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O vento anda desorientado. Sopra forte. Seca. Exige resistência e trabalhos redobrados. Trabalhos de Verão quando é difícil equilibrar orçamentos. Muitas perturbações e outras tantas balbúrdias em tempo de campanha autárquica. Ainda assim, aquém do "fogo e fúria" de Trump.

António José Teixeira 11 de Agosto de 2017 às 13:00
trabalhos. Em pleno Estio, a política e a governação vão a banhos. Seria essa a tradição. Já não será há muito. Seja porque os fogos obrigam ao controlo dos danos, seja porque há eleições, seja porque há que preparar o Orçamento… A política não faz férias, tem horror ao vazio. E faz sentido que assim seja. A vida é mais do que a política, mas é pressuposto que a política sirva para resolver problemas e melhorar a vida. O Verão deste ano tem sido muito exigente e o outono não será menos. Daí a urgência em acautelarmos o futuro. Por exemplo: quando chegarem as chuvas, os solos dos incêndios não absorverão a água e podem originar cheias (não tem de ser uma inevitabilidade); antes da próxima «época de fogos» é imperativo fazer ordenamento, prevenção; aprovada a legislação florestal, não terminou o trabalho político; o Orçamento do Estado de 2018 exige muita negociação à esquerda, mas devia convencer e mobilizar o país… Não falta muito tempo para as respostas devidas. Ou seja, há muito trabalho político a fazer no Verão. Neste Verão.

calor. Ondas de calor, com temperaturas muito acima do que conhecíamos, secas prolongadas, incêndios indomáveis, inundações, são realidades actuais. Já não são apenas os múltiplos estudos que alertam há décadas para o impacto das alterações climáticas. A novidade são as projecções que os centros científicos fazem para o futuro. As últimas são do Centro Comum de Investigação da Comissão Europeia e apontam para ondas de calor que irão penalizar mais os países do sul da Europa e do Mediterrâneo. Nada de surpreendente. O que surpreende é que perante a evidência constatável, ano após ano pouco ou nada se faz. Não há milagres rápidos, mas há pelos menos aquilo a que os investigadores chamam de "acções mitigadoras" que podem ser aplicadas e aceleradas. Não é uma questão sectorial ou de mera gestão ambiental. É todo um programa transversal que introduza mais racionalidade nos nossos hábitos de vida, na actividade económica e na protecção da saúde da população. Se este não é um grande objectivo político, não sei para que servirá a política.

saúde. O director executivo da Agência Europeia do Medicamento (a tal que o Brexit vai retirar do Reino Unido e que Portugal quer conquistar) revelou esta semana três preocupações. A saber: a sustentabilidade da investigação e desenvolvimento de medicamentos; a falta de medicamentos para tratar as infecções com bactérias multirresistentes; e a proteção dos doentes quanto aos efeitos das roturas de distribuição causadas por cadeias globais "demasiado expandidas". As três preocupações de Guido Rasi são preocupantes, desculpem a redundância. Numa Europa envelhecida, com um estado social sob muita pressão, o desenvolvimento de medicamentos mais eficazes e as condições de acessibilidade são questões vitais. Mexem com orçamentos difíceis de equilibrar, com laboratórios que precisam de recuperar grandes investimentos, com Estados e doentes sem suficiente capacidade económica e com lógicas de comercialização pouco ajustadas às necessidades dos pacientes. É um problema europeu, um problema português. 

turismofobia. Fobia é uma perturbação da ansiedade, que se traduz no medo ou na aversão continuada a uma situação ou a um objecto. O turismo surge associado a viagem, conhecimento, respeito, convivência e motivava agrados mútuos. Associar turismo à categoria de fobia parece contraditório, mas o crescente número de turistas - por vezes, avassalador - criou anticorpos indisfarçáveis. Em Barcelona, há poucos dias, quatro encapuçados atacaram um autocarro de turismo. Nas ilhas Baleares, prevê-se que este mês o número de turistas iguale o dos locais. Às cidades mais procuradas já lhes chamam "cidades de aluguer"! Os autóctones queixam-se de perda de qualidade de vida e olham para os forasteiros como predadores. Nem sempre as vantagens do turismo são reconhecidas e propiciam vantagens para todos. Nós por cá, em Lisboa ou no Porto, também lidamos com o tal "turista intrépido" de que falava Clara Ferreira Alves. Julgo que, por enquanto, ainda dentro de limites aceitáveis. Mesmo que as vantagens sejam maiores do que os inconvenientes, nem por isso nos devemos dispensar de prevenir a tal fobia.

autarquia. Está a dar os primeiros passos a campanha eleitoral para as autarquias locais. O conceito de autarquia tem acepções políticas e históricas por vezes contraditórias. Por um lado, remete para uma forma de governo em que um indivíduo ou um grupo tem poder absoluto sobre os cidadãos. Um sinónimo de autocracia. Por outro, autarquia designa um governo conduzido pelos cidadãos. É aqui que nos situamos em 40 anos de poder local democrático. Autarquia tem também um sentido económico. Visa a autonomia, a auto-suficiência. A história municipal portuguesa liga-se a esta ideia de autonomia em diversos níveis e a dialéctica do poder passa por aqui quando se fala em descentralizar. Apesar dos muitos abusos e de mandatos pouco recomendáveis, o poder local tem feito bastante pelas comunidades que serve. É o que de novo se espera daqueles que estão mais próximos dos munícipes. Emprego, transportes, educação e saúde serão áreas decisivas. É aqui que se joga o futuro das pessoas e dos seus territórios. 

fúria. Não os podemos ignorar. Todos os dias nos convencem de que o mundo também anda para trás. Depois do "choque e pavor" de W. Bush no Iraque, a "fúria" de Trump na Coreia… Donald Trump ameaçou Kim Jong-un com "fogo e fúria como nunca se viu". A declaração surgiu na sequência da divulgação de um relatório americano em que se conclui que a Coreia do Norte produziu armas nucleares, que podem ser transportadas por mísseis intercontinentais. O líder coreano tornou-se um perigo real. E não se deixa atemorizar pelas fúrias de Trump. De imediato, ameaçou a ilha de Guam em que os EUA instalaram uma base militar. A confrontação subiu de tom. Pode ser apenas retórica. Kim sacode as sanções e quer reconhecimento, Trump pretende que a China meta na ordem os coreanos do Norte. As variações de tom nas relações internacionais são normalmente resultado de exercícios diplomáticos ponderados. Costumava ser assim na presidência dos EUA, ao contrário da dinastia Kim. A imprevisibilidade de Trump aproxima-o de Kim. Ninguém pode estar certo de que conseguirão evitar uma nova guerra.


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