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O que quer o consumidor do milénio

Atenção, indulgência, propósito e confiança são os critérios que as marcas devem respeitar na comunicação com um consumidor cada vez mais cético e empoderado, mostrou a apresentação realizada pela Havas Media Network com o tema “Reality Check – Back to the Future”

04 de Junho de 2024 às 10:30
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A conferência "Media Trends: What’s Next", uma iniciativa da Medialivre, juntou especialistas das principais agências de meios para debater como podem as marcas responder às novas exigências de consumidores cada vez mais céticos e exigentes, tanto com as empresas como com as marcas e até mesmo consigo próprios.

Depois da sessão de boas-vindas a cargo de Luís Ferreira, diretor-geral Comercial da Medialivre, Sofia Vieira, Insights & Strategy director da Havas Media Network, apresentou o tema "Reality Check – Back to the Future", que, mais do que falar de tendências, falou de realidades.

Há muito tempo que é discutido o propósito das marcas, o conhecido "walk the talk", mas a expectativa tem vindo a alterar-se. Num mundo em permanente mudança, o mercado da comunicação vê-se obrigado a apressar o passo para conseguir atingir o seu público.
A complexidade cresceu de forma muito rápida e, a juntar às novas ferramentas de comunicação as novas plataformas e a inteligência artificial, surgem fenómenos globais como a pandemia, as alterações climáticas, as guerras e os contextos de inflação e incerteza. Três verdades trazem graus acrescidos de complexidade quando falamos de comunicação: primeira, o consumidor acredita que tem direito a tudo e não está disposto a esperar; segunda, praticamente todos temos na mão um smartphone que nos dá acesso a tudo, a toda a hora; terceira, a descrença e a ansiedade não param de crescer.

Como sublinhou Sofia Vieira, há quatro realidades que já se cristalizaram no dia a dia: o valor da atenção do consumidor, a necessidade aguda de indulgência (reporta à palavra inglesa "indulgence", no sentido de gratificação, prazer, alegria que procuramos obter sobretudo em alturas de maior crise), a expectativa de propósito em relação às marcas, que se está a transformar gradualmente, e a escassez de confiança.



A fórmula Havas

Be mindful: vestir a pele do consumidor, como é que ele vai ser impactado pela comunicação, que experiência lhe estamos a proporcionar? A atenção não deve ser captada a qualquer preço

Delight and surprise: mesmo perante comportamentos inconsistentes, é fulcral entender como podemos acrescentar alegria e prazer à rotina dos consumidores, pôr um sorriso na cara das pessoas

Purpose and customer centricity: o propósito das marcas deve ser reinterpretado à luz do que os consumidores mais valorizam

Transparent Value Exchange: entregar valor em troca de dados, não esquecendo que a perceção de valor é subjetiva e deve ser consistente com a promessa da marca




 

Atenção e intrusão

Há cada vez mais conteúdos e formas de aceder aos mesmos, explicou Sofia
Vieira. "Captar a atenção é difícil mas é diferente de captar cobertura", referiu. Num estudo da Lúmen que citou na apresentação, concluiu-se que num dia típico passamos 16 horas acordados, cerca de 299 minutos são passados a consumir media, destes estamos 84 minutos expostos à publicidade, e apenas 9 geram atenção visual. Ou seja, em 16 horas estamos a falar de 9 minutos de atenção. É uma enorme competição pela atenção do consumidor.

Surge ainda a questão: serão os meios que mais consumimos aqueles que geram mais atenção? "Nos dados deste estudo, vemos que o YouTube e a televisão não são os mais consumidos, mas são os que geram mais atenção", destacou Sofia Vieira.

Porém, o tempo que passamos a consumir um meio influencia a "perceção da atenção", a atenção declarada. Um dos principais motivos de atenção é o hábito, culturalmente crescemos a ver anúncios na televisão e parávamos para os ver. Outros motivos são a incapacidade de evitar anúncios e o serem repetitivos. Ou seja, quanto mais tempo se consome um meio, mais existe esta sensação. "Os anúncios são considerados mais intrusivos porque são repetitivos ou porque não os conseguimos evitar, o que provoca um dilema: como atingir o equilíbrio delicado entre atenção e intrusão", explicou Sofia Vieira.

 

Case study Pedidos Ya

A especialista da Havas Media Network recordou quando a marca chilena de entregas Pedidos Ya usou um ponto de contacto extremamente relevante para a maioria dos chilenos: o futebol. A marca procurou um conteúdo relevante e um canal de comunicação que não fosse intrusivo – neste caso as meias dos jogadores de futebol – uma analogia entre os passes certeiros e a rapidez de entrega, que não só foi extremamente bem recebida pelos consumidores, como ganhou vários prémios de eficácia.

 

Incerteza e indulgência

Não sabermos o que vai acontecer amanhã influencia o que vamos fazer hoje. Conceitos como "carpe diem ou you only live once" estão cada vez mais presentes, influenciando até as opções de poupança, como referiu Sofia Vieira.

