Outros sites Medialivre
Notícia

Os grandes desafios para os transportes e a mobilidade turística

O crescimento do turismo tem beneficiado desde as apostas diferenciadoras, como a Caravel on Wheels aos grandes operadores, como a CP. Mas há ainda desafios importantes pela frente.

10 de Abril de 2017 às 13:05
Bruno Simão
  • Partilhar artigo
  • ...

Susana Baptista Fernandes

Directora de marketing da Caravel on Wheels

" A forma como a empresa se abre aos parceiros diz muito sobre como é a empresa."


A caravela de Lisboa que quer desvendar o digital

Susana Baptista Fernandes é licenciada em Gestão pela Universidade Católica e passou pela Sovena e Incyte Ativism. Em 2013 lançou a Duck Tours, que não vingou, e seguiu-se em 2014 com a Tour Tickets for Less e em 2015 a Caravel on Wheels, duas marcas que pertencem a Eduardo Martins &. C. Lda, uma empresa centenária de Lisboa, com a sua origem no Chiado.

"A nossa diferenciação passa mais pela parte cultural e histórica e é esse o nosso posicionamento. O importante é que haja espaço em Lisboa para a existência destes projectos diferenciadores" refere Susana Baptista Fernandes, directora de marketing.

"É um projecto mais pequeno, mas que pode agradar a um público mais europeu que vem a Lisboa e propõe-lhe uma viagem com vídeo que lhe mostra em 3D como era Lisboa no tempo dos Romanos, passar por uma igreja e mostrar o seu interior". O objectivo é captar este nicho mais cultural e histórico que abrange muito as crianças e as famílias. Para captar um dos públicos-alvo têm uma oferta específica para as escolas.

O tour interactivo da Caravel on Wheels surgiu em 2016, em que tira partido do vídeo para contar a história de Lisboa, à medida que se percorre a cidade. Faz um circuito turístico regular que se realiza todos os dias com partidas de duas em duas horas, que sai da Praça do Comércio passa pela Mouraria, Portas do Sol, desce pela Sé, faz Baixa, Chiado, Príncipe Real, Rato, infante Santo, Estrela, Belém, Restelo e regresso à Ribeira das Naus. Depois tem circuitos em grupos e exclusivos. O projecto funciona com muitas parcerias. "A forma como a empresa se abre aos parceiros diz muito sobre como é a empresa" diz Susana Baptista Fernandes. Neste negócio as conexões e as parcerias são fundamentais para assegurar fluxos de clientes até porque "Lisboa tem muita coisa diferente e de qualidade".

Um dos principais desafios tem a ver com o digital onde o mobile cada vez tem maior peso e sobretudo com o surgir em destaque nas páginas que são pesquisadas. Segundo Susana Baptista Fernandes, "no digital quanto mais informação se der mais relevância se tem, portanto cabe a cada um, de uma forma mais organizada, esta questão de prestar informações sobre Lisboa. Consome tempo, consome recursos, mas é uma coisa importante, isto no que se refere ao conteúdo".

Depois há também a dimensão da venda online. "Há um conjunto de 'players' que começam a ter uma importância grande, os sistemas de reserva e das vendas online têm uma grande importância. E estar com esses parceiros faz a diferença. O mobile impôs-se e não interessa ter um site muito bonito se não funcionar no mobile" conclui Susana Baptista Fernandes.




Pedro Neto

Director da Cityrama

"Em Lisboa tem havido a noção da cooperação e da parceria em vez da aniquilação da concorrência."


Um crescimento de forma sustentada

Pedro Neto é director da Cityrama Portugal desde 2010. Licenciado em Gestão passou pela Deltapress entre 1994 e 2002 e pela Antrop entre entre 2002 e 2010.

"A minha ideia é manter o que temos e crescer de uma forma sustentada" defende Pedro Neto, director-geral da Cityrama. Na sua opinião, "houve vários factores que contribuíram para o boom do turismo nomeadamente as questões relacionadas com o terrorismo e a segurança. Se estas se modificarem Portugal não vai crescer ao mesmo ritmo. Sentimos uma quebra dos turistas brasileiros, embora tenhamos compensado com o crescimento dos franceses. A expectativa é que aumente também o número de chineses. Mas é difícil manter esta dinâmica".

