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17 de Abril de 2020 às 10:18

O teletrabalho

Ao princípio, achei piada ao teletrabalho. Desde que se disponha de uma infraestrutura tecnológica boa na empresa, de uma ligação de internet razoável.

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Não devemos temer e sim procurar compreender. Agora é o tempo de compreender, para que tenhamos menos receios.
Marie Curie

O teletrabalho
Ao princípio, achei piada ao teletrabalho. Desde que se disponha de uma infraestrutura tecnológica boa na empresa, de uma ligação de internet razoável e de um mínimo de condições logísticas, sabe bem não gastar tempo em deslocações, ficar a observar o trabalho da equipa a uma distância virtual, ter menos interrupções, gerir a agenda de outra forma, poder ter mais tempo para pensar. Mas, depois, sobretudo ao fim de um mês, começo a sentir falta das conversas com mais pessoas, do confronto de ideias mais directo, de poder falar sem ser pelo microfone, de ouvir os outros sem o som roufenho do Zoom ou do Teams, de poder ver caras sem estarem desfocadas ou sem fundos falsos com praias e outras coisas do género. Por sorte, a empresa onde trabalho, a Nova Expressão, tinha migrado todos os sistemas, há cerca de um ano, para a cloud, por causa de uma mudança temporária de instalações. Quando a pandemia começou, estava tudo operacional e já havia o hábito de utilização da cloud e de trabalho remoto. O problema não está na tecnologia, está na falta que as pessoas fazem e na falta do confronto directo de ideias, do debate não electrónico. Com a situação de encerramento das escolas, ouço muitos pais queixarem-se de que não conseguem fazer o acompanhamento das aulas virtuais dos filhos ao mesmo tempo que trabalham. Alguns estão esgotados, outros à beira de um ataque de nervos. Quando sairmos disto, além de todas as outras questões, vamos ter de enfrentar problemas na área dos recursos humanos, saber como recuperar toda a gente que ficou lesionada no meio deste jogo da clausura.

Semanada

Um estudo da Universidade Católica indica uma quebra de rendimento de 43%  nas famílias que ganham até mil euros diversos autarcas têm sido confrontados com o aumento do número de pedidos de comida por parte de famílias carenciadas que, no último mês, viram os rendimentos baixar o lay-off em Portugal já atinge cerca de mil trabalhadores um terço das mortes registadas até agora em Portugal durante a pandemia foram de idosos residentes em unidades de 3.ª idade com uma boa parte das aulas a fazer-se de forma não presencial, e porque grande parte dos docentes não são digitais nativos, a Universidade Aberta e a Direção Geral de Educação vão formar mais de 2.300 professores em ensino à distância segundo a Marktest, 69,8% dos consumidores diminuíram a frequência das compras em super/hipermercados e, destes, cerca de 38% afirmam que passaram a ir a outro tipo de lojas (maioritariamente ao comércio local: minimercados, mercearias, talhos, peixarias, padarias, etc.) e a encomenda online ou por telefone foi a alternativa referida por um número muito pequeno de indivíduos em março de 2020, RTP1, SIC e TVI emitiram cerca de 264 horas de informação regular, mais 21,5% do que no mês anterior e mais 7,4% do que o verificado no mesmo mês de 2019, num total de 797 notícias e 35 horas de emissão sobre a pandemia, com a RTP1 a liderar, com 14 horas de emissão e 327 notícias emitidas sobre o tema.


Dixit
"Raramente saímos das crises da mesma forma como entrámos. Acontecem coisas em nós, e na nossa relação com as outras pessoas, que fazem com que tudo mude."
Miguel Xavier, Psiquiatra

A China explicada a ocidentais
Calhou ter lido "Sob Céus Vermelhos" agora, nesta última semana, no meio de tantas notícias e especulações vindas do Oriente. É um livro sobre o passado mais recente da China, numa altura em que, pelas razões que se sabem, tanto se fala daquele país e se desenvolvem polémicas à sua volta. "Sob Céus Vermelhos" foi originalmente editado em 2019 e agora lançado em Portugal pela Quetzal. A sua autora, Karoline Kan, aliás Chaoqun Kan, nasceu numa aldeia chinesa em 1989, o ano dos protestos em Tiananmen. Cresceu e viveu nessa aldeia, e depois numa cidade do interior, até ir para a universidade, em Pequim. Depois de concluído o curso, Kan trabalhou para o New York Times e Radio France Inter em Pequim, foi jornalista na revista That’s Beijing, actualmente é editora do jornal digital China Dialogue e em 2019 foi distinguida com o Young China Watcher of the Year. "Sob Céus Vermelhos" é essencialmente a história da vida da autora, o relato de como era o dia-a-dia na aldeia, como se estabeleciam hierarquias dentro de uma família ao longo de três gerações, o que era esperado das mulheres e o que era atribuição dos homens. No tempo da política do "filho único", Chaoqun Kan foi a filha proibida, a que não devia ter nascido. A sua mãe desafiou as ordens do Partido Comunista Chinês ao querer tê-la e viu a sua vida profissional - era professora - prejudicada por isso. O livro relata o que eram as tradições e a cultura tradicional na China de então, quando Deng Xiaoping começou a abrir a economia ao longo dos anos 1990. Conta o choque que foi passar da aldeia para uma pequena cidade, na região de Hunan, que então se começava a desenvolver. Relata a mudança de uma sociedade rural para uma sociedade industrial, no meio de uma corrupção que vivia à sombra dos dirigentes políticos e perante a passividade que os ensinamentos de Confúcio estimulavam. À autora sempre fez confusão porque é que nos livros de História por onde estudou não havia referências ao ano de 1989, o ano dos grandes protestos estudantis - apenas percebeu o que se tinha passado quando finalmente chegou a Pequim. Este livro é a história da descoberta de um país e o relato das suas contradições por uma pessoa que nasceu no despontar da nova China. Indispensável para se perceber tudo o que ali se passou nestes últimos anos.

