doses de vacinas de emergência no mês de julho, garantiu que "não encontramos nenhuma reação adversa grave".
O porta-voz do Ministério de Relações Exteriores, Zhao Lijian, disse na segunda-feira (dia 29 de dezembro) que as vacinas chinesas podem ser a "única escolha" para os governos que não garantiram o fornecimento, uma vez que "países ricos" reservaram três quartos dos estimados 12 mil milhões de vacinas a serem produzidas no próximo ano.
Do lado da China está a matemática. O desafio de fabricar, distribuir e administrar mil milhões de doses significa que muitos países em desenvolvimento podem ter pouca escolha a não ser usar vacinas chinesas para pelo menos parte de suas populações. Muitos não têm instalações suficientes para armazenar a vacina da Pfizer, que precisa ser refrigerada a -70 graus Celsius.
Ironicamente, as fabricantes chinesas de vacinas estiveram inicialmente na liderança da procura por uma vacina contra a covid-19, mas o rápido controlo da propagação do vírus na China dificultou a a realização de ensaios clínicos de terceira fase, enquanto os rivais norte-americanos avançavam. As empresas chinesas realizam agora os últimos testes em pelo menos 16 países, com estudos da China National Biotec Group (CNBG) desde a Argentina a Marrocos; da Sinovac Biotech no Brasil, Turquia e Filipinas e ensaios da CanSino Biologics no Paquistão, México e Arábia Saudita.
Representantes do Instituto Butantan, que coopera na condução dos ensaios clínicos para a vacina da Sinovac, revelaram no dia 23 de dezembro que a solução chinesa apresentou uma eficácia acima de 50%, o que atende ao padrão mínimo estabelecido pelos reguladores dos EUA para autorização emergencial de vacinas contra a Covid-19. O instituto não forneceu mais detalhes, citando o pedido de Sinovac para reconciliar dados de diferentes ensaios.
Foram poucos os lugares em que a questão se tornou tão politizada como no Brasil, o terceiro país do mundo com mais casos, depois dos Estados Unidos e da Índia.
Uma pesquisa realizada pelo Datafolha no início do mês de dezembro demonstrou que metade dos brasileiros afirmam que não tomariam a vacina da Sinovac-Butantan, a maior taxa de rejeição entre todas as vacinas. Cerca de 36% dos entrevistados disseram que também rejeitariam uma vacina russa, enquanto 23% disseram que não tomariam uma solução proveniente dos EUA.
Natalia Pasternak Taschner, microbiologista e fundadora do Instituto Questão de Ciência, afirma que a Anvisa vai avaliar os dados quanto à eficácia e segurança, mas destacou que isso precisa de ser bem comunicado à população. Segundo Taschner, é um grande desafio fazer isso quando o presidente e o governo federal são os que levantam mais dúvidas quanto à produção da vacina chinesa.
A China também pode estar a super estimar a sua capacidade de vacinar simultaneamente a sua própria população de 1,4 mil milhões e outras nações bastante populosas, disse Huang, do Conselho de Relações Exteriores, num Congresso nos EUA.
A CNBG disse ser capaz de produzir mil milhões de doses das suas vacinas inativadas, enquanto a Sinovac pode produzir 600 milhões de doses, com base nas unidades existentes e nas que serão concluídas em breve. A CanSino garantiu que poderia produzir de 200 milhões a 300 milhões de doses das suas vacinas.
No entanto, segundo foi apurado através de entrevistas à população de Karachi - a maior cidade do Paquistão - e às populações de outros países em desenvolvimento, tais como a Indonésia e o Brasil, a China ainda não conseguiu convencer milhões de pessoas de que podem depender das suas vacinas.
"Eu não vou tomar a vacina chinesa", disse Farman Ali Shah, trabalhador de uma espécie de Uber em Karachi, enquanto as lojas locais fechavam antes do toque de recolher às 20 horas por causa da pandemia. "Não confio", salienta ainda Shah.
Esta desconfiança e, simultaneamente, a dependência de dezenas de países mais pobres para com a China, por quererem imunizar as suas populações, pode criar um cenário pouco positivo a nível político, caso os cidadãos que recebam a vacina chinesa a vejam como um produto inferior aos existentes no mercado.
As vacinas da China procuravam assinalar uma vitória diplomática para o governo de Pequim, estreitando os laços existentes entre a potência asiática e as dezenas de países mais pobres e evitando a escassez de soluções farmacêuticas para o Oriente. Contudo, existe pouca informação quanto às vacinas chinesas e aos seus ensaios clínicos finais, sendo que somente os Emirates Árabes Unidos e a China aprovaram, para uso de emergência, a administração da vacina. Por outro lado, empresas europeias e norte-americanas publicam dados que garantem a segurança e eficácia das suas soluções farmacêuticas e iniciam as suas campanhas de vacinação.
"A China tem uma grande oportunidade de fazer história com as suas vacinas e distribuir um produto que salve vidas", disse Jorge Guajardo, atual diretor da McLarty Associates e antigo embaixador do México na China durante um período de seis anos. "Na minha experiência, cada vez que eles se envolvem em diplomacia, estragam tudo - conseguem dececionar os países que recebem a sua ajuda", realça ainda Guajardo.
Em resposta às perguntas da Bloomberg, o Ministério de Relações Exteriores da China disse que as empresas chinesas que desenvolvem vacinas cumprem rigorosamente a lei e que os ensaios clínicos nas duas primeiras fases demonstraram que as vacinas eram seguras e eficazes. O governo chinês administrou mais de um milhão de doses de vacinas de emergência no mês de julho, garantiu que "não encontramos nenhuma reação adversa grave".
