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Miopia de (muitos) investidores sobre sustentabilidade

Este ano é uma boa síntese do combate ao aquecimento global: o tema está nas agendas de políticos, instituições internacionais, ONGs e empresas, que fazem muitas promessas, mas ações insuficientes. Vamos a passo de caracol, quando devíamos correr como lebres. No setor privado e nos mercados, nota-se uma certa fadiga. Porém, a investigação académica mostra que trabalhar os temas da sustentabilidade nas empresas atualmente não é apenas uma questão ética ou moral, é racional.

Bruno Proença 06 de Dezembro de 2023 às 12:00
Bruno Proença, Consultor de Sustentabilidade
Bruno Proença, Consultor de Sustentabilidade
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Estamos a entrar na reta final do ano e, como é habitual, iniciamos o período de balanços. 2023 não ficará para a história relativamente aos temas da Sustentabilidade. Ou melhor, poderá ficar para a história pelas piores razões. Foi um ano de recordes, mas todos negativos. O ano mais quente desde que há séries estatísticas; o valor mais alto de sempre em emissões de gases com efeitos de estufa, nomeadamente CO2; e, como se antecipava, até agora na COP28, que ainda decorre, muita conversa, discursos e promessas, porém poucos resultados concretos.

Também no setor privado e nos mercados, nota-se uma certa fadiga. Os investimentos em fundos e ativos classificados como "verdes", de acordo com o ‘framework’ ESG, estão a abrandar. Dados da Morningstar mostram que nos EUA tivemos um desinvestimento em fundos sustentáveis no acumulado dos primeiros três trimestres do ano.

Estes dados confirmam as declarações de importantes fundos. A Vanguard, o segundo maior gestor de ativos do mundo, abandonou o ‘Net Zero Asset Managers initiatve’, que reúne os investidores comprometidos com a redução dos gases com efeitos de estufa. E na sua última carta aos investidores, Larry Fink, líder da BlackRock, afirmou que a política ambiental é uma responsabilidade dos governos e que vai abandonar a terminologia ESG.

Estas posições apenas revelam uma profunda miopia de alguns investidores, que felizmente não são seguidas por todos. Excluindo o mercado norte-americano, nos primeiros três trimestres do ano, os ativos totais em fundos "sustentáveis" cresceram 6,7%. E, tão ou mais importante, investir em ativos verdes é um bom negócio. Dados da Morningstar revelam que as ações das grandes empresas nos EUA com melhores práticas ESG apresentaram, nos últimos cinco anos, uma rentabilidade superior em 25 pontos percentuais relativamente à média do mercado bolsista.

Estes dados são corroborados pela investigação académica. Há hoje evidência da associação positiva entre melhor performance ESG e empresas com um valor de mercado mais elevado. (*) A investigação académica também mostra que a maior pressão dos stakeholders para acederem a dados ESG das empresas não é somente para verificar a sua exposição aos riscos ligados à sustentabilidade ou por questões éticas, mas igualmente por puros motivos financeiros. (**) Enquanto mais empresas integram a sustentabilidade na sua missão e estratégia, mais investidores, nomeadamente institucionais, integram critérios de sustentabilidade nas decisões de investimento. (***)

Também em Portugal se faz investigação académica nesta área. Quatro professores do ISEG (Victor Barros, Pedro Verga Matos, Joaquim Miranda Sarmento e Pedro Rino Vieira) acabam de publicar um artigo no "Journal of Business Research", intitulado "ESG performance and firms’ business and geographical diversification: An empirical approach", no qual mostram que há uma relação entre a performance ESG e a diversificação de negócios.

Dados e a informação disponível, bem como a investigação académica, rumam no mesmo sentido: é importante que as empresas integrem os critérios ESG na sua estratégia, é ainda mais relevante que sejam transparentes e divulguem informação sobre sustentabilidade, pois os investidores apreciam e o valor das organizações no mercado sai reforçado. Trabalhar os temas da sustentabilidade nas empresas atualmente não é apenas uma questão ética ou moral, é racional.


(*) Fatemi, A., Glaum, M., & Kaiser, S. (2018). ESG performance and firm value: The moderating role of disclosure. Global Finance Journal, Special Issue on Corporate Social Responsibility and Ethics in Financial Markets, 38, 45-64
(**) Amel-Zadeh, A., & Serafeim, G. (2018). Why and how investors use ESG information: evidence from a global survey. Financial Analysts Journal, 74, 87-103.
(***) Bernow, S., Klempner, B., & Magnin, C. (2017). From ‘why’ to ‘why not’: sustainable investing as the new normal, private equity & principal investors practice. McKinsey & Company.


Ciências e factos COP28No Dubai, continuam os trabalhos da COP28. Pela positiva, vão sendo conhecidos alguns novos compromissos. Um conjunto de 118 países comprometeram-se em triplicar a capacidade de produção de energia renovável até 2030 e o governo dos EUA anunciou regras mais apertadas sobre as emissões de metano na indústria do petróleo e gás. Mais significativa é a promessa das grandes companhias petrolíferas, que representam 40% da produção global de petróleo, de eliminarem as emissões de CO2 das suas operações até 2050.
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