Dados do estudo Meaningful Brands 2023 mostram que 68% dos consumidores portugueses dedicam parte do seu tempo a relaxar e a recarregar. "Há nestes números uma clara necessidade de escapismo", interpretou a especialista da
Havas Media Network. 64% dos consumidores portugueses selecionam as suas atividades de forma mais criteriosa e gostariam de dedicar tempo a experiências mais relevantes. "Mas esta necessidade de indulgência, que se agudizou nos últimos anos, varia por faixa etária – os jovens pensam mais em experiências, enquanto as faixas mais envelhecidas pensam em produtos novos –, e também consoante a situação financeira do agregado familiar, afetando de forma muito diferenciada os padrões ou intenções de gasto."

Ou seja, apenas a alimentação e os cuidados de saúde são mantidos em contexto de poupança. Nas restantes categorias de produtos como férias e viagens, refeições fora de casa, refeições entregues em casa, entretenimento fora de casa, etc., surgem diferenças de consumo que chegam aos 40% consoante o rendimento familiar. "É fundamental para as marcas entender o que é o conceito de indulgência para cada consumidor, pois o contexto vai afetar de forma diferente grupos de consumidores diferentes", realçou Sofia Vieira.

 

Case study Magnum

A Magnum ocupa o território da indulgência muito bem e há muito tempo, e tem estendido este território a áreas surpreendentes de uma forma muito natural, referiu a responsável. Exemplo disso foi o lançamento de uma coleção de vernizes com cheiros e cores inspirados nos gelados Magnum, chegando a criar um Indulgence Studio em Nova Iorque. "No fundo é estender a indulgência, surpreender o consumidor e acrescentar algo de novo ao seu dia a dia."

Conceito de "Me-conomy"

No estudo da Meaningful Brands citado por Sofia Vieira, 80% dos consumidores acham que as marcas devem agir para o bem da sociedade e do planeta; 77% estão cansados que as marcas finjam querer agir quando apenas pretendem ganhar dinheiro; 73% acham que as empresas/marcas têm o poder e a responsabilidade de ajudar a resolver alguns dos problemas do mundo. Ao mesmo tempo, o consumidor sente-se mais empoderado e coloca-se em 2.º lugar (a seguir ao governo/ políticos) para resolver crises políticas, ambientais e sociais, ou seja, sente que está nas suas mãos, através das escolhas que faz, ajudar a resolver os problemas.

"Há uma exigência e sentimento de empoderamento maior do consumidor para consigo mesmo", frisou a especialista da Havas Media Network. Este empoderamento reflete-se numa exigência acrescida face aos benefícios entregues pelas marcas, tendo vindo a aumentar o desejo de benefícios pessoais. "Ou seja, o consumidor, na chamada era da ‘me-conomy’, espera que as marcas o ajudem a múltiplos níveis: a sentir-se feliz e resiliente, potenciando o seu bem-estar; simplifiquem a sua vida, ajudando-o a fazer mais com o seu tempo e dinheiro; e o ajudem a fazer a diferença, cumprindo o ‘walk the talk’."

"As marcas devem combinar propósito com customer centricity: conhecer muito bem o consumidor, quais os contextos relevantes, pensar na experiência de consumo; e ter propósito nas escolhas de media – procurar media owners responsáveis, que oferecem informação de qualidade, credíveis, com políticas de sustentabilidade ativas", aconselha Sofia Vieira.



"O consumidor, na chamada era da «me-conomy» espera que as marcas o ajudem a múltiplos níveis; (…) simplifiquem a sua vida, ajudando-o a fazer mais com o seu tempo e dinheiro; e o ajudem a fazer a diferença, «walk the talk» " Sofia Vieira Insights & Strategy Director da Havas Media Network

 

Cada vez mais perdidos

Desde o escândalo do Cambridge Analytica que as fake news e a manipulação de dados entraram na ordem do dia, referiu a especialista da Havas Media Network. Os perigos da inteligência artificial generativa e de como pode ser utilizada de forma maliciosa e os ataques cibernéticos cada vez mais sofisticados ajudaram a instalar o ceticismo na maioria dos consumidores: 52% preocupam-se com a forma como as empresas usam os seus dados pessoais online; apenas 17% sentem que controlam os seus dados pessoais online; e 71% pensam que a IA está a evoluir a um ritmo alarmante. 58% confessam já ter acreditado em fake news e 52% não sabem como proteger a sua informação online, elencou.

Outra conclusão a que se chega é que "os consumidores estão cada vez menos disponíveis para partilhar dados pessoais". Apesar de tudo, a reputação dos meios tradicionais continua incontornável, com a televisão a encabeçar o Top 5 da credibilidade, seguida dos jornais e da rádio, surgindo os motores de busca e as redes sociais apenas em 4.º e 5.º lugar.

 

Case study Dove

Neste mundo de descrença e ceticismo, para ter a confiança dos consumidores, é essencial que as marcas usem transparência e frontalidade. "A Dove estendeu o seu território de beleza real de uma forma muito natural a uma perspetiva pedagógica sobre os riscos e implicações da inteligência artificial generativa. Encarando este problema, conseguiu que várias marcas se juntassem à "promessa" de não substituir modelos humanos por modelos gerados por IA", exemplificou Sofia Vieira.


52%


dos consumidores preocupam-se com a forma como as empresas usam os seus dados pessoais online

17%


dos consumidores sentem que controlam a forma como as empresas usam os seus dados online



71%

dos consumidores pensam que a IA está a evoluir a um ritmo alarmante



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