Na sua opinião tem se aproveitar o facto de Lisboa se ter tornado ainda mais conhecida. "No entanto, ainda não temos o estatuto de grande capital porque as pessoas vão a Londres ou Paris e estão dispostas a esperar em filas para visitar o Louvre, por exemplo, mas em Lisboa os turistas não gostam de esperas".

Considera que a avaliação da qualidade turística é fundamental. Nesse sentido recorrem a vários tipos de avaliação, tanto internas como externas através do cliente mistério, da análise das críticas em sites como o Tripadvisor. "Tem riscos porque a nossa percentagem de reclamações é de 1% e temos 150 mil clientes mas basta irem meia dúzia para o Tripadvisor…"

A mobilidade é um desafio muito interessante de integração para facilitar as deslocações do turista. "O ideal seria, e já existe, ter uma pulseira que seria carregada com um valor e que depois permitiria ir pagando os transportes públicos e privados (autocarros, táxis, tuk-tuk)" refere Pedro Neto, que defende um maior investimento na mobilidade e na bilhética. Realça ainda que "em Lisboa tem havido a noção da cooperação e da parceria em vez da aniquilação da concorrência e sinto que entre os operadores têm havido mais coordenação com bilhetes cruzados, promoções para os festivais".

No combate à sazonalidade defende uma maior articulação das escolas e o sistema educativo com o turismo e a cultura que pode aproveitar as épocas baixas para aceder a determinados serviços de uma forma mais acessível.

O turismo tem sido baseado nos city-breaks, sobretudo em Lisboa e Porto. A TAP lançou o programa Stopover, em que propõe aos passageiros em trânsito uma paragem de uma, duas ou três noites em Lisboa ou no Porto. Para Pedro Neto, o turista fica em Lisboa à volta dos três a quatro dias e normalmente quer conhecer Lisboa, Sintra-Cascais, ir a Fátima-Óbidos. Na sua opinião era importante que se conseguisse que ficasse mais tempo ou que voltasse.




Filipa Ribeiro

Directora de marketing da CP

"O segmento de lazer tem ganho peso sustentadamente desde há três anos. A CP desenvolveu produtos específicos."

A aposta nos comboios históricos no Douro e Vouga

Filipa Ribeiro é licenciada em Química Aplicada/Biotecnologia pela Faculdade de Ciências e Tecnologia e tem um MBA pela Nova Business Economics School. Começou a carreira em 1994 no Aki Bricodis, seguindo-se a Pararede e a CP, onde está desde 2003.

Os caminhos-de-ferro, como outros meios de transporte, são fundamentais para o turismo, porque este não vive sem os transportes. "O segmento de lazer tem ganho peso sustentadamente desde há três anos, não só porque o número de turistas estrangeiros está a crescer, como pelo facto de a CP ter desenvolvido produtos específicos para este segmento de lazer e de estarmos a crescer com o mercado interno neste segmento" refere Filipa Ribeiro, directora de marketing da CP.

Para o futuro a empresa enfrenta alguns constrangimentos, como a necessidade de modernizar o material circulante. Precisa de comboios novos para responder ao aumento de procura que tem tido. Recentemente foi apresentado o primeiro comboio novo Alfa Pendular para a linha que faz o eixo atlântico de Faro até Braga-Guimarães, "que é o produto topo e cuja frota de dez comboios vai ser renovada. Este é o investimento maior que se está a fazer em material circulante" informa Filipa Ribeiro. No longo curso, o serviço Intercidades foi o que ganhou mais clientes em 2016, com um acréscimo de 11%, para 3,7 milhões de passageiros e o serviço Alfa Pendular transportou mais de dois milhões de passageiros, um crescimento de 8% face a 2015.