Do lado da China está a matemática. O desafio de fabricar, distribuir e administrar mil milhões de doses significa que muitos países em desenvolvimento podem ter pouca escolha a não ser usar vacinas chinesas para pelo menos parte de suas populações. Muitos não têm instalações suficientes para armazenar a vacina da Pfizer, que precisa ser refrigerada a -70 graus Celsius.
Ironicamente, as fabricantes chinesas de vacinas estiveram inicialmente na liderança da procura por uma vacina contra a covid-19, mas o rápido controlo da propagação do vírus na China dificultou a a realização de ensaios clínicos de terceira fase, enquanto os rivais norte-americanos avançavam. As empresas chinesas realizam agora os últimos testes em pelo menos 16 países, com estudos da China National Biotec Group (CNBG) desde a Argentina a Marrocos; da Sinovac Biotech no Brasil, Turquia e Filipinas e ensaios da CanSino Biologics no Paquistão, México e Arábia Saudita.
Representantes do Instituto Butantan, que coopera na condução dos ensaios clínicos para a vacina da Sinovac, revelaram no dia 23 de dezembro que a solução chinesa apresentou uma eficácia acima de 50%, o que atende ao padrão mínimo estabelecido pelos reguladores dos EUA para autorização emergencial de vacinas contra a Covid-19. O instituto não forneceu mais detalhes, citando o pedido de Sinovac para reconciliar dados de diferentes ensaios.
O ensaio no Brasil é o maior da Sinovac até agora, com cerca de 13 mil participantes. Um ensaio na Turquia indicou que a vacina mostrou eficácia de 91%, embora seja considerado inconclusivo, pois teve como base apenas 29 casos, em comparação com os 170 identificados no Brasil. As vacinas da Pfizer e da Moderna apresentaram resultados bem acima de 90%.
"Num país onde a vacina chinesa é a única disponível, ou aceita ou não aceita", disse Yanzhong Huang, investigador de saúde global do Conselho de Relações Exteriores de Nova York. "Mas, quando você tem opções entre diferentes vacinas, as pessoas são racionais. Certamente vão escolher vacinas fabricadas no Ocidente porque são a opção número 1, os dados já estão disponíveis e são seguras. Sobre a China, até agora, não tiveram nenhum dado sistemático disponível."
A CNBG e a CanSino não responderam aos pedidos de comentários da Bloomberg. Um porta-voz da Sinovac citou conferências de imprensa recentes em Pequim, onde as autoridades de saúde disseram que as vacinas inativas nos ensaios de terceira fase e aprovadas para uso de emergência foram consideradas seguras, apenas com efeitos colaterais leves, e que existe um mecanismo para ser seguido com pessoas que tomam as vacinas. Um porta-voz da Sinovac também disse que a empresa só poderia divulgar os dados de eficácia depois de estes serem revistos pelos reguladores chineses.
"Num país onde a vacina chinesa é a única disponível, ou aceita ou não aceita", disse Yanzhong Huang, investigador de saúde global do Conselho de Relações Exteriores de Nova York. "Mas, quando você tem opções entre diferentes vacinas, as pessoas são racionais. Certamente vão escolher vacinas fabricadas no Ocidente porque são a opção número 1, os dados já estão disponíveis e são seguras. Sobre a China, até agora, não tiveram nenhum dado sistemático disponível."
A CNBG e a CanSino não responderam aos pedidos de comentários da Bloomberg. Um porta-voz da Sinovac citou conferências de imprensa recentes em Pequim, onde as autoridades de saúde disseram que as vacinas inativas nos ensaios de terceira fase e aprovadas para uso de emergência foram consideradas seguras, apenas com efeitos colaterais leves, e que existe um mecanismo para ser seguido com pessoas que tomam as vacinas. Um porta-voz da Sinovac também disse que a empresa só poderia divulgar os dados de eficácia depois de estes serem revistos pelos reguladores chineses.
Foram poucos os lugares em que a questão se tornou tão politizada como no Brasil, o terceiro país do mundo com mais casos, depois dos Estados Unidos e da Índia.
Uma pesquisa realizada pelo Datafolha no início do mês de dezembro demonstrou que metade dos brasileiros afirmam que não tomariam a vacina da Sinovac-Butantan, a maior taxa de rejeição entre todas as vacinas. Cerca de 36% dos entrevistados disseram que também rejeitariam uma vacina russa, enquanto 23% disseram que não tomariam uma solução proveniente dos EUA.
Natalia Pasternak Taschner, microbiologista e fundadora do Instituto Questão de Ciência, afirma que a Anvisa vai avaliar os dados quanto à eficácia e segurança, mas destacou que isso precisa de ser bem comunicado à população. Segundo Taschner, é um grande desafio fazer isso quando o presidente e o governo federal são os que levantam mais dúvidas quanto à produção da vacina chinesa.
A China também pode estar a super estimar a sua capacidade de vacinar simultaneamente a sua própria população de 1,4 mil milhões e outras nações bastante populosas, disse Huang, do Conselho de Relações Exteriores, num Congresso nos EUA.
A CNBG disse ser capaz de produzir mil milhões de doses das suas vacinas inativadas, enquanto a Sinovac pode produzir 600 milhões de doses, com base nas unidades existentes e nas que serão concluídas em breve. A CanSino garantiu que poderia produzir de 200 milhões a 300 milhões de doses das suas vacinas.