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24 de Agosto de 2018 às 11:13

Umas férias diferentes

Este ano, decidi seguir o conselho de uma antiga campanha publicitária: "Vá para fora cá dentro."

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Back to basics
"A música faz muita coisa a muitas pessoas: transporta-nos, pode levar-nos anos atrás, ao momento em que algumas coisas aconteceram nas nossas vidas - anima-nos, encoraja-nos e fortalece-nos."
Aretha Franklin

Umas férias diferentes
Este ano, decidi seguir o conselho de uma antiga campanha publicitária: "Vá para fora cá dentro." E, assim, fiz-me já diversas vezes à estrada, para norte, para o centro e agora para sul, para o Alentejo profundo. Onde quer que vá, encontro turistas estrangeiros - muitos, e das mais diversas proveniências. Tem a sua graça ouvir falar inglês, russo, brasileiro, sueco ou francês, tudo no mesmo restaurante de Mértola, O Brasileiro, onde ao jantar as ofertas gastronómicas são, por exemplo, escabeche de perdiz, sopa de cação ou entrecosto com migas de espargos bravos. Umas horas antes, ao almoço, vi frustrada a minha intenção de me deliciar com as iguarias do Botequim da Mouraria, em Évora, porque os únicos oito lugares da casa, ao balcão, estavam ocupados por duas famílias estrangeiras, cada casal com dois filhos, que se lambiam com os enchidos, os queijos, os ovos mexidos com espargos. Cocei a cabeça e lá procurei outro sítio que por acaso não correu bem. Por todo o lado - nos monumentos, nas exposições, no meio da rua -, sente-se a presença dos visitantes. E sente-se o seu impacto na economia local. Empregados de simples cafés ou de restaurantes tradicionais falam inglês como podem e, na maioria dos casos, bastante razoavelmente. O inglês afirmou-se a língua do acolhimento a turistas - o que dá azo a cenas deliciosas como esta: um casal de clientes franceses, na casa dos 30-40 anos, a falar no restaurante de Mértola com a empregada portuguesa, em inglês, numa evocação da série "Alô, Alô". E a jovem de Mértola falava inglês bem melhor do que os franceses. Acabei as migas e sorri.

Semanada
 As Forças Armadas perderam 20% dos efectivos nos últimos 17 anos  o número de inspectores na educação caiu 40% desde 2001  14% dos imóveis do Estado, cerca de quatro mil prédios, estão vazios e sem utilização por parte de organismos públicos  no ano passado, 25 mil passageiros queixaram-se de mau serviço e de problemas nos comboios da CP; este ano, desde Janeiro, há um aumento de 83% dos protestos sobre a CP no Portal das Queixas  o preço médio da electricidade em Portugal, avaliado em função do poder de compra nos países da Comunidade Europeia, só é ultrapassado pela República Checa  uma universidade americana concluiu um estudo no qual se afirma que passar horas no sofá a ver televisão, sobretudo os serviços de streaming, diminui o apetite sexual; segundo a Marktest, 17% das pessoas ouvem rádio pela internet, mas este número sobe para 30% nos ouvintes entre os 25 e os 34 anos; Yanis Varoufakis, antigo ministro das Finanças grego, criticou o vídeo partilhado por Mário Centeno para assinalar o fim do resgate à Grécia dizendo que "parece propaganda norte-coreana"  João Galamba, do PS, e Mariana Mortágua, do Bloco, também criticaram o vídeo de Centeno  a dívida externa líquida portuguesa situou-se em 183,1 mil milhões de euros em Junho, representando 93,4% do PIB, mais 0,9 pontos percentuais, comparando com o final de 2017  o PAN quer limitar o uso de charretes e carroças. 

Dixit
"A Cúria Romana é responsável por mais ateus do que Karl Marx, Nietzsche e Freud juntos."
Anselmo Borges
Padre e teólogo

Uma questão de trânsito
De repente, uma professora de escrita criativa, que vivia no campo, vê a sua vida dar uma reviravolta no meio de um divórcio e muda-se com os filhos para Londres. Este livro fala do percurso de mudança, dos cruzamentos, das dúvidas, das transições de hábitos, rotinas e comportamentos. "Trânsito" é o segundo livro de Rachel Cusk, na sua trilogia que começou por "A Contraluz" e se concluiu com "Kudos", lançado em Maio passado no Reino Unido. Este "Trânsito" foi agora editado em Portugal pela Quetzal e a protagonista, Faye, uma mulher de meia-idade, escritora, pode parecer ter uma evidente semelhança com a autora. Mas, na realidade, Faye é apenas uma espécie de porta-voz do que Cusk vai achando do mundo - hilariante a parte em que Faye conta o assédio de que foi vítima num festival literário pelos seus colegas escritores ou a descrição de um jantar em que ela observa os comportamentos de uma família, digamos, moderna. Isabel Lucas, uma das poucas pessoas que vale a pena ler quando o tema são livros ou os seus autores, diz que Rachel Cusk tem uma tremenda capacidade de "escrever sobre a banalidade fazendo disso grande literatura. Como se nada fosse." E é isso. Simples, sem complicações.


Gosto
José Lourenço, que tem uma conta no Instagram onde partilha as suas obras e filmes de animação, foi convidado pelo Guggenheim de Nova Iorque para fazer um teaser para a exposição de Giacometti que ali vai abrir proximamente.

