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25 de Dezembro de 2013 às 23:30

A mudança da economia mundial

Com 2013 a chegar ao fim, os esforços para reanimar o crescimento nas mais importantes economias do mundo – com a excepção da Zona Euro – estão a ter um efeito benéfico em todo o mundo. Todos os problemas iminentes para a economia global são – na sua essência – políticos.

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Após 25 anos de estagnação, o Japão está a tentar recuperar a sua economia levando a cabo um programa de estímulos monetários ("quantitative easing") a uma escala sem precedentes. É uma experiência arriscada: um crescimento económico mais rápido pode levar a uma subida das taxas de juro e tornar o custo da dívida insustentável. Mas o primeiro-ministro Shinzo Abe prefere assumir esse risco a condenar o Japão a uma morte lenta. E, tendo em conta o apoio da opinião pública, essa é também a vontade de todos os japoneses.

Pelo contrário, a União Europeia está a caminhar no sentido de um longa estagnação, da qual o Japão tenta desesperadamente sair. As apostas são altas: os Estados-membros podem sobreviver a uma – ou mais – década perdida; mas a União Europeia, uma incompleta associação de Estados-membros, pode facilmente ser destruída.

A concepção do euro – realizada com base no marco alemão – foi uma falha fatal. Criar um banco central comum sem um ministério das Finanças comum, significa que as dívidas públicas são definidas numa moeda que nenhum Estado-membro controla, tornando-os assim vulneráveis ao risco de incumprimento. Em consequência do "crash" de 2008, muitos Estados-membros ficaram sobre-endividados e o prémio de risco criou uma divisão permanente entre credores e devedores. Este defeito poderia ter sido corrigido substituindo as obrigações de cada país por Eurobonds. Infelizmente, a chanceler alemã Angela Merkel, reflectindo a mudança radical na atitude alemã face à integração europeia, colocou de parte essa possibilidade. Antes da reunificação, a Alemanha era o principal motor da integração. Agora, esmagados pelos custos da reunificação, os contribuintes germânicos estão determinados em evitar tornarem-se num bolso sem fundo para os devedores europeus.

Após o crash de 2008, Merkel insistiu que cada país devia tomar conta das suas instituições financeiras e que as dívidas públicas deviam ser, totalmente, pagas. Sem o perceber, a Alemanha está a repetir o trágico erro dos franceses após a I Guerra Mundial. A insistência do primeiro-ministro Aristide Briand nas indemnizações de Guerra levou à subida de Hitler ao poder; as políticas de Merkel estão a provocar o reaparecimento de movimentos extremistas no resto da Europa.

Os acordos que actualmente governam o euro estão para ficar, porque a Alemanha irá sempre suportar o mínimo para preservar a moeda comum – e porque os mercados e as autoridades europeias irão punir qualquer país que desafie esses acordos. Ainda assim, a fase mais complicada da crise financeira chegou ao fim. As autoridades financeiras da Europa reconheceram, tacitamente, que a austeridade é contra-produtiva e pararam de impor mais constrangimentos orçamentais. Isto deu aos países devedores alguma margem de manobra e, mesmo na ausência de perspectivas de crescimento, os mercados financeiros estabilizaram.

As futuras crises vão ser, na sua origem, políticas. De facto, isto já é visível: a União Europeia está tão voltada para si própria que não consegue responder de forma adequada a ameaças externas: sejam elas a Síria ou a Ucrânia. Mas as perspectivas estão longe de ser desanimadoras; o reaparecimento da ameaça da Rússia pode reverter a tendência de desintegração da Europa.

Com a crise, a União Europeia deixou de ser um "objecto fantástico" que inspira entusiasmo para se tornar em algo radicalmente diferente. O que era suposto ser uma associação voluntária de Estados iguais que sacrificaram parte da sua soberania por um bem comum – a concretização dos princípios de uma sociedade aberta – transformou-se com a crise do euro numa relação entre países credores e devedores que não é nem voluntária nem igual. De facto, o euro pode destruir a União Europeia.

