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Restauração: O Portugal que petisca senta-se à taberna no Porto

A psicóloga Sofia Príncipe e a socióloga Joana Conde servem raridades gastronómicas de pequenos produtores nacionais no renovado Largo de São Domingos, deixando no passado as carreiras instáveis na área da formação.

31 de Julho de 2014 às 11:45
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Enchidos alentejanos, queijos de Castelo Branco, "maranhos" (bucho de cabra recheado) da zona da Sertã, os algarvios bolo de alfarroba ou o "morgado" da Guia, bolo de mel da Madeira, pão de Mirandela, Bolinhol de Vizela ou "muxama" de atum do Algarve. Estas são algumas iguarias que vão fazendo parte - a escolha é tão variada quanto a época ou disponibilidade dos produtores - da ementa da Taberna dos Petiscos, de onde só se sai com o repasto acomodado com o clássico café d' A Brasileira.


Instalado desde Fevereiro de 2013 no concorrido e renovado Largo de São Domingos, no Porto, o negócio liderado por Sofia Príncipe e Joana Conde é uma fusão de mercearia, "wine bar" e petisqueira, num espaço onde noutros tempos funcionou uma gráfica e "herdado" com um estreito pátio exterior revestido com azulejos azuis e brancos dos séculos XVII e XVIII. A dar os primeiros passos nos 30 anos, a psicóloga formada no ISMAI (Maia) e a socióloga licenciada pela Faculdade de Letras do Porto decidiram não esperar pela iminente carta de despedimento do centro Novas Oportunidades em que davam formação e anteciparam um novo "ganha pão". "Não estávamos realizadas e percebemos que o futuro não ia ser por ali. O desemprego toca a todos e provavelmente ia-nos tocar a nós", relatou Sofia, que no início da aventura explicou a escolha do sector como "uma questão de gosto pessoal" e não "porque vai dar dinheiro".


Ano e meio volvido, já com a vizinha Rua das Flores requalificada, o largo fechado ao trânsito e a concorrência a brotar ao ritmo frenético da chegada de turistas à Invicta - "o que é bom para trazer mais gente", valoriza -, a empresária sublinha que o negócio "corre muito bem" e já assusta menos a "responsabilidade" que acarreta a primeira experiência por conta própria. Já é tempo suficiente para partilharem lições? "Vamos aprendendo algumas coisas, que nem imaginávamos que são necessárias para gerir um negócio. Coisas do dia-a-dia, que temos de saber contornar. Até lidar com as pessoas. Mas qualquer um com o mínimo de empenho e força de vontade chega lá", desvaloriza.


O conceito basilar em que assentou o projecto está inalterado: comercializar para dentro ou fora de portas, trabalhar o máximo possível directamente com os pequenos produtores portugueses. Porquê? Além de poderem cobrar um valor mais baixo ao consumidor final, conseguem assim servir "coisas raras e difíceis de encontrar", e não aquilo que qualquer pessoa pode encontrar nas grandes superfícies. Mais complicado do que encontrar estes fornecedores, porém, foi antes disso "tratar dos alvarás e licenças" e da "papelada repetida infinitamente" que adiou quase um ano a abertura deste projecto de restauração. Também por isso, o investimento inicial foi realizado sem recurso a créditos ou programas de incentivo: "Informámo-nos, mas iria ser mais burocracia ainda".


Metade dos clientes tem nacionalidade estrangeira; os portugueses, atesta a proprietária, voltam regularmente ao espaço para provar coisas diferentes. Se aceitar a nossa sugestão gastronómica, como aperitivo ou para ajudar à digestão, a poucos passos de distância valerá a pena visitar o Museu das Marionetas do Porto e esticar o pescoço para apreciar a fachada da Igreja da Misericórdia, que tem o traço de Nicolau Nasoni, o arquitecto italiano que também projectou a Igreja dos Clérigos ou o Palácio do Freixo.

 

 

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Ficha técnica

 

A Taberna do Largo está instalada desde o primeiro trimestre do ano passado no "curioso número" (como diria o ex-presidente da Assembleia da República, Mota Amaral quando se referiu ao 69) do Largo de S. Domingos. Em pleno centro histórico da cidade do Porto, nas traseiras do renovado mercado Ferreira Borges, num local de passagem para os milhares de turistas estrangeiros, mas suficientemente afastado do rebuliço que contagiou a Baixa da cidade nos últimos anos. Com um tipo de cozinha tradicional portuguesa e zona de fumadores, o restaurante está aberto de terça a quinta-feira e ao domingo das 11h às 24h, enquanto à sexta e ao sábado o fecho é alargado até à 1h. Tem uma grande variedade de petiscos e de vinhos a copo, sendo uma boa opção à hora das refeições ou para aconchegar o estômago e conviver com amigos, pelo que o preço médio é difícil de fixar. O que não muda é o número de telefone e a simpática voz feminina que atende: 22 208 2154.

 

 

 

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O segredo

 

Mais do que uma receita rara ou uma bebida fora do vulgar, a sócia da Taberna do Largo elege um outro "segredo". "Entregarmo-nos ao que fazemos. Não vermos só as coisas como a troca de produtos por dinheiro, mas algo nosso. Damos um bocadinho de nós a todos os clientes. Eles sentem isso. Além das coisas boas que temos para vender, também temos boas pessoas", brinca Sofia Príncipe. Se não está ela atrás do balcão, está a sócia Joana Conde. Ambas têm formação nas Ciências Humanas e trabalharam antes na área da formação, o que acabou por ser uma "escola" para aprenderem a lidar com todo o tipo de pessoas - e nunca se sabe quem vai entrar pela porta no minuto seguinte. "Mesmo naqueles dias em que o caos se instala porque há muita gente para atender, [o cliente] diz que adorou o atendimento e, por isso, até ficou mais tempo", frisa.

 

 

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