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A violência do Islão segundo Adonis

Uma das vozes maiores da cultura árabe reflecte, neste livro contundente, sobre as origens da violência do Islão, a repressão das mulheres e o previsível fracasso da Primavera Árabe.

10 de Setembro de 2016 às 12:30
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Adonis, "Violência e Islão" Porto Editora, 190 páginas, 2016



Adonis, nascido na Síria em 1930 sob o nome de Ali Ahmed Said Esber, é um dos grandes nomes da cultura árabe. E talvez o grande poeta vivo dessa cultura. Desde a juventude que foi desfilando a sua integridade nómada entre diferentes exílios. Apaixonado pela língua árabe foi um militante do Partido Nacionalista Sírio, uma formação laica que defendia a criação de uma "Grande Síria", que englobaria Chipre e a Península do Sinai. Preso, tem de se exilar em Beirute a partir de 1955 e, mais tarde, acaba por ir viver para França.

Poucos serão como ele, dentro do mundo árabe, capazes de uma análise tão perspicaz sobre as raízes desta ligação actual da violência ao Islão. É isso que faz neste livro que reproduz entrevistas que foi dando a Houria Abdelouahed, onde não é nada meigo quando fala das origens violentas que estão na fundação do Islão e que continuaram ao longo da sua história.

Adonis realça a violência sistemática sobre as mulheres, algo que percorre todo o livro. Nesse aspecto é demolidor: "Não existem problemáticas árabes porque o Islão dominou a visão do mundo árabe. O muçulmano vê o mundo através da visão islâmica, que é antiga e fechada. O Islão não precisa do mundo, nem do outro, nem da cultura, visto que é a cultura absoluta. Permanece inalterado, e isto até ao fim dos tempos." Isto porque, acrescenta: "O Islão cresceu no seio de uma cultura tribal baseada no comércio e no poder. (…) De facto, foi o poder que transformou tudo. O Islão nasceu num lugar de comércio: Meca. Essa sociedade de comerciantes tinha necessidade de um único dirigente para fazer triunfar o espírito mercantil. Era uma sociedade que desejava unir as tribos sob o estandarte de um poder único."

A essência do Islão está aqui e por isso foi incapaz de se adaptar à modernidade e à democracia, já que estava bloqueada pela essência da lei religiosa. Talvez por isso, quando muitos falaram dos novos tempos da Primavera Árabe, Adonis viu sempre nela o regresso ao período mais sinistro e tenebroso do passado. Diz: "E, em vez de uma mudança portadora de esperança, vivemos um autêntico desastre. E ainda por cima não há uma palavra sobre a liberdade da mulher. Será possível falar de uma revolução árabe se a mulher continua prisioneira da xaria? O recurso à religião transformou essa primavera num inferno. Esta última foi interpretada e utilizada para fins ideológicos." Por isso, ele acha que não há um Islão verdadeiro e outro falso: há um único e é a fonte de tudo o que está a acontecer.

Para ele o Corão é um texto extremamente violento, até porque apenas pede ao indivíduo que o siga sem o questionar. Para Adonis percebe-se assim perfeitamente a lógica do Daesh, já que o Islão foi fundado na lógica do espírito de tribo, de conquistas e do poder do dinheiro. O Daesh segue estes princípios porque o Islão segue um princípio de domínio em vez do conhecimento do homem. E isso só se consegue através da submissão e do afastamento de todos os que se interrogam sobre a sociedade ou o poder. E aí a mulher, encarnação do desejo, tem de ser dominada e submetida.

Adonis tem um sonho: "A minha esperança é que o Daesh seja o último estertor desse Islão. Como uma vela que, nos últimos instantes, tem um sobressalto antes de se extinguir. (…) Os árabes devoram-se uns aos outros." São estas reflexões contundentes que fazem deste livro uma grande obra de reflexão. 

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