Ao contrário do que acontece na Europa, os Estados Unidos estão a surgir como a mais forte economia do mundo desenvolvido. A energia de xisto deu ao país uma vantagem competitiva importante no sector industrial, em geral, e no sector petroquímico em particular. Os sectores bancário e privado têm feito esforços de desalavancagem. O programa de estímulos à economia elevou o valor dos activos. E o sector imobiliário tem melhorado, com a área da construção a reduzir o desemprego. O precipício fiscal está também perto de terminar.

Além disso, e mais surpreendente, a polarização da política norte-americana começa a dar sinais de estar a diminuir. O sistema bipartidário funcionou relativamente bem durante dois séculos porque os dois partidos tiveram que lutar pelo centro nas eleições gerais. O Partido Republicano foi, mais tarde, capturado por uma coligação de fundamentalistas religiosos e dos mercados, reforçados, posteriormente, por neo-conservadores que caminharam para uma extrema-direita.

Os democratas tentaram acompanhar este movimento com objectivo de alcançar o eleitorado do centro, e os dois partidos foram coniventes na definição dos distritos eleitorais. Como consequência, as primárias dos partidos, dominadas por activistas, tiveram precedência sobre as eleições gerais.

Isso completou a polarização da política americana. Eventualmente, a ala do Tea Party dentro do Partido Republicano levou longe de mais as suas ambições. Após a recente derrocada da paralisação do governo, a única coisa que resta do "establishment" republicano desde que começou a luta, prevê-se uma revitalização do sistema bipartidário.

A maior incerteza que o mundo enfrenta actualmente não é o euro mas a futura direcção da China. O modelo de crescimento responsável pela sua rápida expansão esgotou a sua energia.

Esse modelo dependia das restrições financeiras ao sector privado (famílias), de forma a canalizar recursos para as exportações e o investimento. Em resultado, o sector privado diminuiu para 35% do produto interno bruto (PIB) e as suas poupanças (forçadas) deixaram de ser suficientes para financiar o actual modelo de crescimento. Isto levou a um aumento exponencial da utilização de vários instrumentos de financiamento através da emissão de dívida.

Existem algumas semelhanças inquietantes com as condições financeiras que ocorreram nos Estados Unidos nos anos que antecederam o crash de 2008. Mas há também uma diferença significativa. Nos Estados Unidos, os mercados financeiros tendem a dominar a política; na China, o Estado detém os bancos e a maioria da economia e o Partido Comunista controla as empresas estatais.

Consciente dos perigos, em 2012, o Banco Popular da China tomou medidas para travar o crescimento da dívida; mas quando o abrandamento começou a provocar dificuldades reais à economia, o partido impôs a sua supremacia. Em Julho de 2013, a liderança ordenou à indústria do aço que voltasse a funcionar e ao banco central que facilitasse o crédito. A economia recuperou num instante. Em Novembro, o Terceiro Plenário do 18º Comité Central anunciou novas e abrangentes reformas. Estes desenvolvimentos são, largamente, responsáveis pelas recentes melhorias nas perspectivas mundiais.

A liderança chinesa esteve certa em dar primazia ao crescimento económico, em detrimento das reformas estruturais, porque estas, quando combinadas com uma austeridade orçamental, levam as economias para uma espiral deflacionista. Mas há uma contradição por resolver nas actuais políticas chinesas: retomar a produção de aço também levou a um crescimento exponencial da dívida, que não é sustentável por muito mais tempo.

Quando e como esta contradição será resolvida terá profundas consequências para a China e para o mundo. Uma transição pacífica no país irá provavelmente envolver reformas política e económicas, enquanto um falhanço minaria a confiança na liderança política do país, resultando em repressão interna e em confrontos militares no estrangeiro.

Outro dos grandes problemas por resolver é a ausência de uma governação global apropriada. A falta de acordo entre os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas está a exacerbar catástrofes humanitárias em países como a Síria – sem falar que está a permitir que o aquecimento global continue sem controlo. Mas, ao contrário do enigma chinês, que irá terminar nos próximos anos, a falta de governação global pode continuar indefinidamente.

 

George Soros é presidente da Soros Fund Management e da Open Society Foundations

Direitos de Autor: Project Syndicate, 2013.
www.project-syndicate.org
Tradução: Ana Luísa Marques

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