A CP está a renovar carruagens, que vão entrar em circulação na Linha do Douro durante o Verão para responder à procura do turismo. É uma linha rentável: "o nosso comboio histórico do Douro, que circula de Junho a Outubro, tem dado nos últimos dois anos resultados positivos na operação e este ano vamos aumentar ainda mais a oferta". Este ano a CP vai ainda lançar o comboio histórico na linha do Vouga. O comboio presidencial, que está no museu Ferroviário, é utilizado para eventos de nicho e leva cerca de 600 pessoas.

O sistema de bilhética e de venda deveria evoluir para a integração com operadores, mas em Portugal cada um dos operadores desenvolveu o seu sistema, o que dificulta a integração, ao contrário do centro da Europa, em que se tem acesso a produtos integrados (comboio, autocarro, barco). "A CP tem dificuldades em fazer desenvolvimentos em tempo útil para responder às necessidades do mercado. Quando se pede alguma coisa aos sistemas de informação nunca é para quando se precisa mas para quando é possível" diz Filipa Ribeiro.

Depois existe ainda o desafio de vender bem os produtos da CP fora de Portugal. "Fazemos uma boa comunicação no mercado interno, mas fora onde há um potencial muito grande para explorar, temos poucos recursos para fazer essa comunicação. É uma questão de investimento e de afectar recursos" conclui Filipa Ribeiro.




João Tarrana

CEO da Eco TukGuide e responsável da APECATE

"O que se está a assistir é à febre da regulamentação. É um caminho oposto do que tinha sido seguido."

A regulamentação dos filhos da crise

João Tarrana é licenciado em Gestão pela Universidade Lusíada. Passou por várias empresas como a PHC, a Computer One em Portugal, a Fabiangola e a Winsig em Angola. É CEO da Eco TukGuide e é responsável pelo departamento de veículos motorizados da Associação Portuguesa de Empresas de Congressos, Animação Turística e Eventos (APECATE).

"O nosso desafio é a sobrevivência porque muitas dos negócios de tuk-tuk são micro-empresas, são um pouco filhos da crise, pessoas que tinham outras profissões e que se tornaram empresários" diz João Tarrana, responsável pelo departamento de veículos motorizados na APECATE. Este novo segmento de transporte turístico surgiu para facilitar a circulação nas ruas mais estreitas e dar essa experiência aos turistas. Vive um momento de regulamentação depois de em quatro anos se ter imposto nas paisagens urbanas das cidades, nomeadamente em Lisboa.

"Estamos num processo de regulamentação que tem a ver com a partilha do espaço público, depois de um período de desregulamentação, fruto da facilidade com que se regista um empresa de animação turística ou como agência de viagem, e da escassa animação para turistas na Baixa" relembra João Tarrana. Com os tuk-tuk vieram o gocar, os hyppo trip, o helicóptero que sobe e desce, os segway, ainda que mais de 60% da viagem do turista em Lisboa seja a pé.

O aparecimento das frotas de tuk-tuk gerou problemas em vários pontos da cidade, o que implica negociação e concertação com as juntas de freguesia, as populações que vivem nessas zonas, os comerciantes, por causa do estacionamento e o ruído. Existem cerca de 50% de veículos eléctricos, mas não há postes de carregamento nas zonas de animação turística, depois há muitos que não tiveram manutenção e não funcionam.

"O que se está a assistir é à febre da regulamentação. É um caminho oposto do que tinha sido seguido" acentua João Tarrana. Reconhece que "é difícil a gestão da mobilidade porque existem muitos 'stakeholders' a pressionar e cada um a tentar obter maiores benefícios". Por isso, a APECATE tem proposto junto da Câmara Municipal de Lisboa a criação de um grupo de trabalho que junte todos os 'stakeholders', como os pesados, a ARHESP, a animação turística entre outros, "para se criar uma regulação mais consensual e que seja possível cumprir".

"O sistema pede mais regulamentação por causa da mobilidade e do seu ordenamento. Estamos a falar do espaço público que tem muitos intervenientes e em que é necessário criar regras, a contingentação. O regulamento do Porto é mais concreto que o de Lisboa, mas tem alguns aspectos complicados para o seu cumprimento" refere João Tarrana.