A fotografia
Quando se fala de fotografia é incontornável que a conversa vá parar à Magnum Photos, a agência fundada em 1947 por um grupo de fotógrafos liderados por Robert Capa e que mudou a forma de encarar o fotojornalismo, a fotografia documental e a fotografia em geral. Ao lado de Capa estavam nomes como David Seymour, Henri Cartier Bresson, Ernest Hass, René Burri e Inge Morath, entre muitos outros. Os membros da Magnum publicaram nas maiores revistas da época, fizeram trabalhos exclusivos para a Life ou para a Look, acompanharam a guerra do Vietname e muitos outros conflitos. Henri Cartier Bresson descrevia a agência da seguinte forma: "A Magnum é uma comunidade de pensamento, uma qualidade humana compartilhada, uma curiosidade sobre o que está a acontecer no mundo, um respeito pelo que está a acontecer e um desejo de o interpretar visualmente." Ao longo dos anos, por lá passaram alguns dos mais marcantes fotógrafos e, actualmente, podemos encontrar talentos tão diversos como Antoine d’Agata, Elliott Erwitt, Josef Koudelka, mas também Martin Parr ou Cristina de Middel, entre tantos outros. Podem ir seguindo a actualidade fotográfica e a produção da Magnum, assim como os cursos e as exposições que organiza no site da empresa - https://www.magnumphotos.com -, em www.instagram.com/magnumphotos ou ainda em www.facebook.com/MagnumPhotos. A imagem aqui reproduzida do Instagram é de Patrick Zachmann, feita a 16 de Março, em Paris, já com a pandemia declarada.

Este tempo
Entre 1 e 14 de Abril, foram matriculados em Portugal 838 ligeiros de passageiros, enquanto um ano antes, no mesmo período, tinham sido 6.208, o que significa uma quebra de 86,5%, em termos homólogos.

Folk contemporâneo
Laura Marling é uma das vozes mais importantes da folk contemporânea e o seu álbum de estreia data de 2008. "Song For Our Daughter", o novo álbum lançado há dias, é, nas palavras da cantora, um trabalho quase conceptual, escrito para uma criança imaginária sobre "aquilo que é ser uma mulher na sociedade actual". O disco é ao mesmo tempo intimista, triste e pessimista, mas cheio de melodias e arranjos magníficos. "Blow By Blow", uma das canções-chave do álbum, fala daquilo que por vezes acontece nas relações: "Note by note, bruise by bruise/Sometimes the hardest thing to learn is what you get from what you lose." Musicalmente, este é claramente um disco folk tradicional, com instrumentos acústicos e voz em primeiro plano, sempre a emoção colocada em destaque, como quando os arranjos incluem um piano discreto ou um coro pontual. O ambiente anda próximo daquilo que se encontrava nos anos 70 em discos folk americanos (Marling, embora inglesa, vive há uns anos perto de Los Angeles). A produção do disco privilegia os arranjos de cordas e vozes. Destaco a canção que dá título ao álbum, "Song For Our Daughter", mas também "For You", "Held Down", "Strange Girl" ou ainda "The End Of The Affair". Disponível no Spotify.

Culinárias
O prazer de um molho de grelos fresquíssimo, em flor, é uma das coisas que só os mercados tradicionais nos oferecem. A sua textura e o seu gosto não têm comparação com os que são sujeitos a longos períodos de frio e chegam enrugados às prateleiras dos supermercados. Um molho de grelos frescos deve ser lavado em várias águas e arranjado, tirando as folhas que estejam amareladas. Depois, precisam de ser muito bem cozidos, longamente, até ficarem tenros. Só se metem na água quando já estiver a ferver e obviamente destapados para ficarem bem verdes, que é uma belíssima cor - e é quando entram na água que se salgam a gosto. Depois de escorridos com cuidado, são um belíssimo acompanhamento. No topo das minhas combinações preferidas está um lombo de bacalhau. Filetes de pescada também são uma ideia e, em geral, qualquer peixe de qualidade é boa companhia para os grelos. Uma experiência interessante pode ser desfazer uma posta de pescada já cozida e misturá-la com os grelos. Tudo bem envolvido e regado com bom azeite e está pronta uma refeição. Depois há outras possibilidades e, à cabeça, lembro-me de um arroz de grelos, com arroz carolino, claro. E, finalmente, um pedaço de grelos cozidos e depois levemente salteados acompanha bem uma boa carne grelhada. Sou dos que acreditam que cozinhar descontrai e que nesta época confinada é algo que estimula a imaginação.
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