Não gosto
Bruno de Carvalho comprovou ser um elemento de perturbação da equipa de futebol do Sporting ao voltar a enviar SMS aos jogadores onde se intitulava presidente do clube. 


África em Évora (e na Vidigueira)
Em primeiro lugar, uma boa notícia - a exposição Évora-África, subtitulada "Africa Passions", que estava prevista encerrar dia 25, deverá ser prolongada até final de Setembro. Esta mostra é uma das mais importantes deste ano, bem concebida, bem montada, verdadeiramente surpreendente, e está no Palácio Cadaval, mesmo no centro de Évora, junto ao Templo de Diana. Começo por destacar a peça Osa Nla, a evocação de uma divindade, concebida por Romuald Hazoumè, e que domina a magnífica Igreja dos Lóios, com os seus riquíssimos painéis de azulejos. A exposição apresenta essencialmente fotografia e pintura, com particular enfoque em artistas do Congo e Mali, mas também moçambicanos, como Filipe Branquinho e Mauro Pinto. A exposição mostra trabalhos fruto de formação académica nalguns casos, mas também da tradição popular. Destaco as magníficas fotografias de Malick Sidibé na Bamako dos anos 60, assim como os retratos fotografados e encenados por Omar Victor Diop, a pintura de JP Mika, de Filipe Branquinho, de Toussaint Dembelé, de Amadou Sanago e ainda as obras de Frédéric Bruly Bouabré. Esta exposição tem uma extensão a três dezenas de quilómetros, no Centro de Arte Quetzal, em Vila de Frades, junto à Vidigueira. "Drawing Africa on the Map", a exposição que está na Quetzal, junta artistas de diferentes regiões do continente africano, que se exprimem através do desenho - e, num caso, o de William Kentridge, através de espantosas animações, emocionantes.  

A voz de Aretha
É uma pena dedicarmos tão pouca atenção aos grandes nomes da música enquanto eles são vivos. Submergidos pela procura dos novos lançamentos, temos tendência a deixar para trás o prazer de ouvir os grandes intérpretes em grandes canções. Aretha Franklin, por muitos considerada a maior cantora na música popular norte-americana, nasceu em Memphis, cresceu em Detroit e viveu o gospel, a soul, e o ryhthm and blues. Teve incursões no jazz, na pop e até na ópera. Começou a gravar em 1956 e o seu último disco foi de 2014 - quatro dezenas de álbuns em 58 anos. Gravou duetos com George Michael e George Benson, teve Lauryn Hill a produzi-la, fez discos de homenagem a grandes nomes da soul, como Dinah Washington, e gravou versões de dezenas de autores, desde Sam & Dave aos Rolling Stones. O seu legado musical é imenso. Se por estes dias quiserem ouvi-la, pesquisem o Spotify - já depois da sua morte, ocorrida há dias, o serviço de streaming fez uma compilação intitulada "The Immortal Aretha Franklin", que inclui 20 dos seus temas mais conhecidos. Podem também pesquisar o histórico registo de um concerto de 1972, em Filadélfia, "Oh Me, Oh My - Aretha Live in Philly". Ou ouçam "Aretha Franklin Sings The Great Diva Classics", que inclui versões de Aretha para dez temas de outros grandes nomes da música - foi o seu derradeiro registo em estúdio, em 2014, e é uma prova da sua grande voz.

Arco da velha
Um estudo realizado na Alemanha, que recolheu informação em 20 países, mostra que mais de 80% das peças de roupa que as pessoas possuem não foram vestidas nos últimos 12 meses. 

Conceitos sem sentido
Esta semana, estive num restaurante em Évora, no centro da cidade, mesmo ao pé do Templo de Diana. Bem arranjado, bom serviço, empregados muito simpáticos. Évora está invadida por turistas, o que é uma coisa boa, desde que não se perca o que é característico de cada local. Creio que a gastronomia é das coisas que deve ser preservada. Nesse restaurante havia, compreensivelmente, algumas cedências turísticas, como uma salada césar e uma salada de camarão, mas havia também uma de figos, com presunto e queijo fresco, que podia ser uma boa possibilidade num almoço leve de dia de calor. E, além desta salada, para entrada pedi um carpaccio de atum. É certo que havia apenas duas mesas, entre uma dezena, que tinham portugueses. Quando pedi um pouco de pão, apareceram-me uns pãezinhos redondos com ar de congelados e pré-preparados, sem nada a ver com pão alentejano. Interrogado um dos empregados sobre tal assunto, disse-me a sorrir que o chefe novo que tinha entrado substituíra o pão tradicional, que ali era antes servido, por aquela modernice sem sentido nem sabor. No carpaccio de atum, era estranhamente utilizado um balsâmico (bem podiam propor uma muxama com azeite aromatizado e vinagrete de laranja ou até ventresca de atum de conserva, que a há bem boa). Na minha salada de figos, o queijo fresco era industrial, de supermercado, sensaborão, o presunto era sem história e os figos teriam ganho em serem descascados. A umas lulas fritas, a lista chamava tempura de lulas. O restaurante chama-se Cinco Quinas mas, pela amostra, não se preocupa muito com a imagem que dá da nossa gastronomia. 


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